Mercosul, um exemplo de integração imperfeita.

A falta de instituições supranacionais, em conjunto com aspirações por demais audaciosas, levou o Mercosul a permanecer em um estágio primário e imperfeito de integração regional.

Num primeiro momento, a escassez de instituições conduziu a uma desburocratização do sistema de integração. Contudo, conflitos vêm sendo gerados, nos últimos tempos, entre os países membros justamente devido, também, à falta de uma institucionalização maior a nível de bloco econômico. A crença de que a “diplomacia presidencial” resolveria os impasses que surgissem no transcorrer do tempo de uma forma democrática e prática direcionou a integração do Cone Sul, liderada pelo Brasil, a relegar aspectos importantes no que diz respeito à institucionalização ordenada no bloco com compartilhamento da soberania entre os membros.

Acerca da liderança do Brasil no processo de integração, é interessante traçarmos um paralelo com os países que lideram a ação em outros blocos para vermos a situação peculiar na qual o país está inserido. A parábola da Belíndia foi criada por Edmar Bacha para definir o Brasil como um país com um lado desenvolvido similar à Bélgica e um outro com a pobreza da Índia; parodiando Bacha, no contexto da integração regional, dir-se-ia que o Brasil enfrenta o dilema de ser um país “Alemécia”, mistura de Alemanha com Grécia, como dizem Giambiagi e Markwald em artigo na RBCE. Alemanha no que diz respeito à fadada liderança no processo de integração em decorrência do fato de ser o maior país do bloco. E Grécia por ser, ao mesmo tempo, um país pobre e de grande desigualdade social. Assim, o Brasil não possui recursos orçamentários disponíveis para ser a poderosa locomotiva que puxaria os vagões do bloco através, também, da distribuição de recursos no seu interior para conseguir uma menor heterogeneidade em termos de grau de desenvolvimento, como acontece na União Européia, dentro da zona de integração do Cone Sul.

As aspirações apresentadas no Tratado de Assunção (1991) eram de construção de um espaço de livre-comércio e união aduaneira que culminasse com o mercado comum e favorecesse a inserção competitiva na economia global. Entretanto, tais aspirações mostraram-se muito aquém do que realmente se fez em matéria de integração. Diante de tal situação, novas estratégias vêm tomando espaço no intuito de transformar o Mercosul em uma proposta mais coerente e com metas mais acertadas. O muddling through, que consiste em evitar compromissos mais ambiciosos e contornar os atritos com um misto de diplomacia e concessões, é uma estratégia que vem sendo usada justamente com a função de resolver o problema no curto e médio prazo visto que, no longo prazo, ele se apresenta como uma estratégia que não se sustenta pois perpetua os problemas que têm caracterizado a relação entre os sócios.

Portanto, mesmo diante de um cenário social e econômico desfavorável; com a Argentina em compasso de espera para uma possível melhora em 2003, com o Paraguai passando por uma situação sensível no que diz respeito à sua política interna onde o próprio Presidente parece estar envolvido em casos de corrupção, com o Brasil tentando iniciar uma nova fase política e econômica com o governo Lula e com o Uruguai mostrando também a sua vulnerabilidade externa diante da necessidade de pedidos de empréstimos aos organismos internacionais como o FMI; é necessário que os sócios do Mercado Comum do Sul se organizem e dêem ao Mercosul uma cara nova. Novas metas de integração mais adequadas às reais condições do bloco necessitam ser implantadas juntamente com um projeto com visão a longo prazo do que se quer para a integração do Cone Sul levando em conta a recuperação da economia do bloco como um todo.

Com a alvoroçada busca dos mercados latino-americanos pelos EUA via ALCA, é mais do que nunca importante que haja uma convergência nas idéias e ações a serem tomadas pelos países membros do Mercosul em resposta a projetos que possam a vir depreciar as condições de sobrevivência e competição das indústrias instaladas na zona de integração. Também se mostra necessário que novos fronts em negociações com outros blocos sejam abertos, como já vem sendo feito recentemente, o que eleva o poder de barganha do Mercosul nas negociações com os EUA e outras grandes potências ou blocos econômicos.

Assim, uma mudança no espectro de integração se faz patente tendo em vista a necessidade de geração de novas sinergias entre os sócios do Mercosul tanto no âmbito econômico quanto no político-institucional para a correção dos rumos no modelo imperfeito de integração tentando torná-lo mais factível, mais próximo da “perfeição” e da realidade.

Ivan Tiago Machado Oliveira

Salvador-BA, Brasil.

Agosto/2003.

Ivan Tiago Machado Oliveira
Enviado por Ivan Tiago Machado Oliveira em 21/10/2005
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