Sem sorte no amor

Marcelo Tony não tinha sorte no amor. Bonito e inteligente, mas sem nenhuma paciência para joguinhos e laconismo. Para ele, existiam dois tipos de mulheres: as feias e as lindas. É claro que ele só se interessava pelas lindas! Mas as lindas estão acostumadas a serem cortejadas, agradadas, paparicadas e Marcelo Tony, por ser bonito, também gostava de ser paparicado, bajulado mesmo. Porém as mulheres que Marcelo escolhia não possuíam esta qualidade que ele tanto gostava: a atenciosidade. E por isso, seus namoros duravam muito pouco, às vezes nem uma semana.

Marcelo Tony era estatístico e estava acostumado com a rigidez e dureza dos números. Dois mais dois são igual a quatro em qualquer época e canto do planeta, mas o amor é regido pelas emoções e não pela razão. Por isso, dois mais dois no amor às vezes são cinco, seis ou sete dependendo da emoção do momento.

Quando Marcelo se apaixonava, já sabia que ia sofrer. Ele fugia dos relacionamentos sérios como o Diabo da cruz, porque não queria sofrer. Por não querer sofrer, Marcelo se autossabotava. Qualquer deslize que a mulher cometesse era um motivo para Marcelo lhe dar um pé na bunda. Sim. Era Marcelo que terminava os namoros e por isso sofria bastante, pois, na verdade, ele não queria terminar nada, ele queria apenas mais atenção, carinho. Mas mulheres lindas só querem receber carinho e não estão nem aí para carência de Marcelo. Um amigo do estatístico bem definiu este tipo de mulher: “Ao nosso reino tudo, ao vosso reino nada”. Estressado com o término de seu último namoro relâmpago (não durou nem uma semana), Marcelo resolveu buscar tratamento para sua falta de paciência e ansiedade com as mulheres. Um amigo, Alex Dantas, indicou-lhe a doutora Alessandra Neves, uma psiquiatra muito renomada e que, segundo Alex, resolveu seu problema de acrofobia (medo de altura) em pouco tempo.

Marcelo Tony marcou uma consulta para o dia seguinte, às 15 horas.

Marcelo chegou ao consultório da doutora Alessandra às 14h35 min. Entregou a carteirinha de seu convênio para a secretária de olhos azuis-claros e sorriso de fada, junto com a identidade e aguardou sua vez lendo uma revista Veja de 2017.

Após alguns torturantes minutos, Marcelo foi chamado pela doutora.

Marcelo Tony achava que a médica era uma baranga, um canhão, mas estava errado. A psiquiatra conseguia ser tão bonita quanto Sharon Stone quando interpretou uma assassina no ótimo filme Instinto Selvagem. Marcelo ficou sem ar diante da linda mulher. Após a psiquiatra convidá-lo a sentar-se na poltrona preta e aconchegante, à esquerda da porta de entrada, a sessão teve início.

A médica também não ficou indiferente à beleza do estatístico, mas como toda mulher e mais ainda por ser psiquiatra, dissimulou com maestria seus sentimentos.

― Então, Marcelo, o que o traz aqui?

― Eu não consigo permanecer muito tempo num namoro, doutora. Me canso facilmente de ter que bancar o homem atencioso enquanto a mulher me responde com monossílabos e não retribui meus carinhos e minha atenção. Não sei mais o que fazer doutora. Já cansei de sofrer com joguinhos. A senhora acha que meu caso tem solução? Por favor me ajude…

― Marcelo, pelo que você disse, vejo que você sofre de ansiedade e claustrofobia nos relacionamentos. Na verdade, você tem medo de perder sua liberdade ao se relacionar. Se sente preso e faz tudo para o relacionamento acabar para se libertar da prisão que ele representa para você e, por isso, você se autossabota sem nem perceber…

― É verdade, doutora! Eu faço isso mesmo. Meus amigos dizem que as mulheres não tão lindas são mais amáveis e cativantes, mas eu só me apaixono por mulheres lindas. Eu estou errado, doutora?

― Marcelo, seu problema não tem a ver com a aparência da mulher, mas sim com sua atitude diante de um relacionamento. Mesmo que você procurasse mulheres feias para namorar o efeito seria o mesmo, ou seja, o relacionamento acabaria em pouco tempo devido a sua fobia a relacionamentos amorosos. Você sofre de filofobia, Marcelo: medo de se apaixonar. Mas isto tem tratamento…

― Então me ajude doutora, porque não aguento mais…

Após dois anos de tratamento com a doutora Alessandra Neves, Marcelo Tony estava curado de sua fobia. Ele até se casou! Não. Não se casou com a doutora Alessandra como você deve ter pensado, nobre leitor. Ele se casou com a secretária da doutora Alessandra, Fátima Guedes. Mas não foi pela bela aparência da secretária que ele se apaixonou. Foi por sua voz. Uma voz tão linda e agradável de se ouvir que parecia sair da boca de um anjo celestial…

FIM

Luciano RF
Enviado por Luciano RF em 17/09/2018
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