Carta para Ti - VI

Em vigília, minhas mãos aguardam o poema...os versos parecem adormecidos, deitados entre os lençóis da indiferença. Os dedos respiram intranquilos, despidos de qualquer inspiração. Sento-me a conversar com os meus silêncios, repousada da urgência das letras, dos sons das vogais, como a tentar esquecer o sentido de algumas palavras. Mas há uma saudade a ser escrita, anunciada...difícil controlar este estremecimento que me assalta, quando me vens no pensar. E essa inquietude derrama-se, além da minha possibilidade de escolha. Se os versos não chegam, há uma emoção a me invadir os dedos, o olhar, o peito...resta-me o abraçar dessa vertigem do dizer-te em minha linguagem que é tão tua. Rendo-me a ternura do falar-te...essa que me é permanente e sempre inadiável. É que mesmo ausente, nunca te vais de mim. Enquanto teus passos caminham em estradas que não alcanço, levo-te em meu peito. É aqui que sempre estás, enquanto a vida procura um jeito de nos encontrarmos. Escrevo-te, como se fosse o teu coração, confessando-me o que de mim queres ouvir.

Em tuas vindas em horas improváveis, findas por encantar-me, como quase tudo em ti. Fico a tentar segurar o tempo, congelar os ponteiros dos relógios, adiando o ter que contemplar o último beijo deixado, pronto para ser despedida. Como não te dizer desta minha solidão que sempre te espera? É que me abres os botões da alma, envolvendo-me com a fragrância de sonhos e sorrisos que já se deixavam amarrotados em meus sótãos. Há um indescritível prazer a ondear meus olhares, como um músico que descobre uma nota, desde muito desejada, quando te sei em proximidade. É que me tomas, além do que expresso ou confidencio. E como já me é natural esse teu adivinhar-me.

E ainda que o tempo ensaie bocejos, meu coração desencolhe-se, como a dizer da eternidade em que te pertenço. Na memória da saudade, sempre habita o calor das emoções sentidas e a música dos desejos por viver.

Em noites assim, os lábios das minhas palavras te beijam...

Fernanda Guimarães

Fernanda Guimarães
Enviado por Fernanda Guimarães em 06/05/2005
Reeditado em 17/01/2010
Código do texto: T15217