CARÊNCIA DE HERÓIS

Para muitos estou preste a cometer uma heresia. Ontem enquanto eu assistia um especial sobre o Airton Senna na TV Cultura, me deparei com um herói fabricado. Nunca gostei de Fórmula 1, mesmo na época do Senna nunca fui arrebatado pelo esporte, o que faz de mim um leigo no assunto.

Mas, o que me surpreendeu foi rever as cenas do acidente e o espírito de comoção que pairou sobre o país no ano de 94. É importante destacar que o país estava num período de transição política, estávamos de ressaca do impeachment, moeda nova, escândalos novos-antigos a estória é a mesma em qualquer momento de nossa história – mensalão não é algo novo.

O documentário prosseguia, e, eu com a mente borbulhando de informações repetidas, CPI, CPMI, Mensalão, Atendados em Londres – quanta intolerância! Somos assim. O Airton Senna foi no máximo um vencedor! Particularmente como cidadão, como pessoa, eu rejeito o rótulo de herói que o coroa desde então. Se estivesse vivo quem sabe não seria alvo das críticas, dos dissabores pelas não-vitórias.

Mais uma vez me veio à mente o fato de sermos tão carentes de grandes homens em nossa sociedade contemporânea. A Europa teve em seus seios grandes homens que forjaram sua identidade, forte aguerrida ética, que hoje reflete diretamente em sua cultura. Os EUA por mais odiado que são, não podemos negar a grandiosidade de sua nação, por mais ditatorial que alguns supõem que seja, como forma de imposição hegemônica e cultural empurrada goela abaixo para o restante do globo. Nós aqui no Brasil também tivemos grandes homens, só que de certa forma se tornaram como deuses no Olimpo – intocáveis. Gilberto Freyre é um exemplo claro. Conhecido e reconhecido em várias partes do mundo, ganhando inclusive a comenda da Rainha Elizabeth que lhe confere o título de Sir (Cavaleiro Comandante do Império Britânico) o mesmo título dado ao Rock Star Mick Jagger - tenho minhas dúvidas do real merecimento do líder dos Stones. O mesmo recebe convite para lecionar na Universidade de Harvard, convite honroso levando em consideração o nível da universidade.

Porque a TV insiste em fabricar heróis que nada fazem de concreto para o país, e de contra-ponto sepultam pessoas que fizeram parte de nossa história e que deixaram um legado para a posteridade? Porque não documentam e não tiram esses deuses do Olimpo, e os apresenta a sociedade que não os podem alcançar, pois, nas escolas sucateadas não há motivação para tal empreendimento. Enquanto essa utopia retórica não chega na mentalidade de nossos arrogantes formadores de opinião e mídia fétida, continuaremos a assistir a canonização dos Rolnaldinhos, Robinhos e “inhos” da vida.

Natalino Oliveira
Enviado por Natalino Oliveira em 22/07/2005
Reeditado em 23/07/2020
Código do texto: T36720
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