Temporada 1 - Episódio 21 - O perigo de empinar bolo

Temporada 1 - Episódio 21 - O perigo de empinar bolo

Quando adolescente nem imaginava que eu tinha transtorno de déficit de atenção. Hoje é “nomenclaturado” como TDAH - Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Nem eu nem minha mãe.

Estava eu evoluindo no mundo dos “empinadores” de pipas. Meu irmão mais velho Davi foi minha referência de aventuras. Procurava imitá-lo e ficar na mesma prateleira de feitos que ele fazia. Coisas de irmãos. Se é que vocês me entendem.

Davi já tinha o domínio químico de fazer cortante para pipas, nome científico "Cerol di Vidru". Eu estava doido para aprender. Ele me deu as instruções básicas. Mas o que valia mesmo era a observação acurada do dia-a-dia. Vendo ele fazer cortante.

Observei que o vidro tinha que ser socado dentro de uma latinha de Extrato de Tomate Elefante, com um pedaço de cabo de vassoura. Quanto mais fino o vidro melhor. Lâmpadas queimadas por exemplo, transparentes eram melhores sem aquele branco leitoso. Somava-se os ingredientes secretos nas proporções secretas. Não podia faltar a cola de madeira, isso todo mundo sabia.

Estica-se a linha no quintal. Derrama um pouco do cortante da receita “secreta” na mão. Repousa com delicadeza a linha na palma semifechada. E calmamente desliza a mão, que agora parece um “tunelzinho” ao infinito e além dos quilômetros e quilômetros de linha. Linha 10.

Meu irmão estava na escola. Era vez agora de eu fazer a receita secreta de cortante sozinho. Preparei o vidro moído. Aperfeiçoei com técnica aprendida com outros colegas com PhD em química de rua. Tratava-se de peneirar o pó de vidro em um pedaço de meia de seda de mulher. O pó de vidro do cortante ficava extremamente fino. Ideal para a mistura com os outros componentes secretos.

_Ricardoooooooooooooo!!!!!

Minha mãe me chamando!!! Tinha que atender na hora. Eu estava na clandestinidade fazendo aquele cortante. Eu tinha consciência daquilo. Mesmo na década de 70 onde a legislação não tinha alcance sobre nossa infância na rua. Dentro do quintal de casa era proibido fazer cortante.

Ordem da MÃE. Justificativa? Era perigoso mexer com vidro. Éramos uma escadinha de seis irmãos com idades aproximadas de 12, 10, 8, 6, 4 e 2 anos. Os irmãos menores facilmente poderiam entrar no laboratório de química. Um perigo aparente se revelaria.

Não tive dúvida na hora. Tinha que guardar o vidro moído. Lancei mão de uma latinha vazia de fermento químico para bolo, ROYAL estampava o rótulo vermelhinho.

_Ricardooooooooooooooo!!!!!

A sirene estava tocando a segunda vez. Só tinha mais uma chance para o FBI decidir vir ao local e verificar a arte. Tampei rapidamente a latinha de fermento ROYAL, coloquei no bolso da blusa e esqueci lá.

Atendi minha mãe. Era para ir tomar banho.

Ao recolher a roupa para lavar. Daquele exército de filhos, era comum a conferência nos bolsos. Estranheza, muita estranheza naquela latinha de Royal encontrada em um dos bolsos. Mas despertou a ideia de fazer um bolo. Mas que bolo? Aquele que era do gosto de todos os três filhos e três filhas. Bolo de Pão Amanhecido.

Outra estranheza se fazia presente. O bolo não cresceu como deveria. Por que será? Pensava minha mãe, nem todos os bolos saem iguais. E como de costume ao desenformar e esfriar, experimentou um pedaço. Para livramento de toda prole, aquele bolo não estava bom! Tinha gosto de areia fina. Mas como?

Se minha mãe não acreditava em OVNI. Passou a acreditar a partir daquele momento.

Tentava na degustação descobrir o que estava errado. Ovo estragado? Farinha vencida? Será que foi o leite? Será o fermento?

Fermento? ... estranheza era pouco para o vocabulário vasto de uma mãe de seis filhos. Um pozinho que deveria ser alvo como a neve. Se apresenta escurecido. Relativamente com brilho.

_Ricardoooooooooooooo!!!!!

Eu tinha TDAH e não sabia....nem minha mãe!

Feito o B.O. as partes foram liberadas rsrsrsrs

Minha mãe jogou o bolo fora, e eu fui empinar pipa.