CO DIANHO NO CORO

Minha nona sempre contava umas história isquisita,

I um dia qui eu num obedeci, ela deu di mi moralizá.

Contô qui havia uma minina di uns deiz ô dozi ano,

Assim qui nem eu, qui vivia di quizilá, arrumando confusão,

Im tudo o qui ela fazia, a nona inté dizia, qui o dianho botava a mão.

Fazia os otro sofrê, num arespeitava ninguém,

Disaforava, gritava, num importava a quem.

Intão deu-se qui numa noiti, bem tardi da madrugada,

Os pai da minina acordáro, cuma bateção danada.

Além di munto relâmpio, tamém munta trovoada.

Era chuva qui Deus mandava, uma ventania atentada,

As porta i as janela da casa, tava tudo arriada,

Batendo im desatino, aumentando a baruiada,

Num dava di intendê, o qui tinha acontecido,

Tuda aquela confusão, i a minina tinha sumido.

Começaro a procurá, mais nada di ela incontrá,

Chamaro tudo os vizinho, já tava crariându o dia,

Cada grupo foi prum lado, pra incontrá o “diabinho”.

Ninguém da minina gostava, mais por consideração dos pai

Saíro abaxo di chuva, assombrado i rezando baxinho.

I quandu amanheceu, a chuva tamêm parô,

Abriu um sol di rachá i lá do arto do morro,

Um dos hômi gritô “Achêmo, ela tá aqui!”

I tudo mundo correu, morro acima, pra vê o qui aconteceu.

Num acriditaru no qui via, as muié si ajueiaro i puxaro “Ave Maria”.

Os hômi, cum foice i facão, abria uma ispinhêra trançada,

Onde no meio tava deitada, a minina indemonhada.

Demoráro umas trêis hora, pra chegá adondi ela tava,

O seu corpo era só marca, i ela num mais respirava,

Saía sangue do zóio, da boca, do nariz, i uma catinga danada.

Pegáro a infiliz colocáro dipressa num caxão i lacráro,

Currêro pro cimitério i interáro im siguida,

Fizéro uma cova mais funda do qui era di midida,

Pra interá cum ela, as maldadi qui ela fazia im vida,

I nunca mais si ouviu falá di otra coisa paricida.

Os seus pais si disgostáro cum tudo o qui aconteceu,

I uma semana dispois, um vizinho incontrô eles

Inforcado lado a lado, numa arve perto da casa,

Qui na mema noiti incêndio, num instanti virô brasa.

I ninguém discubriu como, só diziam “É coisa Daqueli!

I a nona pra mi fazê tê mais medo dizia. “Do Demo, não.

É coisa di Deus, qui castiga quem é ruim, i nessa indiabrada deu fim,

Matando inté a raiz.” Eu, atenta, nem piscava,

I quando im aprontá eu pensava, mi dava uns arripio,

Mi alembrava da minina e disistia da traquina.

(Causo publicado no livro O causo é bão? Aí, vareia, né?, 2016)

Cleusa Piovesan

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Cleusa Piovesan
Enviado por Cleusa Piovesan em 23/07/2020
Código do texto: T7014304
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