O dia mais longo

Fosse mais longo, mas não foi. Poderia ter durado mais, mas não durou, e o vazio deixado para trás tomou o lugar da potência que havia naquele momento. As luzes estavam desligadas, e assim permaneceram durante o ato, como premissa das trevas que estavam por vir. Eu olhava a janela, e apenas deixava fluir a carga acumulada daqueles dias tão cheios, e ela me olhava, observando aqueles últimos momentos, já sabendo do desfecho daquela tarde...

Qual antecipação anunciada sua voz tomou meus pensamentos em um déjà vu sombrio. "Precisamos conversar", ela disse, esperando para que eu a olhasse uma vez mais... e tudo ficou mais escuro. Ficou tão escuro que eu apenas sentia aquele vazio a se engrandecer dentro de mim, a sair de minhas entranhas para nunca mais voltar... e uma dor agonizante tomou conta de mim, primeiro pela cabeça, e se espalhou pelo corpo. Pedi para deitar, fechar os olhos e tentar, desesperadamente abrir os olhos e descobrir que era apenas um pesadelo, mas não era.

Ainda não consigo conter as lágrimas que escorrem pelo meu rosto e vão morrer em meu peito, ao lado de um coração que tanto se doou para agora se fechar, calado em si. Meus batimentos são quase robóticos, apenas por impulso de uma bateria que insiste em dar energia ao todo imóvel.

Quis fugir, sair de lá, simplesmente passar por aquele portão, entrar em meu carro e esquecer que tudo aquilo havia acontecido um dia... já era tarde, não adiantava, não importava o quão rápido eu tentasse fugir, sentia a todo momento aquele vazio alcançar a mim, me tomar e fugir, como que para não ferir tanto, e logo voltar, em um ritual macabro de ferir e cicatrizar.

Estou estatelado no chão, de olhos fechados, escrevendo por impulso e chorando pelo coração. Hoje eu sinto como se um filho tivesse nascido, crescido sob minha tutela e, de repente, à aurora da independência, morrido de maneira súbita e sem explicação, sem testemunhas para dizer o que realmente acontecera.

Tudo o que resta são as lembranças mais tenras dos momentos mais gostosos... que não voltarão mais. Momentos daquela magia que enchia os olhos de felicidade e o coração de segurança por estar bem acompanhado. E eu andei de mãos dadas com a pessoa mais maravilhosa que já conheci, com quem passei os momentos dos quais me lembrarei com mais ternura quando o meu tempo estiver a se esgotar aqui em baixo. Por todas as vezes que fechar meus olhos me virá à vista aquele sorriso gostoso de quem estava feliz ao meu lado, aquelas palavras cuidadosas, de alguém que não dizia apenas coisas boas para quem lhe era importante, mas também coisas importantes para todas aquelas pessoas boas...

Meu coração está dilacerado, e meus olhos secos de tanto chorar. Há em minha alma um desejo profundo de que ela seja feliz pela vida, e ao mesmo tempo uma vontade imensurável de nunca mais fazer parte de sua vida novamente, de apenas observar de longe enquanto sua carreira for ganhando forma, enquanto sua vida for ficando melhor a cada dia.

Hoje foram ditas palavras que eu gostaria de não escutar jamais, foram sentidas coisas que a pura lembrança traz calafrios, foram tomadas decisões firmes e implacáveis, cujas consequências nem o tempo tem coragem de palpitar. Hoje eu gostaria de dormir para nunca mais acordar, meu desejo mais profundo é a morte mais rápida e silenciosa para calar essa tempestade que há dentro de mim. Meus pensamentos estão norteados, há palavras sendo ditas por mim que sequer passaram pelo crivo das minhas ideias - são palavras que simplesmente vêm e vão, para qualquer lugar, para nunca mais voltar.

E que as forças de nosso Universo consigam aplacar essa minha dor... porque hoje parte de mim virou cinzas e a outra parte morreu, como este meu amor.