À dor, com carinho
Ela tem as suas manias, suas piadas, seus trejeitos, seus tiques e defeitos, tudo de bom e de ruim que há em você. Ela tem a sua morada, sua confiança - confinada - boiando seca num oceano de mim.
Ela tem você e eu só tenho a solidão e, é claro, a dor.
Vocês combinam tanto, dá gosto de ver. Em cada toque que ela sente, outro pedaço do meu corpo faz apodrecer. É lindo, divino, predestinado... Parabéns! E quem vai apertar a mão do meu agente funerário?
Você? Não, você não. As suas estão ocupadas, suadas, perdidas, traçando gemidos por pontos de um sexo do qual não participo, mas me dedico a compor.
Espalmando feito cega no escuro, a procura de seu corpo duro, enrijecido, desejoso! Por mim? Mera vaidade! Por ela, sim. Que novidade!
Você diz que o amor é pra sempre, o seu pra sempre é tudo o que eu preciso. Agora, deixe-me entrar! Vamos, me dê abrigo! Num cantinho úmido do quarto ou num centímetro robusto do teu coração gelado. Tanto faz!. Divida a cama com ela como fez tantas vezes, assim, bem na minha frente, sempre que fecho os olhos e me acho conivente.
Imaginação perversa, coração hediondo, corpo casto e espírito de abandono. Desta forma, você me vestiu com tanto cuidado. E para o meu caixão, somente levo a promessa de um pra sempre fracassado, desenhada em seu sorriso num porta retrato.