Felizes serão os tristes, pois conhecerão o reino da felicidade

Outro dia passei por um aluno e o vi triste, acabrunhado. Um amigo, que vinha logo atrás de mim, percebeu a tristeza do garoto e perguntou: O que houve? O menino, então, contou que sua cadelinha morrera na véspera, eis a razão da tristeza. O amigo, disse: Que pena! Fica triste não, isso passa... Aquela frase: Isso passa - ficou ecoando em minha cachola. Claro, certamente a tristeza passaria, mas não seria normal aquela tristeza do garoto? Fiquei a refletir. Sim, a tristeza por conta de um acontecimento desagradável é natural, faz parte do processo de luto. Acontece que, sabe-se Deus por quais razões, decidimos demonizar a tristeza.

Sentir-se triste ou experimentar o luto faz parte da existência humana diante de qualquer perda. A médica suiça, Elizabeth Kübler Ross, elenca as cinco fases do luto. Ei-las: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Toda pessoa que passa por uma perda experimenta todas ou algumas dessas fases sem, contudo, estar necessariamente depressiva.

É o processo e o indivíduo necessita encerrá-lo para seguir adiante de maneira serena. Claro que essas fases não são estáticas e a coisa não acontece assim, de forma matemática, até porque o ser humano é mais complexo. O indivíduo poderá pular algumas fases, voltar em outra. Poderá, portanto, experimentar a depressão, elencada como a quarta fase, mas retornar à raiva. O fundamental é fechar o processo. Então, penso que banir tristeza, dor e dificuldade de nosso cardápio existencial foi um dos grandes equívocos que cometemos na sociedade. Ao banir a tristeza, transformando-a como vilã e criando mecanismos de defesa contra ela estabeleceu-se a felicidade como obrigação. Felicidade não é obrigação, mas conquista trabalhada, esculpida nos recônditos da alma com as ferramentas da reflexão e mudança de postura diante da vida.

Ao banir, ou tentar banir a dor provinda da tristeza criou-se uma fantasia, uma ilusão de que é possível viver sem aquela que é uma das grandes molas de progresso, autêntico espinho que cutuca acomodados e renitentes às mudanças, ou seja, a dor. E, por fim, ao considerar a dificuldade algo ruim nasceu a busca pela facilidade, pelo atalho, pelo meia boca, pela falta de qualidade que advém da inexistência de empenho.

Quando rejeito a dificuldade, aceito a propina, dou a famosa carteirada ou ofereço uma grana ao policial que vem me multar, sem esquecer, é claro, de estacionar meu carro na vaga de idosos sem ter esse direito. Tudo da forma mais fácil porque a dificuldade foi extirpada, não é legal, não é bacana.

Dificuldade, dor e tristeza fazem parte da vida do homem na Terra, jogá-las para debaixo do tapete não resolverá o problema. Mais vale refletir e criar ações para aprender a conviver com as perdas processando o luto e, então, partindo para uma vida saudável, sem ilusões de que seremos felizes para sempre. Isso é coisa de contos de fadas e, não raro, levam as pessoas ao suicídio.

Imperioso tomar cuidado com esse canto da sereia para não se sentir um "ponto fora da curva".

Tristeza bem trabalhada pode levar à felicidade real, consciente, segura... Ah, bendita tristeza! Felizes serão os tristes, pois conhecerão o reino da felicidade...

Wellington Balbo
Enviado por Wellington Balbo em 23/08/2018
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