Eu te amo tanto...

Ela acordou e saiu da cama devagar. Aqueles pés caminharam por toda a casa enquanto todo mundo ainda dormia. Olhou tudo que podia olhar e voltou ao quarto. Segurou a coberta tentando dobrá-la com cuidado e caiu algumas vezes no tapete macio. Riu sozinha e voltou na sua tentativa frustrada. Cobriu a cama com o que conseguiu e se olhou no espelho. Viu os fios finos do cabelo bagunçado e com a mesma face de quem faz algo que não deve fazer começou a pentea-lo. Puxou por alguns minutos a cortina pesada, deixando alguns pequenos raios de sol entrarem no quarto pelas frestas da janela, subiu na cadeira e abriu-a com dificuldade, fechou os olhos cor de mel e sorriu enquanto a brisa tocava seu rosto. Olhou o relógio na criado mudo e com cara de espanto correu pelas escadas.

Pés descalços deixavam um rastro de inocência pela sala.

Chegou na cozinha, colocou a mão no queixo enquanto olhava o armário com toda a delicadeza. Abriu várias gavetas, portas e com cuidado ia colocando varias coisas sob a mesa. Subindo e descendo da cadeira branca, prendendo e soltando o cabelo, rindo e mordendo a língua, todo instante era destinado a sua concentração e ela conseguia montar todo o plano e colocá-lo em prática.

Corria algumas vezes até a sala, olhava para a parte de cima da escada e voltava para a cozinha.

Continuava.

...

Abriu a torneira da pia, subiu na mesma cadeira e começou a lavar tudo. Tudo jogado lá dentro levando água e um pouco de pureza, eram amontoados ao lado em seguida. E ela sorria docemente.

Abriu a porta, correu para o jardim e ficou olhando o cachorro vir na sua direção. Abaixou, acarinhou-o e ficou observando todas as flores.

- Qual ela gosta mais?

O cachorro correu para o gramado e ela levantou, andou devagar enquanto escolhia a dedo a melhor flor.

- Amarela.

Pegou a primeira e olhou desconfiada para a porta da varanda. Voltou-se novamente para o jardim e colheu as seguintes.

- Vermelha e roxa.

Correu para a cozinha, pegou um copo e encheu de água, virando rapidamente para a mesa. Parou. Olhou a toalha da mesa e pensou.

Pensou...

Colocou o copo do lado, abriu uma gaveta e jogou a nova toalha por cima. Arrumou tudo e bateu palmas para si mesma. Pulou algumas vezes e novamente voltou ao quarto.

As marcas dos pés inocentes agora eram reais, com a grama do jardim atravessando a sala, subindo as escadas e entrando no quarto rosa.

Pegou uma folha, alguns lápis de cor e voltou.

Desenhou por vários minutos sentada na cozinha, esperando o momento que todos acordariam. Um sono calmo se aproximou e fechou aqueles belos olhos pequenos.

Adormeceu.

Na mão que soltava ao desenhar e pintar, uma família unida estava retratada.

" Feliz aniversário mamãe!!! "

Não demorou muito, Rubens acordou. Algumas lágrimas saltaram de seus olhos enquanto - parado na porta da cozinha - via a pequena filha dormir junto a surpresa preparada para a mãe.

A mãe que estaria completando 32 anos naquele dia, não fosse um acaso do destino.

A mãe que, presente na vida da filha de qualquer maneira... Exalava amor por todos os cantos da casa.

...