Doutor Psicopata - A Confissão

Talvez eu nunca confessasse meus pecados se não estivesse em meu leito de morte e essa fosse a minha última chance de mostrar um lado que sempre escondi, porém um lado que sempre me deliciei em ter.

Meu nome é Rui, tenho 59 anos e estou morrendo. Minha vida foi dedicada à medicina. Assim que meu pai percebeu a minha tendência a ajudar animaizinhos indefesos, foi logo me falando sobre biologia e todo o milagre que era a vida. Mal sabia ele que era EU que causava dor aos pobres animais. Aos 10 anos, eu tinha matado mais gatos que toda carrocinha da cidade e nem era pra fazer sabão. Eu simplesmente adorava vê-los agonizando.

Na escola, não poderia ser diferente, enquanto todos os outros alunos alimentavam e brincavam com os hamsters , eu simplesmente os abria e dissecava. A professora e os alunos me olhavam horrorizados, meus pais foram chamados diversas vezes. " Este menino não tem limites"! Dizia a diretora da escola aos meus pais, enquanto eu simplesmente fazia cara de anjinho arrependido. Mesmo assim continuei a estudar, mas aprendi a fazer meus experimentos às escondidas. Cada vez mais gatos, cachorros, passarinhos e todo e qualquer ser do reino animal que cruzasse meu caminho tinha sua vida ceifada em nome da minha intrínseca vontade de ver a dor.

Cheguei à faculdade. Meu Deus! Eu era o melhor aluno do curso! Muitos desistiam do curso ao ver um cadáver e sangue, mas eu? Eu não não. Aquilo só não era mais "orgastico" pelo fato de não ter visto o último suspiro do morto.

Aos 30 anos, eu já estava formado e trabalhando em um renomado hospital da cidade. Casei-me com uma tímida enfermeira. Seu nome era Divina, e tal como o nome, ela era maravilhosa.

Sim! Eu já havia assassinado naquele hospital. Às vezes, eu lhes receitava remédios errados ou simplesmente desligava a máquina que os mantia vivos.

Depois era apenas observar seus olhos esbugalharem com horror enquanto a vida se esvaia.

Um dia, minha mulher caiu tísica. Obviamente não me apressei em curar-lhe, não por falta de amor, mas porque a sensação de vê-la definhando era maior que todo amor que eu podia sentir por ela... E foi assim dia após, dia... Divina me lançava um olhar triste. Tenho certeza que ela soube quem eu era, pois eu lhe devolvia sorrisinhos malicioso. E morreu.

Em seu velório, notei que o diretor do hospital chorava quase que copiosamente. Lembrei rapidamente de todas as vezes que ele vinha nos visitar sem nunca ter sido convidado por mim ou de como ele sempre se sentava ao lado de Divina no refeitório. Esses fatos teriam passado despercebidos, pois a minha saga em causar dor era mais forte do que qualquer tipo de emoção, não fosse aquele momento de despedida à Divina.

Ele tocava-lhe as mãos frias e chorava, tocava-lhe o rosto e fazia uma cara de dor impagável. E quanto mais ele demonstrava dor e sofrimento, mas eu me deliciava, mais meus olhos brilhavam, quanto mais ele a olhava com lamento, mais eu me sentia completo e pleno. Talvez o nobre leitor possa explicar. Mas há sensações que são absurdamente mais fortes que o amor e ciúme.

Carol Galvão
Enviado por Carol Galvão em 21/01/2019
Código do texto: T6556001
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