Amizade…

Amizade…

Passados quase dez anos, desde que cruzara pela última vez o enorme portão, David voltava a entrar naquela prisão onde passara uma boa parte dos seus últimos anos de vida, cumprimentou alguns velhos amigos que ainda por ali se mantinham como guardas prisionais, dos civis do seu tempo só restava um ou outro, a grande maioria já se reformara.

Sujeitou-se à minuciosa inspecção do detector de metais, já nem se recordava que bastava a simples fivela do cinto para que aquele fosse accionado, voltou atrás, retirou o cinto bem como o relógio, e voltou a passar pela máquina, nada, podia seguir o seu caminho. Cruzou o outro enorme portão e achou-se no pátio por onde passara tantas e tantas vezes, dirigiu-se para a porta que dava, agora, acesso ao local para onde pretendia ir, aguardava que o guarda a abrisse quando ouviu um grito vindo lá de longe:

- David! David!

Era nem mais nem menos que o seu grande amigo M.J., os dois homens abraçaram-se com profundidade:

- Epá, olhei para aqui e disse para mim. “ Aquele é o David”. Que é feito de ti? O que é que fazes aqui?

- Olha, tenho andado por aí, agora tocou-me voltar aqui, é assim a vida. E contigo, está tudo bem?

- Tudo em cima.A gente depois já fala melhor.

Despediram-se, David penetrou no corredor por tantos e tantos dias escrevera uma página da sua vida, olhou para a porta onde tivera o seu espaço durante quase dez anos, agora, passados outros dez, ali estava de novo, fechado entre quatro altos muros, num corredor onde todas as janelas e portas ostentam as suas grades de ferro como que sendo o Ex-ex-libris daquele local.

Estava David entregue aos seus pensamentos quando lhe pareceu ouvir uma voz familiar, saiu do seu estado de letargia e levantou o olhar, nem podia acreditar, era mesmo ele, era mesmo Chiquinho, o seu velho aluno com o qual encetara, nos tempos em partilharam conhecimentos, uma amizade que muitos poderiam pensar ser uma amizade de puro interesse circunstancial e que se diluiria com o tempo, mas o abraço que o velho professor e aluno trocaram, diziam precisamente o contrário. Recordaram alguns momentos do passado:

- Então, o que faz por aqui?

- Fui contratado para vir aqui dar umas aulas, aliás já tinha aceite há muito tempo, só já não me lembrava.

Ficaram mais algum tempo a recordar, nem pareciam um recluso e o seu ex-professor, mas sim dois velhos amigos que se reencontravam ao fim de quase dez anos.

Lição:

“A amizade não escolhe estratos sociais e muito menos se apaga com o tempo.”

Francis Raposo Ferreira

FrancisFerreira
Enviado por FrancisFerreira em 22/06/2011
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