VISITA AO CEMITÉRIO INDÍGENA

Em uma sexta-feira, Maria chegou em casa e disse para sua mãe que a professora de História havia dado um trabalho sobre os povos indígenas. A surpresa de sua mãe foi tão grande que ela mesma lembrou, quando era estudante, de um trabalho feito por ela e sua equipe sobre os povos indígenas. Ela se lembrou que fez sobre uma possível aldeia, que se encontrava a oito quilômetros da cidade e era fácil o acesso até o local.

Feliz, ela disse à filha que saberia o local: um possível cemitério indígena, datado por volta de 1745 mais ou menos. Sua filha ficou tão feliz, que lhe deu um beijo bem demorado. Alegre, a menina foi logo contando para seu pai, o qual também gostava muito de história. Saiu apressada e disse ao seu avô como estava feliz com a notícia.

Na manhã seguinte, convidou sua professora e mais alguns membros do grupo, juntamente com a mãe, o avô e um motorista para dirigir uma Kombi, de nome Waldemar. Muitos mitos foram contando pelo caminho. A quantidade de índios que ali viviam, seus costumes, até mesmo uma possível achada de material arqueológico que seria enviado para a análise na universidade federal. Seria uma grande glória para aquele grupo de alunos. Imagine, seus membros terem encontrado material arqueológico e serem entrevistados pela Rede Globo, no Jornal Nacional. Que maravilha sonhar, mas o fato poderia ser realizado.

Durante o trajeto, a viagem foi rápida, pois a estrada era asfaltada e poucos quilômetros separariam a cidade daquele lugar. Apesar de ser perto, assim que a estrada asfaltada terminou, tiveram que rodar por uma estrada de terra, cheia de buracos, de muita pedra, de muito cascalho. Viam-se várias paisagens, que até fotos foram tiradas.

Em um determinado tempo, avistaram o tal lugar, ou seja, um lugar possível de ter existido o tal cemitério indígena. Foram todos correndo, mas a surpresa foi tão grande que naquele local não era o verdadeiro lugar.

Maria, muito triste, dizia para sua mãe e sua professora:

- Que falta de sorte foi a minha. Gostaria muito de ir até o local, pois o meu maior sonho é conhecer e fazer minhas anotações. Quando eu crescer, vou dedicar-me exclusivamente ao estudo de Arqueologia. Sinto-me muito feliz ao estudar a matéria na cadeira de História. Tenho uma grande professora, muito sábia, muito educada e não quero decepcionar-me no futuro.

- Calma, minha filha. Foram muitos anos que aqui eu não venho. Deve ser outro local. Vou ligar para o prefeito. Ele foi criado aqui. Provavelmente, ele saberá o local.

No mesmo instante, com o celular em mãos, ela, chamada de Flávia, ligou para a casa do prefeito e foi diretamente atendida por ele.

- Sr. Prefeito, eu, Flávia, mãe de Maria, aluna de Terezinha, mais algumas pessoas, estamos tentando localizar o local do possível cemitério indígena. Estamos aqui, no alto da região da Tartália, e ainda não sabemos onde encontrar. Já rodamos muito e nada de encontrar o local. O Senhor nasceu aqui na região e deverá saber onde fica.

- Dona Flávia, estou muito feliz por ligar para mim. Esta região é sempre lembrada por mim, pois foi daí que aprendi os meus primeiros passos, aprendi a ser cidadão e dar valor aos destinos e símbolos da nação. Gosto muito de ir por esta “banda” e pergunto onde vocês estão.

- Estamos no alto da colina, onde se avista parte do rio.

- Podem esperar por mim. Daqui a quinze minutos eu e meu assessor estaremos aí. Será um grande prazer ajudar vocês, meus grandes e nobres eleitores.

Ao passo de quinze minutos, o Sr. Prefeito e dois assessores já estavam lá, conversando com Maria e Flávia.

Seu Waldemar disse que era para apressarem, porque o tempo não estava muito bom. Haviam muitas nuvens de chuva para o lado sul e o vento começava a soprar mansinho, fazendo com que as árvores balançassem seus galhos e uma pequena brisa mansa soprava seus rostos.

- É naquela direção, disse o Prefeito, de nome José Antônio. Vamos.

- Flávia, este meu assessor de nome Juca. Ele é muito espiritualista. Ele já me disse que conversa com gente que morreu. Ontem, ele disse que a filha do Eduardo, que morreu de acidente de carro, no mês passado, falou para ele que estava em um ótimo lugar, cheio de luzes, onde seus companheiros eram todos felizes e pediu para a família não chorar por ela. Apenas rezasse mais e deixasse de falar em coisas mundanas.

- Olha, Sr. José, eu não acredito muito nestas coisas. Obtive informações do Pedro da Estação que o local tem muita cobra. São muitos cascavéis, mais outras espécies. Eu tenho muito medo.

- Não se preocupe, Flávia. Este meu assessor (batendo com alguns tapinhas no ombro de um sujeito moreno, de quase dois metros de altura, cabelos cortados e com algumas entradas de calvo, que se trajava com uma calça jeans, uma bota preta, muito bem engraxada, camisa de manga comprida e com um enorme facão em uma de sua mão) atendendo pelo nome de Juca.

- Rá, Rá, Rá... Sorria Juca dizendo:

- Madame, eu sei muita coisa desta vida. Já enfrentei todo e qualquer tipo de perigo. Já matei cobra com a salto de minha bota. Já rezei muito pelos mortos e sei que eles não vêm me incomodar. Feche os olhos e lembre-se que estamos na proteção de Deus. Ele é a nossa guia. O cemitério dos índios é logo ali, perto daquela colina, onde se vê uma volta do braço do rio. Têm várias pedras lá. É o local preferido deles. Porém, já fiz minha oração e eles não vão chegar perto de nós.

Já sem medo, foram eles tranquilamente caminhando por aquele lindo caminho, cheio de árvores verdes, vários pássaros cantarolando suas canções. De vez em quando, o vento soprava forte, mas era normal. O sopro do vento assemelhava-se com aqueles vistos em filmes de terror...

- Chegamos, dizia Juca, com sua voz forte, meio rouca. Não se sabe da rouquidão: era cansaço ou se estava com um pouco de medo do local.

Diziam outras fontes que naquele local eram vistas várias luzes. Não se sabe se eram luzes de caçadores, se eram faróis de carros ou qualquer outro tipo de luz misteriosa.

Em uma planície, totalmente cercada de pedras, via-se um canteiro cheio de marcas, algumas cruzes, pinturas sinistras, bambuzal plantado em volta, muitas pedras soltas e algumas empilhadas. Era um lugar bastante feio e triste.

A alegria de Maria era muito. Conseguia, porém, realizar o seu sonho. Com seu celular, ela tirou várias fotos, correu por entre as pedras, chegou ao rio e chamando suas colegas, elas anotaram tudo o que estava a sua volta.

O prefeito, o motorista, o pai e a mãe de Maria conversavam tranquilamente sobre o local. Todos estavam felizes. O prefeito relembra seus tempos de criança, falava de sua família que ali iam todas as semanas rezar pelos mortos indígenas, enfim, uma linda e grande conversa entre eles reinava.

Passado um certo tempo, alguém olhou na direção de Juca e o viu meio transformado. Não falava nada, tinha o olhar fixo em alguma coisa.

- O que está acontecendo, disse Flávia para Juca.

Ele não se mexia. Seu olhar permanecia fixo em alguma coisa. Sua cor morena estava passando para a cor branca. Seu rosto suava muito. Sua camisa estava molhada de suor. Suas mãos estavam fixas em alguma coisa, pois ele estava sentado em uma das pedras de um túmulo. Não fazia nada, sem mesmo seus olhos movimentavam corretamente.

- O que foi? O que você tem? O prefeito gritava com Juca afim de obter uma resposta.

- Já sei, dizia Waldemar.

- Ele falou que conversa com os mortos. Ele deve estar em um papo bem longo com eles. Ele está concentrado mental e espiritualmente. Não vamos incomodá-lo. Faz parte do ritual aos mortos, quando alguém que conversa com eles está no local, não se pode importuná-lo.

Pensando nesta filosofia de Waldemar, os outros continuaram a conversar, enquanto as meninas aproveitavam o local, o tempo, o passeio e a alegria de estarem naquele lindo local.

Flávia, meio preocupada com a atitude de Juca, pois sabia que aquilo não era normal, insistiu para que os outros aproximassem dele e verificassem o que estaria acontecendo. Ele estava quieto, mas gemia forte, como se estivesse querendo dizer algo. As palavras não saiam de seu boca, nem mesmo o som do gemido era ouvido pelas crianças, pois elas faziam muita algazarra e gritavam muito.

Aproximando-se dele, Flávia foi aproximando devagar. Juca estava parado. Seu rosto era somente suor e estava pálido.

- Ele está conversando com o cacique, dizia Waldemar. Devem estar conversando sobre o que era no tempo dos índios, seus costumes, suas línguas e suas tradições.

Mais uma vez, Flávia aproximou-se bem devagar, olhando para todos os lados e olhando bem detalhadamente, percebeu que algo estava errado: Seus braços não estavam agitados e sua mão segurava algo.

- Venham aqui depressa, disse Flávia desesperada. Ele está com alguma coisa na mão, perto de sua perna. Não sei o que é, mas ele está assustado.

Vieram todos correndo e a grande surpresa foi: Ao invés de Juca estar conversando com o cacique, o qual era sugerido por Waldemar, ele estava segurando uma grande cobra, que o picara na altura de seu joelho. O susto dele foi tão forte, que ele segurou a cobra na perna, matando-a sufocada e a boca dela permanecia presa na perna dele. O Waldemar estava enganado. Ao invés de Juca conversar com o cacique morto, ele estava tentando chamar os outros para tirar a cobra de sua perna.

Vieram todos correndo e no mesmo tempo, levaram Juca para o hospital.

Passou o tempo. As alunas apresentaram o trabalho e foram escolhidas para apresentar na universidade federal.

Juca, porém, demorou algum tempo para recuperar, mas recuperou e teve alguma sequela. Andava mancando da perna picada pela cobra e recebeu o apelido de “Juca Segura Cobra”.

Acadêmico José Carlos de Bom Sucesso – Cadeira IX – Academia Lavrense de Letras – 25/11/2017

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 25/11/2017
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