Súbito Fascínio

Ele saiu de Copacabana por volta das vinte horas. Faminto. Resolveu fazer à pé seu caminho de volta para casa, no Cosme Velho.

O negócio é evitar os túneis.

Simples.

Foi.

Para chegar em Botafogo, onde pretendia conhecer um bar que o falaram muito, segundo sua estratégia, viu que o único modo seria pegando a Lagoa Rodrigo de Freitas. Só nela foram-se uma coisa entre uma hora, uma hora e meia. No meio do caminho, se deu conta que passara por uns prédios onde moravam 3 amigos seus. Voltou. Ao questionar o porteiro, descobrira que agora eram os proprietários os atuais moradores.

-Não moram mais aqui há algum tempo. Cada um foi pra um lado.

-O Leo pra Campinas?

-... o Yron pro Leblon e o outro lá...

-...

-pro Flamengo.

-Bom saber. Obrigado.

Passou na casa de outro amigo, já no Humaitá.

-Eu só quero interfonar, não vou subir, não.

Ninguém atendeu. Passou defronte ao bar.

Fechado.

Perguntou a algumas mulheres do culto ao lado e todas concordaram.

-Alguma coisa aconteceu. Hoje é terça? Era pra estar aberto.

-Será?

Na verdade nem precisava ter conhecido por dentro, pois “todos os bares já estão dentro dele”. Mas tinha um que gostava, e era por ali.

Lembrava mais ou menos... Visconde de Caravelas, Conde de Irajá... Passou e o nome... era outro.

-Não é possível!

Teve que dar a volta em dois quarteirões para ter certeza de que estava certo. Não estava. Era Visconde de Caravelas sim, mas cruzando com outra, Capitão Salomão, talvez, não foi importante perante o alívio.

Não entrou no bar.

Parando logo depois, no Shopping da praia de Botafogo, perguntou se ali havia um boteco da tal mesma rede. Havia.

Subiu até o oitavo andar, foi direto. O garçon nem deu muita bola, porque era final de alguma coisa.

-Não. Se é terça, não é final. É só um jogo... – mas não entende de futebol, podia ser que fosse.

As pessoas-clientes o olhavam, e ele crente que por sua aparência. Mas bem que podia ser também porque não sentava-se e nem de vidro, muito menos transparente, era, é ou vai vir a ser.

Encostou-se no muro. Que dava pro além. Deu uma olhada pra baixo, de soslaio, meio que para se dar conta de que era mesmo o oitavo andar, e pulou.

Pulou nada. Saiu dali imaginando alguém que fizesse exatamente isso que ele pensou, mas não fez.

-Pra variar...

A sequência disso foi foda, pra ele.

Deixando o Shopping, passou por uma lanchonete, com um rapaz levemente loiro, usando uma roupa levemente social, porém bruscamente bonito, fazia seu pedido.

Tinha uma banca de jornal em frente à lanchonete. Ali ficou parado. Esqueceu da mulher e filhos – que o esperavam no Cosme Velho. Isso foi rápido, mas pra ele já foi muito, nunca tinha feito isso... Por nada e por ninguém.

-Nada nem ninguém? – pensou. Que triste. Nem mesmo na infância?

-É, talvez... – se voltando para a praia de Botafogo, o Pão de Açúcar e uma lua que 4 dias atrás estava plenamente cheia. Ah, sim: e um céu estreladíssimo.

Voltou a si novamente e retomou sua caminhada. Não passou nem bem uma outra esquina e estalou que nunca tinha feito muita coisa. Deu mais alguns passos e mudou o sentido de seu trajeto, rumo ao brusco camarada que lanchava lindo.

Em frente à mesma banca, novamente, buscava um meio alibidinoso para poder estar ali, enquanto o rapaz pagava sua conta e recebia sua sacola.

-Quanto é o incenso? – odiava essa porcaria... Sempre odiou. Nunca comprou. Resolveu comprar um. Jasmim. $1 real. O dono da banca demorou para dar o troco, para ele, e tão logo teve seu $1 real de troco, partiu bruscamente decidido à perseguir o... será que era tão lindo assim?

O rapaz andava rápido. Decerto que o aguardavam com aquela comida toda na sacola. E qual não foi a surpresa quando ele parou numa barraquinha de hot dog? Mas já não levava comida?

-...

Ameaçou comprar um hot dog também, mas nunca que comeria dessas porcarias da rua. E não comeu. Só que foi irresistivelmente atraído para bem perto do moço, e pode olhá-lo como queria.

-Lindo mesmo.

Pegou sua caixinha de incenso, cheirou uma vez, deu alguns passos para disfarçar, já que o rapaz o olhava, e fingiu ter esquecido algo. Criando o álibi para continuar em direção a seu lar.

Comprou cervejas quentes num supermercado da Marquês de Abrantes. Estacionou na Praça São Salvador e tentou escrever sobre sua saga ali mesmo, até ser incomodado por um mendigo que dizia não sê-lo, e sim doutor.

-Vocês mendigos são todos doutores sim. Em inconveniência! – pensou novamente. Ficou sem saber pra onde ir, até que recordou que havia o Parque Guinle, apresentado a ele muito tempo atrás, por um desses amigos que já não via há tempo.

-Fica ali, dobrando a esquerda. – passou por três casais que prevaricavam, ao som das águas-riacho naturais, e encontrou seu canto numa mesa de granito e cimento, dessas para xadrez e/ou damas. Acendeu seu cigarro e mais um mendigo se aproximou.

-Meu Camel acabou.

Ele deu um Hollywood a ele. Pegou as folhas de caderno que pediu à moça do supermercado e tratou de escrever.

Quando estava lá pela parte do “lindo mesmo”, pintou uma dúvida. Ele pensou isso, pensou em voz alta ou falou isso pro rapaz? Não tinha a menor condição de chegar à verdade.

-Quer saber de uma coisa? A verdade é que isso não tem a menor importância.

E não tinha ainda chegado no largo do Boticário, no Cosme Velho, quando essa história chegou ao seu final.