ESPERTEZA FRUSTRADA

Contam que na época em que o pau estava se quebrando lá para os lados do Canal de Suez, a ONU solicitou ao Brasil que enviasse tropas para manter os contendores afastados a fim de garantir paz naquela região onde nunca houve, e possivelmente, nunca haverá paz, porque o arranca rabo é constante entre as diversas etnias que, apesar de vizinhas, se odeiam desde sempre.

O navio que levava os novos “pracinhas” para o front, atracou em Casa Blanca, no Marrocos, para reabastecimento.

Nessa época os rádios de pilha eram daqueles grandões que consumiam rapidamente as pilhas que, por sua vez, tinham vida curta, pois a tecnologia para confeccioná-las com elementos radioativos surgiu muitos anos depois durante a corrida espacial.

Alguns marinheiros que estavam de folga, desceriam para a terra e entre eles um foi encarregado de comprar as pilhas para o rádio do sargento que, por estar de serviço, não poderia deixar a embarcação.

- Cá estão os dólares para a compra, a pilha é dessa, qualquer marca serve e compre tantas quantas o dinheiro der.

Já de volta, o marinheiro vai ao sargento e afirma categoricamente que os dólares tinham sido furtados numa daquelas ruelas da Medina e que ele não teve condição de perseguir o gatuno.

Todo mundo sabe que o Marrocos é país onde 99% da população é muçulmana e que o ladrão quando identificado terá a mão direita cortada.

Por isso é muito baixa a ocorrência de furtos pelas ruas onde o infrator seria rapidamente identificado e castigado.

Quando a historinha do roubo se espalhou, os colegas mais chegados ao sargento sugeriram que desse uma prensa no marinheiro para que ele contasse o que realmente havia acontecido.

Depois das juras e mais juras de que estava falando a verdade o caso teria ficado no esquecimento não fosse a alternativa encontrada pelo marinheiro para devolver o dinheiro.

Bem mais tarde, com a cara mais lavada do mundo, se apresentou ao sargento e disse:

- Senhor, cá estão os dólares que o habibe veio devolver.

- Como é que é? Que história é essa?

- Eu estava sentado na proa para ver o pôr do sol quando ouvi alguém, do cais, gritando hei! Brasilino. Quando perguntei o que ele queria, ele me chamou e devolveu o dinheiro dizendo que tinha sido uma brincadeira...

O sargento desconsiderou a possibilidade de qualquer punição, mas quando a historinha se espalhou e até que o marinheiro desse baixa do serviço militar, todos só o chamavam de Brasilino.

GLOSSÁRIO

Habibe – Amado, querido, amigo.

Medina – cidade árabe antiga cercada por muros, geralmente encravada em cidade grande e nova

Proa – parte anterior de toda embarcação.