DÁ-NOS SENHOR! A POESIA DE CADA DIA
DÁ-NOS SENHOR! A POESIA NOSSA DE CADA DIA
Passei o tempo de minha vida engordando estatísticas – de pobres no país a que pertenço, de números crescentes na conta dos patrões para quem trabalhei (e a quem nunca fui subserviente), de militantes das causas pelas quais me apaixonei (e fui escravo) - enfim estatísticas frias num mundo de números que inibe o calor da poesia.
Tanto fiz pelas causas materiais deste mundo administrado pelos números, gráficos, ofícios, memorandos e telegramas cheios de desculpas esfarrapadas, que cansei. Não desejo engordar as estatísticas da Previdência Social, prefiro antes a Providência Divina. Sou de uma estirpe que não se satisfaz apenas em reclamar, queremos sempre atuar, e, fazer parte de um mundo onde o sujeito significa um peso (morto, mesmo que vivo) que o Estado custeia e por isso mesmo não pode elevar os salários dos trabalhadores, pois os aposentados, estes “mortos” para o trabalho estão vivos e impedem a libertação dos trabalhadores, que continuam como escravos, com um salário que os faz morrerem de fome, isto eu não quero.
Na beira dos quarenta anos de idade, acho que é tempo de pensar nestas coisas, pois meus neurônios (os que sobraram após as noites insones de porres marxistas e etílicos) atingem um limite estatístico e não restam tantos quantos eu necessite, agora que “cresci”.
Revirarei os escombros mais recônditos de minha alma sublimada pela anarquia e gritarei com meus vocábulos impúberes toda a virulência da vida e da palavra, que não estou preocupado com os números, tampouco com a frieza dos despachos e liminares. O mundo positivista agoniza no leito da história, ocupando um lugar fétido na enfermaria da memória. A humanidade (como é difícil usar este termo) foi bastante desumana para com as pessoas e com o planeta.
De estatísticas, embasadas no racionalismo positivista, fizeram os números das guerras, dos mortos pela libertação de nações que invariavelmente foram administradas por outros ditadores, de aidéticos na África, de miseráveis em toda a face da terra.
Os homens fazem conchavos, compram veículos, mentem e roubam, passam noites nos bordéis e pela manhã vão à missa com suas esposas, eles cheios de perfume e elas de maquiagem, formando as estatísticas familiares e encenando a triste e linda vida familiar.
Nós, os débeis, os poetas, sonhadores que somos, vivemos no mundo das ilusões, sorvendo o amargor da vida ocidentalizada cristã e degustando a beleza do ser natural. Nós, os desvairados, somos poetas e cantamos ao luar, como os gatos no cio. Somos nós, os malditos que tentamos florir este mundo com palavras, ao invés dos números no extrato bancário.