Fica calmo. Um dia passa

- Maria Vitória, precisamos conversar.

- Tudo bem, Marcelo Henrique. É bom mesmo resolvermos nossos impasses

- Por mim já está resolvido, quero a separação. Não dá mais pra continuar, não nos entendemos mais.

- Concordo plenamente, nem parece que namoramos dois anos, noivamos mais dois e quando nos casamos, bastava um olhar para o outro compreender, hoje não temos mais a cumplicidade.

- Ainda bem que você é compreensiva, Maria Vitória. Tivemos nossos momentos bons, e não foram poucos.

- É verdade, Marcelo Henrique. Tivemos uma vida harmoniosa, com poucos e banais desentendimentos. Mas não sou somente compreensiva, meu bem, sou inteligente. Por que tentar segurá-lo se você com certeza encontrou uma motivação que não tem mais aqui?.

- Essa é a Maria Vitória, perspicaz também, sagaz. É isso, meu anjo, encontrei uma mulher que me completa.

- Não duvido, Marcelo Henrique, muito provavelmente um complemento da cintura pra baixo, né? Faz tempo que se conheceram?

- Não. Na verdade faz pouco tempo mas sei que é ela que eu quero.

- Sem problema, Marcelo Henrique, mas é você quem vai falar com as crianças e explicar bem explicadinha a sua decisão.

- Claro, Maria Vitória, só não consigo ver onde estão as crianças de que você fala. Uma com vinte e três e outra com vinte e cinco, já são bem grandinhas.

- Essa a diferença entre nós, Marcelo Henrique, meu amor, para mim as crianças serão sempre crianças, posso entendê-las como crianças e posso compreendê-las como adultas. Aliás, você não tem o mínimo diálogo com suas filhas.

- Estávamos indo tão bem na nossa conversa, Maria Vitória, mas lá vem você querendo filosofar e psicologar em cima de mim.

- Longe de mim querer psicologar em cima de você. E daqui pra frente, nem embaixo e nem no consultório. No meu divã? Nunca mais, baby. E vamos encerrar por aqui, pegue todas as suas coisas e faça bom proveito do seu mais novo amor...muito mais novo, provavelmente... E Marcelo Henrique saiu de casa, de mala e cuia e um sorriso vitorioso nos lábios. Enfim teria todo o tempo para seu novo grande amor, literalmente. Ele com cinqüenta e oito anos e ela com 21.

Dois meses depois

- Alô! Quem? Marcelo Henrique? Quanto tempo, como você está? Tomara que muito bem .

- Alô, Maria Vitória. Podemos nos encontrar? Quero conversar com você.

- Ainda moro no mesmo lugar, Marcelo Henrique, venha até aqui se quer conversar.

- Está bem, quando?

- quando você quiser, afinal a necessidade é sua.

- Não precisa ser ferina, Maria Vitória.

- E quer saber? Venha não, pode dizer por telefone mesmo. O que você quer conversar?

- É meio difícil dizer por telefone, mas.... Está bem, Maria Vitória, quero voltar para casa, para você e para as crianças?.

- Como é que é? Repete, por favor, acho que ensurdeci ou será que ensandeci?

- Q u e r o v o l t a r p a r a c a s a , p a r a v o c ê e p a r a a s c r i a n ç a s.

- E o seu novo amor, aquele que te compreendia da cintura pra baixo?

- pois é, a gente não se entende.

- Ela só te compreende da cintura para baixo e você não a compreende do pescoço para cima. É isso, né?

- É sim, Maria Vitória. Mais uma vez a sua perspicácia acertou em cheio. Não entendo nada do que ela diz, ela não gosta dos lugares onde a levo, não gosta de estar com meus amigos, só gosta de lugares barulhentos e com gente que não diz coisa com coisa. Não aguento mais.

- Fica calmo, Marcelo Henrique. Fica calmo porque o nome disso é juventude, um dia passa. Adeus.