Rosas e um amor obsessivo

Lisberto está ansioso para encontrar com a esposa e encomenda um buquê de rosas vermelhas colombianas para ela.

Adeilde está no cabeleireiro, retoca as mechas douradas de seu longo cabelo. Não é uma mulher elegante, apesar da roupa chamativa, blusa preta com detalhes dourados, uma calça de couro preta e sapatos dourados de salto alto. No burburinho do salão de um bairro simples, afastado do centro da cidade, ela dá muitas risadas e fala de suas expectativas para festa do “Suor e da Cerveja” em um bar da moda. Apesar de seus 50 anos, imagina-se com a energia de trinta anos atrás, para isso já retocou o rosto com botox e pratica uma arte marcial duas vezes por semana.

Lisberto, administrador e contador, trabalha o dia todo em um escritório, estão casado há 20 anos, e o amor por Adeilde cresce todos os dias. Ela é a razão de sua vida faz todas as suas vontades, inclusive crediários intermináveis para presenteá-la. Adeilde trabalha com vendas; é muito comunicativa, adora pagode, dançar e beber uma cerveja artesanal.

Os dois chegam em casa. Adeilde vai logo falando que à noite tem uma festa onde encontrará colegas da faculdade. Isso não agrada a Lisberto, que grita, faz chantagem, mas acaba concordando e deixa a esposa se divertir.

Adeilde coloca um microvestido vermelho intenso, nos pés uma sandália altíssima, e uma bolsa de “grife”, onde coloca o celular, dinheiro e maquiagem.

Lisberto abre uma garrafa de vinho, fica em casa olhando televisão. Resolve pegar a chave do carro e passa na festa para observar Adeilde. Observa ao longe o lugar: mesas na calçada, gente de todas as idades entrelaçam-se ao som do pagode. Observa a esposa rindo e se divertindo sem o menor constrangimento. Volta para casa. “Amor é Fogo que Arde sem se ver”, escreveu Camões.

No outro dia a faxineira abre a porta, encontra uma garrafa de vinho pela metade, uma bolsa Louis Vuitton (falsa), em um canto da sala, as janelas abertas e algumas rosas despedaças pelo chão. Há barulho de chuveiro e a porta do banheiro está aberta. Ao longe escuta a sirene de uma ambulância. Fica intrigada e, receosa, entra no banheiro. Não há ninguém, fecha a torneira do chuveiro. Abre vagarosamente a porta do quarto e encontra Adeilde dormindo. Vê-se comprimidos analgésicos pelo chão e uma jarra com as rosas colombianas na penteadeira. Ao lado da cama um bilhete: “Precisamos conversar e definir nossa separação, Lisberto”.

A faxineira limpa a casa, pega o dinheiro em cima da mesa de jantar, bate a porta devagar e deixa o avental para usar na próxima semana.

Lisberto, passou o dia inquieto. À beira de um ataque de nervos, liga para os amigos. Chora e conta o ocorrido na noite anterior, sapateia, tem crises de raiva e desmaia. Volta à noite e tira satisfação de Adeilde. Ela pede para ir embora. Lisberto bate a porta, pega o carro e acaba voltando do meio do caminho. Acostumaram-se a conviver ou viver e amar de uma forma exagerada.

Esta história ainda tem muitos diálogos e capítulos. A inspiração do texto ainda não pude definir se veio através de um desses rostos que encontramos nas ruas, nos shoppings, e que possuem uma maneira exagerada de ser, ou da frase de Lacan que diz que “Amar é dar o que não se tem a alguém que não o quer”.

Não houve separação entre Lisberto e Adeilde. Ambos chegaram a um comum acordo. Conversam e renovam as promessas de amor, e combinam de ir em maio ao baile de Outono. Ela intensifica os treinos na academia e ele participa de um grupo de apoio que propõe a cura do amor através das rosas colombianas, em uma igreja perto do centro da cidade. Apesar dos conflitos, um necessita do outro.

Iara Maria
Enviado por Iara Maria em 19/03/2018
Reeditado em 19/03/2018
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