Olhos Suspensos

Ela olhou-me com olhos grandes e protuberantes. Meu corpo gelou imediatamente enquanto ela continuava me encarando. Tentei desviar meu olhar, mas a nossa distância era tão pequena que fiquei intimidado de fazer qualquer movimento; suspirei.

Dos seus olhos, pareciam sair correntes de ferro com ganchos na ponta. Esses ganchos se prendiam, dolorosamente, aos meus dois globos oculares e deixaram meu campo de visão imóvel. Era a imagem de uma pistola muito bem colocada e parada, pronta para disparar o tiro certeiro em seu alvo.

Vi o movimento das estruturas oculares dela e senti, instantaneamente, um calor subindo o meu corpo. Este calor fez o meu miocárdio contrair e relaxar em um ritmo frenético, quase não havendo distinção entre os movimentos de sístole e a diástole.

Junto com essas sensações fisiológicas, subiu pelo corpo uma imensa vontade de ajoelhar-me perante a ela e pedir arrego, ou então um desejo latente de quebrar aqueles ganchos que sua energia formava em meus olhos e, como um cão covarde, correr mais de cem quilômetros daquele local.

Eu poderia, naquele momento, fazer meus músculos e hepatócitos quebrarem grandes quantidades de glicogênio e obter energia suficiente para, em menos de cinco segundos, estar embaixo dos meus cobertores e longe dos perigos dos olhos dela.

Mas sua presença, bem ali, diante de mim, me intimidava e mais parecia que eu estava envolto por uma enorme pedra de gelo que paralisava minha fala e meus movimentos. Nessas ocasiões o mais sensato é manter-se onde está e esperar que ELA dê, ou dite a próxima cena.

E foi exatamente assim, sem tirar nem pôr palavras ou ações que aconteceu: eu tive tempo de, apenas, dar um pequeno suspiro antes que ela levantasse um apêndice do seu corpo, localizado na sua cabeça. Por já ter estudado biologia em algum momento da minha vida escolar, observei que aquela estrutura era sua quelícera bi articulada. Sim ali mesmo, nesta parte do seu corpo, havia uma glândula com veneno que poderia ser letal a alguém como eu.

Alguns segundos depois de eu avistar a arma que poderia acabar com minha vida, ela abaixou sua peçonha e agilmente caminhou, fazendo um percurso de cento e oitenta graus, em volta de mim. Eu sentia a energia do olhar daquela aracnídea e os ganchos, que outrora se prendiam aos meus olhos, cravarem-se na minha nuca.

Aquela energia de caçadora atingiu o meu cerebelo e o equilíbrio do meu corpo ficou comprometido. A partir dali, meu corpo entrou em profundo coma, ainda em pé. Senti que estava flutuando em um ar leve, desafiador da gravidade. Os alvéolos dos meus pulmões estavam elastecidos e a ventilação interna tornou-se fácil e tranquila.

Eu deslizei dentro dos ares mais suaves da minha vida e fui parar debaixo dos meus cobertores, já pronto para acordar e ir ao meu primeiro dia de aula da faculdade de biologia.

Ô excitação!

Malluco Beleza
Enviado por Malluco Beleza em 31/07/2011
Reeditado em 06/05/2014
Código do texto: T3130179
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