Um corte de cabelo para mim

Ela me disse que com mais um corte de cabelo masculino teria que acrescentar vinte reais à minha conta. Mas você ainda é aprendiz, estudante de curso de cabeleireiro, eu disse indignado com o valor que ela havia me cobrado. Exploração, completei. Ela disse que era isso mesmo, um corte custava esse preço, independente de quem estivesse fazendo o serviço.

Você fala bonito, eu disse. Eu estudei até o terceiro ano, me formei em escola particular, entrei na faculdade, mas na segunda semana já estava de saco cheio, ai larguei - o ritmo da fala dela era bom, nem rápido nem lento, a voz era bonita.

Então farei o seguinte, vou te buscar amanhã às oito horas da noite e vamos tomar uma cerveja, depois podemos fazer o serviço. Se você quiser, e eu também, mas você tem que ser bonita. Então eu vou ter que te contar uma coisa, ela disse parecendo um filme de suspense. O que poderia você me contar de tão escabroso?

Eu fumo um baseado sempre antes de fazer o serviço e depois também. Para uma coisa escabrosa ela tinha me contado aquilo com muita naturalidade. Só se for baseado do bom, eu respondi.

Ela disse é claro, afinal de contas quem vai trazer é você. Ah, faremos tudo na sua casa? Perguntei para mudar a conversa. Não, lógico que não, você vai trazer para onde quer que nós formos.

Tudo bem, eu disse, mas ai você abate cinco reais do corte de cabelo, tá? Explorador é você. Mas pensarei em seu caso. Acho melhor me pegar no posto, aquele da orla. Por quê? Por que eu acho melhor. Se você acha, eu acho.

Olha vou te confessar, meu cabelo está uma merda e vai dar trabalho. Que nada, ela disse com uma voz um pouco impregnada de sorriso, já estou acostumada, sou estudante, mas já tenho certa experiência. Ainda bem, eu disse, espero não me decepcionar, em nenhum dos sentidos...

Seu bobo, não vai não! Minha amiga que tinha um cliente que...

Olha, eu vou tenho desligar, meus créditos vão acabar. Eu a cortei logo, pois sabia que aquela ladainha de “minha amiga...” levaria alguns minutos e alguns reais. Tá certo, to esperando você amanhã viu? Não marcarei nenhum cliente.

Tá certo, um beijo. Outro, gatinho. Desligamos. Ela disse que não marcaria nenhum cliente só para me atender. Isso era bom, me fez me sentir um pouco mais homem, afinal minhas três namoradas estavam injuriadas comigo.

Pelo menos, alguém estava me dando moral. Mesmo que eu estivesse pagando para isso. E mesmo que fosse num motel, e não no aconchego do lar. A conversa era boa e a foto dela no site era muito, mas muito, agradável.

Valia a pena.