Tony & Beth

1950.

Tony vinha se preparando para aquele dia desde os seus 15 anos, quando começou a ouvir dos pais que deveria amar uma moça e fazer dela a mais feliz do mundo. Enquanto se preparava, escolhendo sua melhor roupa e passando seu melhor perfume, ele treinava na frente do espelho as palavras que seriam ditas. Ele pegou o carro do pai e foi para a confeitaria em que se encontraria com Beth. Seguindo os conselhos da mãe, ele apostou em algo simples, como fora com os pais.

Ele chegou bem antes de Beth para finalizar as coisas. Pagou a quantia que faltava para poder usar o local. A grande e farta dona do estabelecimento, Madame Peox, estava animadíssima, parecia que seria com ela. "Me sinto jovem outra vez!", disse, quase em pulinhos. Tony sorriu e se sentou na mesa escolhida. Todos os outros funcionários e clientes que encheram o lugar naquela tarde de domingo, esperavam ansiosos e esperançosos. Enfim, após tomar dois cafés bem fortes e bem doces, Tony percebeu o que as horas diziam: estava quase no momento de Beth chegar.

Um carro parou em frente à confeitaria e Tony viu o sogro no volante. Beth desceu e percebeu quase no mesmo instante que entendera o motivo do encontro de forma errada: todas as pessoas no local olhavam para ela, a maioria com sorrisos e expressões de ansiedade, mas nada entregava a situação quanto a expressão no rosto de Tony. Ela imaginara, antes de vir, enquanto colocava o primeiro vestido que vira na sua frente, que a conversa com Tony na noite anterior havia bastado.

Eles estavam no clube da cidade, usando suas roupas de banho, à beira da piscina, bebericando algum drinque alcoólico que o garçom oferecera. O silêncio dominava, com exceção do barulho que o canudo do drinque de Beth fazia, quando, ansiosa, drenava a bebida, e da agitação da água da piscina sendo remexida. Tony segurava a mão esquerda dela e tudo o que mais queria era largar aqueles dedos suados de nervoso dele.

- Eu estou realmente gostando de você, Beth... - Tony quebrou o gelo. - Sei que ainda não trocamos beijos nem nada, apenas toquei suas mãos como agora, mas sinto que o que temos é algo a mais, algo que pode e será duradouro.

- Talvez tenha razão, Tony, na parte de ser cedo... - Ela temia continuar, não queria magoá-lo. Seus dias juntos tiraram o tédio dela, mas as coisas ficaram corriqueiras outra vez.

- Bem, você tem algum medo em relação ao nosso relacionamento? - Tony tentava entendê-la, mas era demais para ele, para qualquer homem preso nas suas ideias quadradinhas.

- Não, só acho que devíamos esperar mais, dar tempo ao tempo...

- Eu não quero esperar mais... Nesses três meses que estamos juntos, sei que você é o que quero para o meu futuro.

- Ah, droga! Estou atrasada! Preciso ir, papai me impôs horário... - Beth se levantou, deixando o drinque sobre a mesinha entre eles e esquivando do assunto, mas, por fim, resolveu ser mais efetiva: - Eu acho que precisamos de tempo, precisamos pensar para decidir o que faremos daqui em diante... - Ela suspirou, escolhendo as palavras. - Quando finalmente estiver pronto para falar disso, me procure.

E ela saiu dali achando que estavam quites, que tudo estava resolvido, mas ele ligara no dia seguinte pela manhã, marcando o encontro na confeitaria. Ela estava certa que ele entendera o recado e por isso se negou a ir, mas tanto ele quanto sua mãe insistiram tanto, que ela acabou cedendo. Agora, ali estavam eles, ele pronto para praticamente a forçá-la a fazer a escolha dele, não a dela. O que faria?

Ele abriu um sorrisão quando a viu, mas percebeu que havia algo errado. Seria a história de tempo de novo? Seu pai dissera, quando recorreu a ele atrás de conselhos, que isso era coisa de mulher, de querer se sentir valorizada, desejada. A melhor solução lhe pareceu fazer aquela surpresa, mas a expressão de Beth dizia que as coisas estavam saindo fora de controle e não havia nada que o deixasse mais ansioso do que quando as coisas começavam a sair fora de controle. Sentiu sua respiração se acentuar e o suor a brotar por todo o corpo, escorrendo dos cabelos, pela nuca e pelas costas, até a cadeira. Seu sorriso esmoreceu como uma chama de vela ante o vento impiedoso.

- Olá... - Beth disse sem muito entusiasmo, quando Tony se levantou, beijou sua mão e puxou a cadeira.

- Olá, meu amor - ele respondeu, tentando transparecer otimismo enquanto limpava com um guardanapo o suor da testa.

Tony se sentou, ainda com o sorriso besta e amarelo na cara, e pediu mais um café. Para Beth, pediu chá com leite, como ela sempre pedia. Escolheu um pedaço de bolo de chocolate e, mesmo com Beth negando, ele pediu a fatia da torta de limão da Madame Peox que ela adorava.

- Tony, eu achei que tivesse sido clara com a conversa de ontem... - Beth parecia muito chateada, mas mesmo assim tomou o chá. - O que percebo aqui é algo bem diferente.

Eu sei, Beth, mas eu me aconselhei com pessoas mais experientes e foi isso que me disseram... - Ele estava consternado e, para piorar o constrangimento, o garçom chegou com o bolo e a torta. Pôs na mesa e saiu, com uma expressão de lamentação. As pessoas ao redor, vendo o clima tenso, fingiram se concentrar em outra coisa e seus sorrisos bobos de felicidade desapareceram. - Eu só sei que te amo... Eu... Eu... Vamos comer? - O suor agora era tão intenso que deixava marcas agoniantes por toda a camisa social de Tony.

Beth não respondeu, mas seus gestos bruscos demonstravam insatisfação. Demorou duas bocadas para acontecer. Beth achou a aliança no meio do recheio estilo crème brûlée. Ela ficou encarando o objeto por longos e inquietantes minutos, até Tony juntar coragem suficiente para falar.

- Como disse, Ana Elizabeth de Souza Serafim, eu te... te... te amo e desejo me casar com você... - Uma pausa para respirar fundo e enxugar o suor da testa outra vez. - Já falei com seu pai, que me disse que sua vontade é lei... Então, aqui estamos... - Ele pegou a aliança do prato dela, limpou com o guardanapo de suor e se ajoelhou no chão. Ninguém conseguiu evitar olhar e, agora, eles eram os atores no centro do palco. - Sem mais delongas... Elizabeth, você aceita se casar comigo?

Beth não estendeu a mão, pelo contrário: a retraiu e fechou os punhos de raiva. Os segundos se passaram arrastados, pesavam como culpa. Antes de falar qualquer coisa, ela parou de o encarar de cima, como se olhasse um inseto, e virou o rosto, se lamentando. Depois, voltou a olhá-lo, cheio de expectativa e ansiedade, e deu sua resposta:

- Você quer que seja aqui mesmo, Antônio? - Ela apontou os olhares curiosos. Madame Peox deixara até derramar chá numa mesa próxima enquanto servia, tamanho interesse no acontecimento. - Na frente de todos?

- Eu quero que o mundo presencie nosso amor, minha querida!

- Que amor, Tony? - Ela estava exasperada. - Deixei claro que nunca tive certeza de nada! Mas, agora, tenho minha decisão! - Tony se levantou, a aliança recolhida e guardada no bolso.

- Tudo bem... Quer dar uma volta na praça? - Beth riu alto.

- Não, não quero, Tony. Está com vergonha agora, depois de fazer seu show? - Ela girou, indicando as pessoas, que evitavam agora olhar - Você queria me constranger para aceitar e me submeter a você, como sempre fiz... Mas eu cansei... Você até me tirou o tédio no começo, mas não dá mais... Eu vou cuidar de mim, da minha vida... Vou estudar na capital, fazer carreira. Tudo o que você e essa cidade sempre quiseram me negar... Mas consegui convencer meu pai.

Ele tentou se aproximar dela, para remediar, mas ela se desvencilhou.

- Eu te amo, Beth, você pode fazer o que quiser, mesmo se tornando minha mulher...

- Não sou sua mulher nem de ninguém! - Ela saiu do estabelecimento, com Tony em seu encalço, mas mesmo assim alguns curiosos foram até a porta dar uma espiada de perto no acontecimento do dia, quiçá da semana.

Tony não sabia o que dizer nem fazer. Estava desnorteado.

- Eu... Eu... Eu... Eu te... te amo - balbuciou por fim.

- Não, Tony, isso nunca foi amor, foi apenas conveniência. - Ela começou a caminhar a passos largos, deixando-o estarrecido na frente da confeitaria. - Te desejo toda a sorte do mundo! - finalizou Beth, enquanto caminhava rumo ao seu destino.

Com a cena terminada, as pessoas voltaram para suas mesas. Madame Peox veio até Tony e lhe deu duas palmadinhas no ombro, devolvendo o dinheiro de agradecimento. Sua expressão era de pena. Tony foi embora para o caminho oposto, onde ficava sua casa, sem saber o que dizer nem fazer.

Tiaggio
Enviado por Tiaggio em 10/02/2019
Reeditado em 10/02/2019
Código do texto: T6571919
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