Uma foto diz mais que mil palavras

Não sei quem disse isso, mas já ouvi várias vezes, e concordo com a afirmação. Tanto, que gostaria de discorrer um pouco sobre o tema, tomando como exemplo, se me permitem, a fotomontagem que postei aqui no Recanto, na área reservada ao perfil do autor (a que aparece ao abrir minha página, e também ao final desta).

Pois bem, vejam que meu rosto se mostra somente pela metade, menos que a metade, melhor dizendo; com ênfase para o olho esquerdo, mais especificamente. Poderia ter sido o olho direito (felizmente, nasci com ambos e ainda os tenho em perfeito estado, tirando a presbiopia, o astigmatismo e um pouquinho de miopia... mais no olho direito), mas preferi o esquerdo, não por que eu seja "de esquerda" – o que, a propósito, faria algum sentido lá pelos tempos idos da ditadura militar; depois, a coisa embaralhou tanto que não dá mais pra saber quem é de direita e quem é de esquerda, ou de centro (ou "quem fica em cima do muro", se preferirem), nessa salada política tupiniquim mal temperada em que se meteram nossos partidos políticos de uns tempos para cá. Devo confessar que escolhi o olho esquerdo para evitar deixar subentendida a palavra "direito". Não que eu não procure ser ou agir direito, ou que eu não goste do que é direito, muito pelo contrário. Até estou cursando Direito, vejam vocês, já iniciando a descendente da curva nesta etapa da vida (pra não dizer "terceira idade"... bem, acho que estou exagerando, pois, no segundo período de minha segunda faculdade ainda me sinto meio... calouro!). Evitei a palavra "direito", ainda que apenas implícita no meu olhar, pela simples razão de haver, no mundo dos nossos dias, muita coisa que a meu ver não está direita, e também porque em tudo o que fazemos sempre haverá um ponto, ou mais de um, que poderíamos ter feito diferente, melhor. Ao escolher o olho esquerdo, portanto, meu propósito foi o de protestar contra muita coisa torta que temos visto nestes dias de extrema falta de educação (de crianças, adolescentes e adultos), saúde pública pela hora da morte, segurança pública e privada na "privada das almas", infraestrutura urbana e não urbana pra lá de capenga... como nunca antes visto na história deste país (agh!...). E, também, para dizer que sempre estaremos a um passo, ou melhor, a muitos passos da perfeição (vejam por exemplo o tamanho deste parágrafo que acabo de escrever, "quase uma afronta às melhores e mais elementares técnicas de redação", diria o grande professor Jenaldo).

Ainda sobre minha ênfase no olho esquerdo, tenho a acrescentar que tencionei dizer que quem se propõe a escrever algo, em verso ou prosa, no verso e no anverso sempre quer expressar sentimentos e percepções, e, para isso, é necessário que esteja "ligado", "de olho" nos acontecimentos, na realidade concreta ou virtual, naquilo que pode ser captado não somente pelos olhos, mas também pelo "coração", pelos demais sentidos, inclusive o sexto. E, cá entre nós, o olho esquerdo está mais próximo do coração que o direito, não está?! Ver algo com olhar crítico é essencial, mas sem perder a ternura jamais (tomando emprestada parte da famosa frase... de esquerda?...).

Um rosto pela metade, com uma nitidez que deixa a desejar, e em tom meio amarelado, envelhecido... Bem, penso que ninguém conhece ninguém por inteiro, quando muito pela metade, de forma não muito nítida, meio turvada. Nós mesmos não nos conhecemos por inteiro; quantas vezes nos pegamos surpresos com alguma reação nossa que, seríamos capazes de jurar, jamais teríamos. Foi isso o que pretendi passar ao postar minha foto de meio rosto, menos que meio rosto, vá lá... Mas, vendo agora com o olho "direito", devo confessar que houve nisso uma pontinha de vaidade também, ao fazer o corte superior da foto abaixo da linha onde deveriam começar os cabelos. Dura realidade essa, e nada virtual, vale dizer, pois já não tenho mais essa "linha capilar" bem definida, onde antes (bem antes) começava a parte superior da (outrora) imponente moldura castanha do meu rosto de então. Culpa do tempo e sua ação tão certa quanto implacável, portanto, esse tom envelhecido de minha foto...

Que atire a primeira câmera fotográfica quem nunca escolheu a dedo (ou, em tempos de fotografia digital acima dos 10 megapixels, recorreu ao photoshop) uma foto sua antes de publicá-la! Pois é, meus caros leitores, a vaidade é um traço inescapável da personalidade humana, mais acentuado nuns, menos em outros (penso que me situo no segundo grupo, neste caso, até porque não adianta querer lutar contra o tempo; seria o mesmo que tentar tapar o sol com a peneira virtual do miraculoso, porém ilusório photoshop).

Agora, vamos à composição da foto, da meia-foto, melhor dizendo: por que aqueles quadros, um dentro do outro? Mais, por que o quadro interno (o que contém a foto) não está alinhado? Não foi por acaso, isso também foi proposital. Com os quadros uns dentro dos outros, eu quis passar a mensagem de que tudo no Universo é assim. Estou redigindo agora este artigo, sentado à uma mesa, que está dentro de uma sala, contida numa edificação, no planeta Terra, parte de um sistema solar, situado numa galáxia... melhor parar por aqui. Nós também somos como caixas, umas dentro das outras; temos nosso mais íntimo interior ("íntimo interior"... essa é ótima!"), aquele que nem mesmo nós sabemos existir, depois vem uma camada sobrejacente, ainda íntima, mas que conhecemos ou julgamos conhecer, depois outra que revelamos às pessoas mais próximas, e outra que se mostra ao restante do mundo exterior... como cebolas (ouvi isso no primeiro filme da trilogia Shrek). Caixas dentro de caixas, ou quadros dentro de quadros... penso que assim somos nós, penso que assim é a vida.

Mas por que diabos o quadro com a foto está torto, e a foto ocupa o centro da composição?! Isso também tem explicação: pela simples razão de que todos nós, no fundo, e às vezes no raso também, somos egoístas (alguns, éticos, outros nem tanto), gostamos de estar no centro de tudo, adoramos pensar que o mundo gira em torno de nós mesmos. Mas esse é um pensamento "torto", por essa razão o quadro com a foto está torto, e também porque nenhum de nós é bom o suficiente para imaginar que já atingiu ou que está próximo da perfeição. Buscamos ajustar o quadro da nossa própria fotografia neste mundo de modo que ele, o quadro com a nossa foto, um dia possa estar no esquadro, alinhado, direito; mas essa busca jamais terá fim, nosso quadro nunca estará perfeitamente alinhado, é o que penso. Por isso o quadro com a foto está torto na minha composição fotográfica, que também é torta.

Tem mais, o quadro que vem logo depois, percebam, parece torto também. Mas, acreditem, não está, é ilusão de ótica, como muito do que vemos neste mundo, nesta vida, com os olhos e também com o coração. Às vezes distorcemos a realidade, vemos as coisas como elas não são exatamente como pensamos que são. Por nossa própria influência – representada pelo quadro com a foto no centro da composição fotográfica objeto destas mal traçadas linhas –, o mundo exterior, seja da forma como o vemos, seja da forma como muitas vezes o tratamos (ou destratamos, como tem sido desde que o homem surgiu na face do planeta), mostra-se torto, fora de esquadro. A rigor, ele, o mundo, anda torto mesmo, mas, por nossa influência, está mais torto do que jamais esteve. Por isso o segundo quadro mostra-se torto para quem vê a composição fotográfica. Mas não se iludam, trata-se apenas de uma ilusão de ótica.

A cor do segundo quadro, por que parece meio sombria? Sim, ela é meio sombria, e não por acaso escolhi essa cor, para que passasse mesmo essa sensação (ao menos eu vejo assim, mas pode ser ilusão de ótica, também...). Representa algo que não sabemos exatamente como é, ou como vai ser, nossas incertezas e medos diante do lado desconhecido do mundo, da face oculta da vida, da nossa própria vida. E isso está muito próximo de nós, lidamos com isso todos os dias, e penso que assim será até o fim dos dias, dos nossos dias. Mas, se observarem bem, essa cor também passa algo de serenidade, é uma cor boa de se ver, se a olhamos com algum otimismo e esperança; e com essa minha escolha de propósito dúbio, por assim dizer, eu quis sugerir, contrapondo nossas incertezas e medos, que há um lado essencial, determinante, marcado pelas nossas conquistas, há o nosso aprendizado, nosso amadurecimento, nossa evolução no sentido do bem.

E o sentido do bem está no terceiro quadro, este na cor branca, não por acaso também, pois branca é a cor associada à paz e à pureza, que, no fundo, todos nós almejamos. Embora possa não parecer, em face de tantos conflitos e violência exacerbada mundo afora, a humanidade no íntimo deseja a paz, a harmonia, a pureza de espírito, a retidão de conduta. Por isso o terceiro quadro (separado da foto "central" pelo segundo) é branco, porque é algo que não está muito próximo de nós, mas que nós queremos muito alcançar.

Por fim, o quarto e derradeiro (derradeiro... será?!...) quadro, pintado na cor preta. Sim, ele ganhou essa cor porque o preto é a ausência de luz. Está onde nossa inteligência e visão limitadas não alcançam. Representa nossas perguntas sem respostas, a escuridão total (ou quase isso). Assim como os "buracos negros" do Universo, tentam sugar o branco, a luz do terceiro quadro (aquele que representa nosso ideal), mas está ali somente como uma ameaça, pois percebam que há mais branco no terceiro quadro que a cor preta no quarto (e na sala, na copa, na varanda...). Ou será que não? Vejam bem, e respondam a si mesmos: há mais branco do que preto na minha composição fotográfica? Ficaram em dúvida? Vai de cada um, agora, achar que a cor branca predomina, ou então que a ausência de luz domina o cenário. Penso que é a partir dessa percepção de cada um que vem sua força interior, que lhe confere a disposição de lutar, lutar e lutar para chegar ao terceiro quadro, ou, pela outra via, "jogar a toalha e deixa correr solto", por achar que o mundo fora de esquadro é mais forte e fatalmente irá nos dominar. No meu caso, fico com a primeira opção.

Um pontinho mais para reflexão: o quarto quadro da composição, tido como último, será mesmo o derradeiro? O Universo tem limites, fronteiras? E a vida?...

Não contei as palavras deste meu despretensioso artigo. Será que passam de mil?... Bem, isso para mim não importa; não mais do que o que eu pretendi transmitir ao compor aquela foto meio fora de esquadro.

Da janela, vejo o mundo, enquadrado, quadrado...