FUTEBOL COM BADÉ

É manhã com a graça de Deus e com as graças de todas as manhãs. De frente para computador sei que terei um turbilhão de demandas, nada fáceis, dia adiante. Alda me traz fumegante e saboroso café. "É pra pegar disposição" – ela diz. Penso "essa senhora é gente muito das bacanas" e falo pra ela de maneira bem popular "é tudo que preciso agora, jogar um pretinho no peito". O telefone não tocou ainda. Costumo irritar-me quando mal me ajeito na sala e lá vem aquela campainha ordinária para anunciar um pedido, para fazer-me inquirição, para colocar-me fardos. Não, não havia tocado, e nem o Ramos se apresentara para dar soluções mágicas a todos os problemas que afligem a humanidade, com aquela costumeira e prolixa oratória. Demoraria um pouco ainda para ele chegar e dizer que era por causa de pequenos detalhes, dessas coisinhas, desses displicentes enganos, tipo grafar um "s" quando deveria ser "r" em um documento, que os aviões estavam a cair – Diria isso com a convicção de um conhecedor de causa. Mas antes disso, aparece Badé, jeitão maroto – um garoto ainda - para lembrar que haveria uma "pelada" ao final do expediente. Pensei "nossa, hoje a minha máscara cai". Não foi uma vez só que eu tinha posado com a "marra de jogar fácil". Teve o dia que ao ver o gramado verdinho, convidativo para praticar o esporte bretão, que num arroubo disse para todos – até para os que não queriam ouvir – que quando matava a bola no peito, parecia que a colava na "caixa torácica".

O Badé, o "dono de João Neiva" – percebo que ele se diverte quando o chamo assim – , havia passado na minha sala com um largo sorriso não só para lembrar, mas para "intimar". Queria ver meu jogo. – Olha, não vai esquecer o nosso trato futebolístico! – Claro Badé, claro que vamos, vou lhe mostrar como "jogar fácil".

Horário de verão, um pedaço de dia ainda pela frente, o campo ladeado de gente com aparelhos nos dentes – quase todos alunos do CEFETES, as cigarras se "rasgando" de cantar nos arvoredos depois da cerca. Só faltavam fogos para virar festa.

Calcei as chuteiras como quem pratica uma liturgia: dando peso a cada mínimo gesto. Depois a camisa 22 do Milan, para dar sorte e disfarçar a incipiente "pança". Gel no cabelo seria demais...

Os "V-7" entraram em campo de mãos dadas e vistosamente uniformizados – eram uns fanfarrões – com direito a fotos e tudo. Pensei: depois do jogo vão deletar essas fotos por desgosto!

Bem que dizia um personagem de uma série de Tevê: "certas coisas só ficam bem na nossa imaginação!" Fui traído pelo ufanismo... Nem um minuto, um garoto, mirrado e baixinho, chamado "Bambu", passou fácil por metade do meu time e guardou a bola no barbante. Depois? Depois foram outros e mais outros e mais outros. Parei de contar. Não estava me entendendo com a "pelota", que parecia viva, malcriada e com pirraça. A garotada se multiplicava, só se via gente de uniforme laranja pelo campo e "jogando fácil". Estava travado, rijo, um touro praticando futebol. Quando ouvi os gritos de olé, tive uma brilhante idéia: em mais uma jogada pelas minhas costas (entendamos no sentido futebolístico), caí e já que estava caído, fingi-me de morto, recusando a enfrentar aquela situação inóspita. Tínhamos um reserva: o professor Jésu.. Bem que poderia ser Jesus. Saí...

Quando o jogo acabou, o Badé veio em minha direção e, valendo-me de um pensamento mais patético que minha atuação, pensei: O Badé vai mangar de mim, mas um sujeito que mete um Wellaton para deixar o topete nesta tonalidade ruiva e usa um tênis tão colorido não pode me troçar. Ele falou – agora que já jogamos juntos, só falta tomarmos uns aperitivos lá em João Neiva. Você está intimado para ir lá. Vou lhe mostrar a cachoeira do Paraíso. Ah, e tem também a Cachoeira Piva...

O badé é dos bons. De bola e de ser gente. Melhor do que eu que não merecia tomar aperitvo nenhum - e nem abraço de cachorra e nem banho de cachoeira!

Ao menos pude aprender alguma coisa naquela partida de futebol. Coisa melhor que jogar fácil.

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Convido-o, meu caro leitor, a acessar o blog "Crônicas do Joel - Contos e Crônicas ( http://cronicasdojoel.blogspot.com ) ou busque no GOOGLE por "Crônicas do Joel".

QUE DEUS LHE DÊ TUDO DE BOM!

Joel Rogerio
Enviado por Joel Rogerio em 07/11/2007
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