BANDIDO DA LUZ VERMELHA

João Acácio, o famigerado bandido da lanterna vermelha, o “monstro” como pretendem alguns, o “delinqüente sexual”, como querem outros, finalmente está preso.

Os jornais exploram o fato com sensacionalismo, procurando tirar proveito da situação. Afinal de contas, João Acácio deixou em polvorosa toda São Paulo durante mais de dois meses, assaltando, roubando, matando e apavorando muita gente boa.

O rádio, a televisão (esta, principalmente) entrevistam o bandido, exploram-lhe a vaidade para extrair-lhe pormenores das suas façanhas, enfim, procuram mostrá-lo aos olhos do público como um assassino abominável e irrecuperável para a sociedade.

O bandido errou, é certo. Transgrediu a lei, cometeu crimes, infringiu regras de boa conduta e de bons costumes, achincalhou das autoridades, abusou demais e terminou sendo preso. Mas agora já não nos cabe errar também, publicamente taxando-o de monstro, de cafajeste e outros adjetivos mais, sinônimos da infâmia e da indignidade. Um erro não justifica o outro.

O homem já está seguro. Resta-nos entregá-lo à Justiça, pelos muitos crimes cometidos, a qual haverá de julgá-lo e encaminhar à prisão, onde pagará por longos e longos anos todos os seus pecados. E, quem sabe, não poderá ainda ser recuperado para a sociedade? É novo, tem apenas vinte e cinco anos. Jovem demais, até!

Eu não diria simplesmente um sádico, um anormal, um monstro, como certos locutores da televisão o apresentaram ao público. Mas apenas um jovem desamparado, um desajustado social, um dos muitos indivíduos que nascem, crescem e morrem sem assistência, sem orientação, sem amparo, sem incentivo e sem amizades, acabando por conhecer e ingressar na senda do crime, talvez a única possibilidade de serem reconhecidos e respeitados, única chance de apagarem o “zero” desprezível que representam para a sociedade dos nossos dias.

É isso aí, amigos. Existe o outro lado da estória desse moço. O lado triste, o lado amargo, o lado cruel, que os homens dos jornais e da televisão agora se esquecem ou simplesmente omitem, não querem comentar. Ele é um produto do meio.

Todavia, também não é certo transformá-lo em herói, em vedete, como algumas pessoas vêm procurando fazer. Veja-se o caso da ilustre senhora desconhecida, que ofereceu um milhão e meio para certo advogado entrar com pedido de “hábeas corpus” para o bandido! Não fosse a atuação rápida e decisiva do Delegado Nemer Jorge, Diretor do D.I., conseguindo em apenas quatro horas um pedido de prisão preventiva para o acusado, usando seu prestígio pessoal e o peso do seu cargo, e a estas horas “Luz Vermelha” de novo estaria livre, semeando pânico e terror na metrópole. De herói evidentemente ele não tem nada.

O correto, então, seria julgá-lo sem estardalhaço. Um criminoso comum. Um, apenas, dos milhares que, jovem ainda, premido talvez por fatores diversos, enveredou pelo caminho do mal e pela senda do crime.

Examinemos o caso de cabeça fresca, sem paixões. Tiremos conclusões acertadas. E saibamos como proceder futuramente.

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São Paulo, 18/08/67

OBS.:- “Luz Vermelha” cumpriu pena de 30 (trinta) anos de cadeia, sendo solto em São Paulo. Foi morar com parentes no litoral paulista, em Santos, parece, e terminou seus dias, desajustado ainda, assassinado numa briga de bar.

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RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 12/12/2009
Código do texto: T1973557
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