A Beira do Abismo

Olhando nos olhos de muitos brasileiros, que nesse exato momento estão voltando pra casa sabendo que na segunda feira estarão desempregados. Em muitos, que vão no famoso trem que passa, regidos pelo som do seu próprio silêncio, ao dissabor da dor de não ter algo pra comer ou oferecer ao seu filho, trás também na essência uma certa angustia no que fazer amanhã, pois essa situação vivida, está clara e adormecida na omissão do Estado e nos papeis da impunidade, que permitiram as más administrações, que ensejaram na má educação do povo, que por ventura trouxeram a insegurança ao cidadão, de estar em casa ou na rua, com medo e que quando se precisa, vê de perto uma saúde as mãos, com a falta de estrutura ou com a falta de vontade, que leva esse trabalhador, sua esposa, seu filho ou amigo a condição de morte. Porque morrer nesse país tornou-se sinônimo de indiferença, de preconceitos, de vaidades, de desigualdades e de tantos outras imoralidades, comuns nessa selva de pedra, conhecida ordeiramente como cidade. Pode-se dizer que a hora é de pensar. De se juntar nas esquinas, nos bares ou nas praças. Pensar e discutir em toda rede tecnológica, que mesmo com a sua baixa qualidade de atendimento, ainda é a única que pode nos servir para extravasar um pouco desse sentimento, que nos deixa a beira do abismo.

Oxalá os comprometidos economistas, colunistas ou publicadores de artigos regulares, ativistas ou o próprio Ministro da Fazenda terem os seus posicionamentos a favor ou contra, de esperança ou de luta, que é certo, dentro da área de qualquer um, dentro da experiência e do conhecimento deles, todos estão convocados, pois a guerra não é só aquela que dizem pra nós, que nos obrigam a morrer e a matar. Nesse instante, ainda que muitos falem demais e outros nem saibam ao certo o que falar, que é normal, é hora de viver a realidade procurando extrair da crise a luz para todos.

Durante muitos anos, desde que o povo, partidos políticos, igrejas, cantores, empresários e tantas outras classes de interessados juntaram as mãos para conquistar de novo a Democracia, para jurar a bandeira e constituir uma nova Constituição norteando direitos e deveres dignos de uma nova conjuntura, que tornaram possíveis a esperança almejar um futuro, cujo o Estado, então dominado por forças de uma ditadura perdida em seus horrores, assumiria em definitivo a postura de governar para todos. Trouxe em seu bojo a alegria e a fantasia de que tudo seria realidade.

No entanto, saindo dos quartéis, do anonimato das sepulturas ou dos exílios, de tantos palanques e caminhadas em várias ruas, hoje com a postura e slogan de muitos gestores, chefes e senhores, de uma linguagem ponderada, flexível e conclusiva da situação ideal e de bem posta com a real, se pode vislumbrar o caos, ou melhor, o calvário que temos enfrentado ao longo desses anos, que a bem da verdade, quem pode viver para ver, presenciou personalidades, políticos e muitos senhores, que estavam de mãos dadas lutando pela volta da Democracia, estarem hoje sob o mar de lamas, que aos nossos olhos são os reais oportunistas.

Nessa lida diária o povo também apresenta os seus dissidentes do ser cidadão, pois que aprendeu, com a ausência do Estado a se virar. O chefe não liga, não vou trabalhar, mas o ponto vou assinar, se o médico é só pra janeiro do ano seguinte, vou falar com uma amiga pra me colocar no primeiro lugar, se o meu filho fez um concurso, vou falar com o político para ele ajudar, se o transito está engarrafado vou pelo acostamento... Assim uma série de situações, que o povo foi se acostumando, que os políticos foram se confirmando, que os governantes foram edificando e que a justiça, de olhos vendados não pode sair do lugar para julgar. Confirmado a inoperância das fiscalizações, ineficácia das leis e a má vontade de tantos servidores em estudar para se aprimorar ou para melhor servir a sociedade conhecemos, ou padecemos, nos dias em que estamos vivendo.

O alerta fica não só por conta da crise, não só por conta da má gestão, da má vontade, dentre outras corrupções; e por falar nesse câncer, é bom ficamos sempre na vigília das contas públicas, é bom começarmos a enveredar pela voz do Brasil, pelo canal da Câmara, pelos portais de transparências para que possamos discutir mais sobre excessos de gastos desnecessários nas assembleias Legislativas, câmaras Municipais, Senado e nos outros poderes por ai afora, como fazemos em nossas casas para não sofrermos tanto. Por isso, precisamos nesse primeiro momento ser mais reflexivos para constituir a consciência do que estamos vivenciando, para nos inserirmos com mais empenho em nossas responsabilidades sociais e de fato, dentro da situação ideal e não da real, buscando conhecimentos para fiscalizar a gestão pública, para frear as nossas ações imperfeitas e no caso do servidor, procurar sair da ideia de marasmo, constituída sobre o cabedal de ser concursado e não perder o emprego por malandragem, enquanto se tiver um corporativismo dentro das instituições exacerbado.

A visão real nos possibilita limitar as nossas forças e acostumar os gestores a estruturas de faz de contas, por isso a ideal tem que ser constante, pois ela vem aliada a boa vontade e isso, mesmo que não se possa efetivar o que se quer, se transpõe as barreiras com a satisfação daquilo que poderia ser feito. Então nessa ordem de pacotes governamentais, que ensejaram no aumento do desemprego, na expectativa de aumento de impostos, na alta das taxas de juros dos cartões, na alta do dólar, no sombreado pesado de uma situação de recessão pelo tempo que não se tem noção que perdurará, aliado as vastas mazelas, que ao longo da existência da Democracia nesse país se acumulou, desenhando a desigualdade, a farsa, a imoralidade, a hipocrisia moral e a miséria como legado aos nossos filhos, ainda querem nos empurrar para pagar a conta de dividas, que eles fizeram sem nos consultar.

Está difícil, mas a postura tem que mudar, pois nesses Brasis, há que se lembrar, que eles estão no mesmo barco. Podemos até pagar, mas eles precisam também pensar e melhor agir, assim como nós. Agora é hora de não perdermos de vista a realidade e procurarmos a solução viabilizando e valorizando maciçamente a nossa participação dentro da sociedade e do Estado que nós fazemos parte e não há como desvincular. Afinal, posso até me dar bem, mas um dia falta pra todos, então não sou imune sou mortal, por isso tenho que pensar nos outros, para podermos deixar de ser desigual.