ROUND FINAL

ROUND FINAL

Lá estava ele de pé, segurando nas mãos as cordas do ring.

Seu nome era aclamado pela multidão que o acompanhava há anos.

-Urso Branco...Urso Branco....Fica...Fica....

Em seu rosto uma máscara, envolvendo a cabeça, amarrada na nuca.

De camiseta colada no corpo, calça apertada de educação física,

Olhando silenciosamente para o povo, era uma figura atlética.

Embora seus olhos fitassem toda aquela gente, sua mente estava distante.

Completara quarenta anos. Era hora de parar com as lutas.

Tinha uma vida profissional alheia às lutas e para ela voltaria.

Lutava anônimo há vinte anos. Nem os mais íntimos imaginariam.

Durante toda a sua vida buscara algo, sem saber exatamente o que.

No ring, suas emoções e a adrenalina procuravam dar sentido à busca.

Fora tudo em vão. Saia do jeito que entrara. Sózinho em meio à multidão.

Por duas vezes fora chamado ao centro do Ring, mas não se dera conta.

E sua mente confusa bradava em silêncio:

-É você? Onde está? É uma pessoa? É uma mulher? Eu a encontrarei um dia? Você existe? Por que sou assim? O que busco?

O sino tocou, o Juiz deu uma sonora pancada em seu ombro e gritou:

-Lutadores ao centro. Luta de um assalto por três minutos.

Saindo de seu devaneio encarou seu oponente. Forte como um toro,

Camiseta de uma alça e calça apertada, rosnando como um selvagem, seu nome era Índio, gesticulava para Urso Branco, impaciente.

Urso Branco era conhecido por sua lealdade, facilidade de esquiva e contragolpes inesperados.

O tempo era curto, Índio queria acabar rápido e se atirou contra seu oponente diversas vezes, usando sua enorme força. Em todos os ataques foi rechaçado e jogado ao chão. Enquanto se recobrava, Urso Branco elegantemente aguardava, com a platéia em delírio.

Novamente seus pensamentos voaram longe, distante do Ring, tentando conectá-lo com o objeto de sua busca.

Ele não estava mais ali. Índio percebendo atacou ferozmente e com um tranco que derrubaria um boi, lançou seu adversário fora do Ring.

Urso Branco caiu pesadamente, sentiu todo o corpo doer e a custo se levantou conseguindo ainda ouvir seu treinador que dizia:

-Só faltam quarenta segundos. Sobe ao Ring ou desiste.

Como se fosse movido por uma mole, segurou as cordas, balançou o corpo e saltou para dentro do Ring. Índio sabia que com o último golpe que o arremessara fora, ganhava a luta e por isso resolveu esgotar o tempo se esquivando.

Urso Branco entendeu a tática, afastou-se para o outro lado, tomando distância e, numa corrida rápida e certeira, pulou com os dois pés no peito de Índio, jogando-o fora do Ring. A sineta tocou. Terminara a luta.

Enquanto os fãs em delírio aplaudiam, Urso Branco, sem esperar a proclamação do resultado, correu em direção ao seu vestuário, indiferente à festa da qual era protagonista.

Abriu o chuveiro e sentiu a água gelada bater em seu corpo quente.

Foi se encolhendo até se dobrar de joelhos e chorou convulsivamente.

- Tem que haver algo mais, balbuciava. Tem que haver alguém que dê sentido a tudo isso.

Finalmente se levantou, tirou a máscara e o uniforme, colocou uma calça jeans, tênis e camisa pólo, uma toca na cabeça, e buscou a saída dos fundos, misturando-se à multidão.

Trinta anos se passaram. Agora estava ali, diante dela, o coração batendo acelerado, a adrenalina lhe agitando o corpo e a alma, precisando tomar uma decisão.

Ela era a razão de seus sonhos. O ideal que se escondia dele por toda uma vida, mas que não o deixara desistir de sonhar.

Era o último assalto; a última luta;pegar ou largar.

E ouviu então a voz de seu velho treinador lhe dizer mais uma vez:

-Só faltam quarenta segundos. Sobe ao Ring ou desiste!

O velho lutador, agora sem máscara, tomou sua última decisão:

De um salto, pulou para o Ring da vida, e começou a viver.

Pedro Lodi
Enviado por Pedro Lodi em 22/09/2018
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