Carta ao eleitor do Bolsonaro

Saudações, cidadãos e cidadãs do Brasil, esta é uma carta aos eleitores do candidato Jair Messias Bolsonaro. Meu nome é Saulo Pessato, sou professor de Literatura e escritor, filho de um militar e uma dona de casa, nascido em Brasília no Hospital das Forças Armadas no dia primeiro de dezembro de 1977. Não acredito no Socialismo/Comunismo, considero-me um capitalista, politicamente, uma pessoa de centro, muito embora defenda a presença de um estado necessário para garantir e resguardar certos direitos e exigir deveres inerentes ao bem-estar da sociedade. Não sou petista, não votei no PT em nenhuma das últimas 3 eleições, sou a favor da lava-jato e da prisão de todos os envolvidos sem restrições. Não sou filiado nem apaixonado por partido algum. Não estou aqui para chamar seu candidato de “bozo” nem para ofender você chamando-o de fascista, nazista, machista, racista, nada disso. Não quero me estender muito no tópico, mas acredito ser indispensável manifestar-me MINIMAMENTE a respeito, afinal, somos um país livre e democrático, certo?




Eu queria falar sobre Bolsonaro presidente (Mourão vice) e não estou me apresentando aqui como o dono da verdade. PODE SER que eu esteja redondamente enganado e vou ficar muito feliz se estiver dando aqui apenas uma opinião absurda e não um vaticínio. Gostaria apenas de convidá-los a uma profunda e racional reflexão a respeito da atual situação do nosso país e de como Bolsonaro se enquadra nela.




Compreendo as "boas intenções" que acredito que muitos dos meus amigos e até familiares têm ao escolherem um candidato "diferente", que não deixa de revelar certas verdades expostas acerca de intenções "escusas" de uma esquerda simpática a regimes totalitários (realmente não eram todos os que lutavam pela democracia durante o regime militar e mesmo hoje também me incomodam por saudar, reverenciar e até financiar nações dirigidas por ditadores como o finado Fidel Castro e Maduro).




Porém, existe uma densa e obscura névoa de "conspiracionismo", que vai de Cabo Daciolo (em discursos que viram memes que os incautos acham engraçadinho compartilhar nas redes sociais) a Bolsonaro a levantar uma bandeira supostamente ungida por Deus numa luta histórica do "bem contra o mal" a qualquer custo. Uma névoa perigosíssima alimentada pela fome de mudanças, pela cultura messiânica e pelo espírito de campeonato tão fortes na alma de nós brasileiros.




Eu sei que estamos escolhendo um presidente da república e não um pai. Vi esse argumento em muitas discussões a respeito do fato de Bolsonaro ser uma pessoa frequentemente explosiva e sanguínea, ácida e defensora do sarcasmo do politicamente incorreto. Entretanto, eu tenho uma impressão muito forte de que tudo isso pode ser perigoso quando colocamos na equação esse “conspiracionismo” de acreditar que tem uma missão de Deus e de quem é contra ele é comunista.

Eu não me refiro aqui apenas a minorias apoiadas ou apoiadoras de um estado "protetor" ou "justiceiro social", mas a toda e qualquer pessoa que simplesmente DISCORDE de Bolsonaro.

Na política, é indispensável o mínimo de diplomacia, numa DEMOCRACIA a discordância de ideias é importante e saudável, por isso, um político democrático DEVE ser minimamente diplomático com seus adversários e opositores e em hipótese alguma incitar seus interlocutores, nem de brincadeira, a “metralhar”seus adversários. A consequência da falta da DIPLOMACIA é a GUERRA.

Além de dizer que ia metralhar petista no Acre, Bolsonaro chamou uma jornalista de IDIOTA, disse que estava CENSURADA e que estava cagando para ela, quando num debate acalourado divergiram. Presumo que, neste momento, você deve estar pensando que ela mereceu, assim como a Maria do Rosário, que defendeu um estuprador que Bolsonaro queria punir e ainda o comparou ao criminoso. O mesmo você deve pensar a respeito do fato de ele ter mandado CALAR A BOCA um jovem que fez uma pergunta capciosa em uma de suas palestras e tantos outros “militantes” de grupos variados (LGTB, negros, etc.), que quando falam contra Bolsonaro parecem falar em nome do PT, da esquerda, do comunismo, etc.

Essa polarização não é novidade: aconteceu em 2014 com o Aécio x Dilma, é uma triste, mas latente realidade política no Brasil. Entretanto, isso se torna um GRAVE problema quando o protagonista dessa polarização é alguém que acredita que está em uma missão divina, com um forte espírito militar, apoiado em discursos anteriores de apoio ao regime militar, discursos antidemocráticos, favoráveis a ações de qualquer natureza para evitar um grande “inimigo do povo”. É o primeiro problema que está se instaurando no discurso do Bolsonaro e na esmagadora maioria daqueles que o apoiam: incorporou-se a máxima de que se alguém está discordando dele só pode ser petista, esquerdista, comunista, e aí fica muito mais fácil desumanizar e justificar “metralhar” (metaforicamente ou talvez não).

Por isso, eu gostaria de convidar você a algumas reflexões, algumas perguntas que você não precisa necessariamente responder fisicamente. Faça-o mentalmente. O contexto é Bolsonaro presidente do Brasil.

Suponhamos que o presidente Bolsonaro tenha uma grave divergência com um dos ministros que ele pretende sabiamente escolher pela própria competência e não por conchavos políticos. Suponhamos que um desses ministros ou mesmo seu economista proponha uma medida pouco popular, que desagrade ao povo. E quando eu digo “ao povo”, não pense nos petistas e sindicalistas, os sanguessugas do estado. Pense numa possibilidade, mesmo que remota, de uma dessas medidas desagradar a você ou a alguém de sua família. Eu acredito que Bolsonoro acredite PIAMENTE que vai governar para o povo que o elegeu. A primeira questão é: será que o Bolsonaro vai lidar com tranquilidade com seus funcionários do governo, ministros, economistas, quando propuserem uma medida que desagrade ao povo? Existe uma vaga possibilidade de ele dar uma resposta atravessada a um ministro ou ao seu economista quando discutirem essa proposta desagradável? Ele não entende de muitos assuntos e já deixou claro que é para isso que ele pretende montar uma equipe competente e especialista. Entretanto, é muito difícil uma medida agradar sempre a todos e mesmo a maioria por vezes é afetada e cabe ao presidente escolher a quem vai agradar e quem vai desagradar quando deliberar.

Dentro do regime militar existe uma coisa que se chama HIERARQUIA. Você deve se lembrar de TROPA DE ELITE em diálogos engraçados e estarrecedores que, apesar de grosseiros e equivocados, terminavam em “SIM SENHOR”. Acontece que os ministros e o economista são civis. O governo de Bolsonaro, apesar de formado inclusive em um vice militar e provavelmente ministros militares, é um governo civil. Se o Bolsonaro ofender um de seus ministros, xingar de idiota ou mandar simplesmente calar a boca num momento de discussão acalourada, quais as chances de esses ministros ou economistas simplesmente pedirem demissão e deixarem seu governo? Quantos profissionais de qualidade estarão a postos para substituir uma falta tão significativa para um governo que depende majoritariamente do conhecimento dessas pessoas?

Depois, suponhamos que as propostas sejam MUITO impopulares. Suponhamos que a população brasileira decida ir às ruas para protestar contra elas. Mais uma vez, não estou falando da esquerda, do PT, estou falando do cidadão comum apartidário como aconteceu contra a Dilma. Mesmo que remota, considere que a impopularidade de Bolsonaro chegue a um nível em que a sociedade decida vestir a camisa do Brasil e ir às ruas para protestar. Será que o presidente Bolsonaro toleraria democraticamente as ruas cheias de manifestantes? Sendo ele militar e tendo já declarado a importância de intervenções militares anteriores, será que ele manteria a democracia ou consideraria que todos o que na rua estivessem seriam considerados comunistas, petistas, inimigos da pátria. Será que ele colocaria a polícia e o exército contra esses inimigos? Havendo viabilizado o “excludente de ilicitude da polícia”, isto é, o direito de atirar para matar, o que acontecerá nos manifestos, especialmente se a mesma população que o elegeu estiver legalmente armada? E ainda que você concorde com ele quando localizar todos os “inimigos” da pátria para matar ou morrer na troca de tiros ou para lançá-los em cadeias políticas onde sabe-se lá o que vai acontecer, o que aconteceria com os seus amigos, familiares, professores, quando estivessem do outro lado dessa batalha?

O último questionamento é com relação ao fato de Bolsonaro acreditar que Deus o elegeu numa grande missão para o país. Por diversas vezes ele atribuiu sua popularidade e seu crescimento nas pesquisas e no gosto do povo como uma “vontade de Deus”. Independentemente de sua religião, acredito que você concorde que nem todas as pessoas que fazem algo acreditando ser a mando de Deus estão corretas. O próprio Bolsonaro foi vítima de um sujeito que afirmou ter recebido uma ordem divina para lhe dar uma facada e interromper sua vida. Você pode achar irrelevante esse argumento, mas não é. Quanto mais uma pessoa acredita estar em uma missão divina, mais ela demoniza quem se opõe a ela. Não acho que até o momento isso tenha alcançado níveis preocupantes no discurso de Bolsonaro, mas a história humana é recorrente quando o assunto é o crescimento do poder. Essa divinização histórica de líderes não é particularidade de governos de direita ou de esquerda, grandes imperadores do passado eram considerados representantes dos deuses e era comum fazer parte do séquito um conselheiro que frequentemente cochichava em seus ouvidos, durante grandes ovações do povo, que o imperador em questão era humano. A questão, então é: o que acontece quando todo tipo de contradita a um líder se torna a contradita das vontades do próprio Deus?




Tudo o que disse aqui é baseado apenas na observação dos fatos. Nenhuma paixão, nenhuma idolatria, nenhum partidarismo. Apenas fatos. Fatos relacionados ao candidato em questão. Fatos encontrados numa grande literatura chamada História. Entretanto, eu espero do fundo do meu coração que eu não esteja profetizando nada. Espero que eu esteja errado. E se o Bolsonaro ganhar, eu vou aceitar a escolha da maioria e torcer para que sua boa intenção realmente surpreenda o mundo e o país mude e faça bem a todos, especialmente os que mais precisam. Entretanto, peço que você, assim como eu, analise meus argumentos sem paixão e sem idolatria. E que compartilhe esse texto para o máximo de pessoas do seu ciclo. Pessoas que você ama, embora discorde, pessoas que são cidadãs do seu país.

Bom voto!

Saulo Pessato