As crônicas de um coração partido.

Ele a encarava com lágrimas no olhar. Ela, entretanto, continuava sentada na cadeira de balanço com suas mãos sobrepostas uma sobre a outra e o fixava com a frieza no olhar.

- Porque fez isso?

- Ela era um obstáculo.

- Eu a amava.

- Esse é o principal obstáculo.

- Você não entende. Eu jamais vou esquecê-la!

- Mas ela o irá. Logo, logo.

- Como pode dizer isso? Depois de tudo que eu e ela vivemos, como pode apostar nisso?

- Porque esse é o caminho de todos os amantes. O amor um dia acaba e se segue um novo percurso. Você não pode se negar a segui-lo meu neto.

- Mas vou. Não quero amar mais ninguém. Se você, meus pais ou o próprio universo me tira a possibilidade de ser feliz, eu me nego seguir o que planejam para mim.

Ela suspirou profundamente. Olhou para o horizonte. A brisa de uma manhã de início da Primavera acariciava seu rosto enrugado e cansado. Conhecia essa dor mais que seu neto. Porém, conhecia mais ainda a dor da teimosia e sabia como o tempo era cruel para aqueles que ficam parados nele.

- Olhe para você. - Retomou ela o diálogo após uma pequena pausa. - Um homem incrível com sonhos incríveis. Não o nego que ela também é. Mas seus caminhos são diferentes. Seus planos são incompatíveis. E, o que vejo, são dois amantes que sempre carregarão no peito a semente de um amor incomum que nasceu de um relacionamento incomum. Duas pessoas que jamais esquecerão no fundo de suas almas como tudo começou. Mas ela irá esquecê-lo. Você se tornará só uma pincelada em um enorme quadro que será pintado por outro homem. E, o quanto antes aceitar isso, mais rápido se tornará livre.

- Livre? LIVRE!? A senhora arrancou-me minha liberdade, meu desejo de continuar, meu maior sonho. Como pode dizer na maior frieza que estou livre se sou um prisioneiro de um amor que não existe mais?

- Um pássaro para voar, abandona o seu ninho. Ele perde o cuidado e carinho de sua protetora e alça voo. Impossivel ele carregar consigo seu lar, é preciso antes, abandoná-lo. Você é esse pássaro. O que te dói hoje, na verdade, te liberta. Liberta para voar, voar até o infinito. Voar onde nenhum outro pássaro foi. Ousar lugares que nenhum dos que estão a sua volta poderão ir. Mas, para chegar lá, você precisa deixar para trás o peso que te aprisiona hoje ao chão.

O encarava no fundo daqueles olhos negros e joviais. Sabia que não a entenderia agora. Já fora um dia uma bela jovem com o coração partido e se lembrava bem de como a juventude é carregada de fortes emoções. Suas palavras não seriam entendidas naquele momento, mas um dia, elas seriam. E, quando esse dia chegou, ele as entendeu.

Thiago Justo
Enviado por Thiago Justo em 21/03/2018
Reeditado em 21/03/2018
Código do texto: T6286505
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