O DESENVOLVIMENTO BIOPSICOSOCIAL E COGNITIVO DA MULHER

Assisti hoje a uma defesa de dissertação de mestrado em filosofia, onde o mestrando falava sobre o Emilio de Rousseau. Até ai, nada de mais, mas quero enfatizar seu bom nível.

A certa altura, após os minutos em que o mestrando dissertava sobre seu trabalho, iniciou-se a argüição da banca. O primeiro fez observações interessantes, sobre o trabalho em si, sobre o desafio de Rousseau em escrever o Emílio.

Dentre tantas coisas, falou sobre os princípios éticos fundamentais a preservação da liberdade natural e o desenvolvimento da consciência moral. A educação como direito humano, a moralidade como necessidade humana. O mestrando citou apropriadamente Paulo Freire sobre a Pedagogia da Autonomia..

Falou sobre a posição conservadora de Rousseau sobre a mulher, sobre a educação feminina, cuja função era servir ao homem, por essa razão, ela deveria escolher a quem servir, quem seria o seu senhor, sem a interferência da família. No entanto, argumentou o professor, na medida em que, Rousseau amadurecia, estabeleceu-se uma relação de “dependência” de Terese, como critica do ele escrevia. Além de dedicar sua obra a uma mulher. Ou ainda, a importância do relacionamento com a mulher que o criou e que depois se tornou sua amante. O quanto foi influenciado por ela.

A diferença do pensamento rousseauniano esta diametralmente em oposição ao pensamento reinante da época, cuja norma dizia que o casamento era uma coisa séria demais para ficar nas mãos de jovens inexperientes, além dos arranjos, cujo interesse era ampliar os laços de amizade, unir as fortunas, e aumentar o domínio político das famílias mais tradicionais, ricas e nobres.

O mestrando, interpretando Rousseau afirmou que no estado de natureza, a mulher não se submetia a ninguém. O homem e a mulher se encontravam, tinham momentos de prazer, cuja função era a preservação da espécie, e depois cada um seguia seu caminho. A mulher caçava, cuidava de alimentar sua cria. Na medida em que o homem aprendeu a caçar tornou-se sedentário, e por razões das catástrofes naturais, os indivíduos sentiram a necessidade de se agruparem, surgindo a partir daí, a sociedade humana. Nesse momento, se estabelece a dependência da mulher.

No estado de natureza, a família não existia. A necessidade juntou os indivíduos e a partir daí surgiu à família, mas foi à sociedade que corrompeu a família. O mestrando argumentou que Rousseau não afirmou necessariamente isso, mas que foi “essa sociedade quem corrompeu o individuo”.

Quanto ao principio educacional, a sua geração estava corrompida, mas o Emilio seria aquele em que seria dada a oportunidade de uma nova visão, de sair do estado do homem selvagem para o civilizado e, que os filhos dos seus filhos teriam a chance de não nascerem mais selvagens, mas cidadãos.

Enquanto discussão da obra de Rousseau, um filosofo moderno do século XVIII, aparentemente fácil de ser compreendido, no entanto, quero chamar a atenção ao caráter preconceituoso e discriminatório da banca. Em certa altura, um dos componentes falou que as mulheres tinham como livro de cabeceira as obras de Rousseau, que hoje qual o autor as mulheres tem como livro de cabeceira? Roberto Carlos, quem sabe?

A mulher tem passado séculos e séculos de nulidade, servidão e maltrato, apenas uma procriadora, sem senso de responsabilidade, sem cérebro, sem alma. Da mulher descrita no Gêneses, como Sara que chamava Abraão de “senhor” a minha trisavó Tereza, uma mulher do século XIX, que ao dirigir-se ao marido, chamava-o de Major Castro, o senhor.

Há uns três anos, enquanto preparava minha dissertação de mestrado em Teologia, em busca de subsídios sobre a sociedade e relação familiar de dependência, principalmente da mulher em face da sua posição de subserviência diante do pai, depois ao marido, hábitos e costumes que foram passando de geração em geração sem um questionamento sobre sua validação. Em fim, chegou o Século XX e, com ele os movimentos sociais, econômicos e financeiros, a globalização e o surgimento de uma mulher que saiu do casulo, transformou-se em borboleta e ganhou o mundo, mostrando competência e autonomia.

Passei a pesquisar sobre as sociedades primitivas, cuja dominação era matriarcal e não patriarcal, cuja família era matrilinear e não patrilinear. Não precisamos ir muito longe, basta olharmos para as civilizações aqui encontradas, na America do Sul, principalmente em todo o Brasil. Qual não foi minha surpresa que a Revista Nova Escola publicou um artigo sobre as civilizações encontradas no Brasil desde 40.000 anos atrás, passando pelo paleolítico, mesolítico, neolítico. Grupos familiares matrilineares. Mas, o matriarcado de forma geral, no mundo, durou aproximadamente 30.000 anos, e o patriarcado a cerca de 10 a 14.000 anos. Ainda hoje, podemos encontrar em alguns lugares no mundo; o matriarcado é vivenciado como no Tibet, Himalaia e em outros lugares.

Quando a mulher cedeu espaço ao homem, esse o tomou pela força bruta, estabeleceu normas e preceitos sobre a validade de suas ações e reações. Coesificou a mulher, anulando-a a condição de ser de segunda categoria. Na religião, esta visão está contida na Bíblia, no Corão, no Talmude, a partir do desenvolvimento cognitivo de homens, que na minha visão cristã, inspirados por Deus, mas inseridos no seu tempo, dentro de ótica de maturidade própria desse tempo. E, o que dizer da filosofia grega, cujo principio era a educação para todos os homens livres, mas nessa categoria não estavam inclusos, estrangeiros, mulheres e escravos.

Se a filosofia tem como um dos princípios, tornar o ser humano um questionador das verdades pré-estabelecidas, então, princípios e atitudes previamente estabelecidos, como o patriarcado é o retrato do individuo estagnado, sem conseguir enxergar “um palmo adiante do nariz”. Logo, não questionar modos de agir e pensar que vitimiza, anula e coloca o ser humano na condição de cidadão de segunda categoria é um sinal da inoperância do saber filosófico que ainda não conseguiu introduzir profundamente nesse individuo, a capacidade de contra-argumentar valores estagnados. Então, o filosofo é um indivíduo do seu tempo, sujeito as mesmas influencias da sociedade predominante, e, por conseguinte, viver de acordo com seus padrões, para não se sentir excluído. Nenhum ser humano nasceu filosofo, está processo de tornar-se filósofo, dentro de um contexto biopsicossocial em que vive, tendo como subsídios os conhecimentos anteriormente elaborados que lhe serve de caminho para a estrada em que deverá andar, e a partir daí, criar e trilhar o seu próprio caminho.

Não leio Roberto Carlos, ele nunca escreveu nada e, até sua biografia foi escrita por outro, que foi processado por não ter autorização do “ídolo” para escrevê-la. No entanto, quero enfatizar que há várias fases na vida dos seres humanos. Ele nasce, cresce, desenvolve, amadurece, envelhece e morre. Cada fase gera conhecimento, autoconhecimento que o prepara, a priori, para a fase seguinte.

É inadmissível que um professor que trabalha educação básica e ensino superior não conheça os teóricos da educação como Paulo Freire, Rubens Alves, Zeichaner, Rousseau, Pestallozzi, Froebel, Ferrer, Dewey, Dècroly, Makarenko, Ferrière, Cousinet, Neill, Rogers, Vygotsky, Robin, Steiner, Montessori e Piaget. Como é inadmissível que um teólogo não conheça Paul Tillich, de Lubac, Lutero, Bonhoeffer, Berger, Bultmann, Friedrich Strauss, Leonardo Boff, Russel Shedd, José Comblim, Robson Cavalcanti, Rubem Alves, Niebuhr, Charles Hodge, Charles Finney, Abbott, Rendall, Cranmer, Emmil Bruner, Kaspar, Zwinglio, Taylor, Whitehead, sem contar os pais da igreja, como Agostinho, Tomas de Aquino e, tantos outros. Tanto quanto, o filósofo conhecer os principais filósofos de cada período histórico. Sem falar nos escritores que trabalham a psicologia e psicanálise como Karl Abraham, Brentano, Charcot e Freud até Piaget e Lewin, Moreno e Freud, das principais correntes da psicologia, que também passa por Husserl e Heidegger, Pavlov e Watson, Jung e Lacan, Searle e Bettelheim, Winnicott e Rogers, Foucault e Dolto. Sem esquecer de Marilena Chauí: ;Repressão Sexual: essa nossa (Des) conhecida e Simone de Beauvoir: O segundo Sexo. Aliás, há um livro muito interessante do teólogo Marciano Vidal chamado: Feminismo e ética: como “feminizar” a moral, Loyola (2005).

Quero ressaltar que cada fase da vida tem suas próprias leituras. A criança precisa dos livrinhos de histórias em quadrinhos, além de outras leituras, como os jovens precisam de leituras próprias de sua idade, além do montante de leitura impostas pela escola, cada vez mais competitiva. Há lugar para as leituras das revistas em quadrinhos, dos livros de romances, as revistas de atualidades, cientificas, políticas, de ficção, como houve a necessidade da Literatura de cordel no passado para tornar o homem do campo, do sertão, do feirante, do pobre informado, por falta de condições para freqüentar boas escolas, comprar livros. A partir daí, surgiram grandes nomes, dentre eles o principal, Leandro Gomes de Barros, com mais de 600 títulos e mais de 10 mil edições, Martins de Athayde e tantos outros. Há lugar também para Sabrina, Bianca e Julia, revistinhas romanescas sem muita serventia, a não ser, momentos de lazer, para mentes em desenvolvimento, ou diria, com ousadia, para despoluir, além da palavra cruzada, que é ótima.

Finalmente, cada indivíduo traça diante de suas aptidões, valores, talentos, objetivos e gostos, as leituras que são necessárias para manter-se atualizado, empregável, e alguém com uma visão de mundo, sem ser um ser alienado. Diria que ler a biografia de Roberto Carlos, ou de qualquer outro “idolo”, serve a um segmento da sociedade, ligada aos meios de comunicação de massa, ao mundo da música, etc.

O filosofo não pode ser é alguém ensimesmado em seu saber filosófico como se fosse o único e absoluto capaz de ampliar o conhecimento humano.