UMA LIGAÇÃO, UMA HISTÓRIA

Era um dia como outro qualquer aqui no trabalho. Relatórios, emails... os leões que tenho de matar todos os dias, quando assumo minha função na empresa. Muito café, para me manter acordada, e coragem! Essa rotina, porém, ganha um caminho diferente, dando-me um motivo de dar “bom dia” a cada manhã: um telefonema. Que voz!

Não nos conhecíamos, mas o fato de trabalharmos na mesma empresa nos unia. Tínhamos apenas um problema: mesma empresa, filiais diferentes. O gosto da distância não tinha um sabor muito agradável. Esse sabor durou um ano e meio.

A cada manhã, “Bom dia, minha princesa!”; “Bom dia, minha linda!”... “Bom dia, ... meu amor!” Não tinha como, gradativamente, o dia não ficar mais lindo. Eram palavras de conhecimento, de carinho, de amor! Ele me conhecia mais que meus pais ou minhas irmãs. Ele me despia de preconceitos , sem dar um toque em mim. Ele sabia me fazer feliz!

Sim, ainda dava para trabalhar, e trabalhava feliz. Havia vezes que eu, na minha condição, tinha de conversar com ele de maneira rígida, exigindo alguns relatórios ou dando broncas. Meu coração ficava partido, mas trabalho é trabalho. Depois, enviava um e-mail de desculpas, cheio de carinhos.

Até hoje, meu coração acelera, meus poros se abrem e eu me perco, quando ouço sobre ele ou o escuto. Que voz!

Emails, ligações, fotos, Skypes, emoções. Nunca nos conhecemos pessoalmente, e isso me doía. Havia momentos que os hormônios falavam mais alto e uma frustração enorme me habitava, quando os lábios dele só existiam através de fotos que tenho no meu computador. Ele, sempre carinhoso, dizia para eu ter calma. Eu cedia. Não há como não se derreter com tamanho carinho e com aquela voz. Cartas, ligações, emails, muito amor.

Um tempo, porém, o tempo não nos permitia ir mais além. Ele, recém-separado, pai e estudante universitário; eu, apenas uma funcionária de uma empresa. As circunstâncias faziam a conexão “São Paulo – Recife” virar “Brasil – Japão”. Não tínhamos condições de nos vermos. Não naquele momento. Mas eu queria mais: sentir o cheiro dele, o abraço, o colo, os lábios...

Isso eu não tinha e não sabia quando teria. Isso me matava!

Chegou um dia que me rendi ao cansaço e resolvi pôr um fim em um relacionamento que existia em palavras. Sofri muito. Sofremos. Ele não me reconhecia. Eu não me reconhecia. Depois daquele dia, nenhum homem me fez sorrir como ele me fazia, nem ter aquele brilho nos olhos. Não me permitia, não me permito, ainda.

- Tem certeza?

- Tenho!

Esse verbo definiu tudo. Ele tentou, eu não. Eu chorava. Não o respondia. Queria que ele imaginasse que eu estava decidida, mas não estava; não estou; nunca estive...

Burra? Talvez. Vivo o amargo do arrependimento até hoje, mas só Deus e meu travesseiro sabem o quão foi difícil para mim. Não queria alimentar meu sofrimento. Parece coisa de Deus, mas, neste período, fui mudada de setor na empresa. Assim, nem profissionalmente conversava com ele.

Um dia, porém, meu telefone toca. Não reconhecia o número, mas o prefixo 011 era muito familiar. Mesmo assim, poderia ser tanta gente. Em milésimos de segundos, pensei nele, e era ele. Que tristeza! Meses após o nosso término, ele anuncia estar iniciando um novo relacionamento e queria que eu fosse a primeira a saber. Falou-me em consideração e em amizade. Fiquei muda. Minha reação se resumia a um coração acelerado e um enorme vazio. “Tudo bem” – eu disse. “Sejam felizes!”. Desliguei. Não quero ouvir a voz dele nunca mais. Senti um ódio, rasgando meu peito, de mim e das circunstâncias que nos fizeram chegar a este ponto.

Pensei que nunca mais iria ouvir a voz dele, nem saber da vida dele. Grande engano! Meses depois, uma falsa felicidade bateu minha porta. O telefone toca. Era ele. São Paulo veio a Recife.

- Sabia que um dia iria sentir o sabor de seus lábios! Estou em Recife, finalmente! Estou no hotel “tal”, número “tal”!

Ele, aqui, desejando-me, com o mesmo jeito carinhoso, mas em um relacionamento sério com outra. Eu, sentindo a mesma tremedeira, feliz, confusa, mulher.

De repente, ele ouviu o “tu-tu-tu-tu...” do telefone.

Não fui.

Nunca mais nos falamos.

Veridiana Rocha