MISSIVA PARA UM AMOR AUSENTE

Minha querida:

Em primeiro lugar, sou grato pela sua pequena concessão de tempo, desproporcional ao enorme prazer que a sua companhia me trouxe.

Senti-me como uma criança ao ganhar um presente de alguém querido, que sai correndo para gozar o mimo recebido, doido de alegria.

Pudesse eu, naquele instante em que estávamos juntos, esmagaria os minutos com as minhas mãos para que eles deixassem de ser intrusos inoportunos e cruéis, tentando destruir aquele mundo restrito onde fazíamos escambo das nossas experiências atrasadas.

Pudesse eu, transformaria aquele barravento, em um barlavento de verdade, que impedisse os segundos do seu relógio, chegarem soturnos e sorrateiros anunciando a hora de você ir embora.

Fiz, com você, uma viagem de anos – décadas, na verdade - sem sair da cadeira. Como é enorme o poder da nossa mente e dos nossos sentimentos, quando os usamos de forma amorosa.

Pudesse eu, faria a roda do tempo girar ao contrário, desde que preservando as experiências e boas ações que cometemos, em todos estes anos em que não nos vimos – inclusive conservando a presença dos nossos filhos – mas, fazendo a roca girar para trás, sim.

Sente-se que, realmente, gostamos de alguém quando é irrelevante se esse alguém tem 20 ou 60 anos. Sente-se o mesmo quando pouco importa se o corpo carrega 6 quilos à mais, ou 30 à menos. Sente-se isso, quando um simples sorriso deste outrem, nos faz gozar mais que uma trepada sudorenta. Sente-se isso, quando é notório que a companhia – a simples companhia – é muito mais que dezenas de festas, rebuscamentos e outras firulas que às vezes, convencionamos como importantes para nossa vida – e não as são.

Pudesse eu, dizer tudo àquilo que a minha alma clamava em desabafar, creio que sairiam uns 300 poemas - um atrás do outro. Talvez, nem todos de amor ou de paixão – alguns, seriam até de sofreguidão – mas, todos eles seriam declamados no intuito de te fazer sorrir, ou sonhar, ou chorar, ou refletir ... enfim seriam para trazer vida, trazer cor, trazer luz para aquele instante. E eu não abriria mão de declamá-los um a um, até não mais escutar a minha voz – neste instante, somente falaria bem alto o meu coração.

Pudesse eu, transformaria este elemental denominado de amor, no nosso serviçal atento. Não permitiria que ele descuidasse jamais de nos ter na sua alça de mira e, em contrapartida eu o recompensaria com o alimento essencial para a sua sobrevivência e crescimento: porções cavalares de companheirismo. Embebedaria-o também, com doses generosas de um licor chamado afetividade.

Pudesse eu, escreveria este texto a muitos anos atrás e entregaria a você num vaso vivo de flores, para que ambos crescessem juntos.

Pudesse eu, agora não serve mais.

Posso eu, neste momento, somente dizer-te: obrigado por ser tão linda como você é.

Beijos,

Dionisio