Palavra de Bêbado Vale?

Dois negociantes da cidade grande resolvem sair pelo interior a fora a fim de passar a perna na capiauzada.

Foi aí que chegaram em Tabuí, cidadezinha alterosa. Lá num boteco de um cantinho da cidade, caladinho, sentado num tamborete, estava o velho Vito. Cavalinho piquira lá fora esperando o dono tomar umas e outras para depois carregá-lo com toda paciência para casa.

Só que o velho Vito, capiau desconfiado e esperto, sem nem um tostão no bolso, estava esperando alguém para também dar um golpe.

Quando os dois bacanas entram no boteco, tendo visto o cavalinho lá fora, olham gulosos para o velho. E este, vendo os dois, mira sedento nos olhos de cada um e faz aquele ar tristonho de capiau sofredor e ignorante. E o Vito, mesmo olhando a importância dos dois, pensa com os seus poucos botões: "pra quem tá com fome e com sede duma branquinha, formiga é pimenta do reino. Vô enguli essas duas formigonas engravatadas..."

- Não quer vender o cavalo, meu amigo?

- Vendo uai! Vinte mil mango é o preço dele. Quem pagá leva!

Os negociantes se entreolham e resolvem executar um plano que já tinha dado certo diversas vezes. Encher de cachaça o vendedor para levar o animal praticamente de graça.

- Não quer acompanhar a gente num traguinho, meu amigo?

- Carece não, moço! vô injeitá! Responde o velho Vito já arrependido da resposta. Boca seca. Sede danada duma branquinha queimadeira.

- Eu insisto, meu amigo! Venha pra junto de nós!

O velhinho sai, morrendo de humildade, do seu cantinho, e de uma golada só entorna no bucho meio copo de cachaça e ainda lambe os beiços.

Os negociantes gostaram da reação do velho e pensam: "já está no papo". Mandam encher outro copo que o velho Vito entorna novamente de uma golada só.

- Quanto é mesmo o cavalinho, meu amigo?

- É trinta. Trinta mil mango é o preço dele. Quem pagá leva.

Os dois da cidade grande se olham meio assustados; Pedem mais uma talagada para tirar a dúvida, e o velhinho emborca tudo de uma só virada.

- O cavalinho é quanto mesmo, meu amigo?

- É corenta. Corenta mil mango. Quem pagá leva.

Depois de mais uns três copos da branquinha, com o velho Vito já bêbado, de quatro e trocando as palavras, o cavalinho já estava custando setenta mil paus. Os dois negociantes cada vez mais assustados e ficando sem graça com a história. Entornam mais bebida no velho.

- E o cavalinho, velho, diga quanto você quer por ele?

- Ieu? Hic... quero nada não, moço! Hic... num é pra vendê mais não! Hic... Ia vendê ele pra tomá uns golo. Já tomei dimais da conta, agora vendo mais meu amiguinho não, uai! Hic!...

Autor – Eurico de Andrade (eurico2005@gmail.com )

Eurico de Andrade
Enviado por Eurico de Andrade em 10/08/2006
Código do texto: T213437