Capítulo 6 - 60 minutos morto

TRECHO.

Local: Brasília, Hospital São Martinho, Box de emergência, mesmo dia, 13h

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Veronika ligava mais uma vez para a central de regulação de leito de UTI:

- Eu sei. A nefrologia liberou. Tá bom. Eu preciso de vaga! Estamos superlotados aqui! Tá bom, espero você ligar. Mas se você não ligar, eu te ligo de novo! Tá certo. Bom plantão também!

Desligou o telefone e suspirou. Dia difícil. Dez pacientes graves, e nenhuma previsão de vaga.

As portas do box se abriram com violência, pela quinta vez naquele dia!

- Doutora, o paciente convulsionou! – A enfermeira da triagem falou esbaforida.

Veronika fitou um homem relativamente jovem, largado, como desacordado sobre uma cadeira de rodas. Não havia espaço. Na maca de estabilização já tinha um paciente entubado que não podia ser removido. Mas bem, convulsão seria mais simples de resolver. Se fosse só convulsão.

Abigail e Cátia se aproximavam.

- O que aconteceu? – Veronika puxou a folha com o traçado do eletrocardiograma da mão da enfermeira.

- Ele chegou com dor no peito. Não tem médico para atender...

- Pára tudo! – Veronika se aproximou rapidamente, e procurou pelo pulso. – Droga! Não foi convulsão, ele tá parado! Traz uma maca agora!!

Uma maca já estava a caminho no meio da correria. O paciente foi transportado da cadeira de rodas para a maca com a ajuda dos guardas, porque apesar de magro, ele era alto e forte.

E mais uma vez, era preciso dividir a monitorização.

Veronika estava com raiva dela mesmo por ter demorado para procurar o pulso.

Abigail fazia massagem cardíaca, Maria do Carmo preparava o material para entubar. Jenny e Fernanda procuravam por um acesso nos braços do paciente. Cátia pegava o ambu.

Veronika foi até o monitor, pegou as pás e o colocou sobre o peito do paciente, empurrando Abigail.

Ela já esperava por aquilo, a linha convulsionava loucamente.

- Tá fibrilando! – Cátia gritou.

- Volta a massagem! – Veronika ordenou enquanto carregava a carga elétrica para chocar o paciente.

- O acesso tá pego! Faz a adrenalina?

- Afasta! – Veronika gritou. Estava com muita raiva. Raiva da bagunça. Da enrolação para trazer o paciente, do ambiente apertado. E principalmente, por ter perdido aquele pouco tempo sem checar o pulso. – Vou chocar! Se afastem. – Posicionada sobre o paciente, afastando o máximo possível o corpo da maca, ao mesmo tempo em que fazia uma pressão sobre as pás, para atingir um peso de aproximadamente 5kg sobre o tórax do paciente, apertou os botões para disparar o choque.

O corpo do paciente pulou na maca.

- Volta a massagem! – Ordenou. Não adiantava chorar o leite derramado. Agora precisava organizar tudo. – Cátia ambuza. Maria conta o tempo. Jenny cuida da medicação.

Cátia apertava o ambu sobre o rosto do paciente:

- Tá suprado? – perguntou para Veronika que ainda segurava o papel do eletro.

- Não. Está normal. Mas 50% dos eletros dos pacientes infartados dão normais no primeiro momento.

- Que estranho, a enfermeira disse que ele convulsionou.

“Que ódio!” Veronika pensou, e continuou em silencio.

- Dois minutos! – Maria do Carmo sentenciou. - O material para entubar está pronto.

- Vamos checar!

O paciente já estava monitorizado. A linha continuava num sobe e desce desorganizado, como ondas sonoras doidas. Sem pulso.

- Vamos chocar! Volta a massagem.

Fernanda assumiu o lugar de Abigail. Veronika puxou as pás molhadas com gel mais uma vez, carregou o aparelho, carga máxima e os posicionou sobre o tórax desnudo.

- Afasta! Vou chocar! Afasta! – Verificou se todos estavam afastados e chocou. O corpo pulou. O cheiro comum de pele queimada apareceu. – Volta a massagem. Amiodarona 300mg!

- Duas ampolas? – Jenny perguntou.

- Sim. Duas ampolas sem diluir! Direto!

- Ok.

Fernanda massageava o paciente com muito esforço para manter a frequência.

- Deu os 3 minutos da adrenalina.

- Pode fazer! – Veronika autorizou. Reviu tudo. Precisava entubar. Mas estava esperançosa, ele ia voltar, o pegaram no momento certo!

- Dois minutos!

- Checa o pulso. – Veronika olhava atenta para a linha. Continuava fibrilando. – Droga. Continua a massagem! Vamos chocar.

Dessa vez entregou as pás para Abigail. E a viu ansiosa, posicionada com pouca força, apertou os botões com medo.

- Volta a massagem! – Veronika se aproximou de Cátia. – Deixa que eu entubo esse. – Não havia tempo nem riscos para se correr.

Em meio a massagem abriu a boca do paciente, posicionada a cabeça, mas o sobe e desce do tórax prejudicava a visualização.

- Droga!

- Quer que eu pare? – Jenny massageava.

- Ainda não. Vamos ambuzar mais um pouco. Esse vai ser difícil. Pode fazer mais uma amiodarona 150mg!

Mais uma tentativa de entubar:

- Pára a massagem! – O tubo desceu para o lugar errado. – Droga. Volta a massagem. Pára! – O tubo entrou. – Volta a massagem!

Veronika checou o posicionamento do tubo com o estetoscópio:

- Tudo certo!

- 2 minutos! – Maria falou.

- Vamos checar! – Nada de pulso. – Continua fibrilando! Vamos chocar mais uma vez. Volta a massagem!

Veronika mais uma vez preparou as pás, colocou sobre o tórax. Tinha que ser agora. Estava tudo certo. Ele tinha que voltar. Chocou.

- Volta a massagem!

- Pode fazer a adrenalina?

- Faz!

Veronika assumiu o lugar da massagem. O paciente já estava entubado. Chegou com dor no peito. Parou em FV, só podia ser causa cardíaca. Estava tudo certo. Chocou, adrenalina, amiodarona, foi entubado. Ele tinha que voltar! Tinha que voltar! Ainda faltava trinta segundos da massagem, e ela já estava cansada. Sentia o folego apertar.

- 2 minutos!

Olhos fixos no monitor e a mão procurando o pulso:

- Droga! Fibrilando!

Mais um choque.

- Volta a massagem!

Veronika continuava confiante.

- Adrenalina!

- Ok.

- 2 minutos.

- Voltou! – Veronika sentiu o pulso forte na femoral! – Isso aí gente! Olhou para o monitor. Agora parecia um traçado reconhecível, apesar de ainda largo. Apesar de continuar enlarguecendo. – Não, não, não! – O traçado abriu, voltou a fibrilar.

Rapidamente Veronika pegou as pás. Mais um choque.

- Volta a massagem!

- A gente vai precisar de ajuda aqui! – Maria do Carmo foi até a porta e pediu a ajuda da primeira pessoa que viu. Um bombeiro que passava. – Precisamos de gente para ajudar na massagem.

- Claro!

- Adrenalina?

- Faz!

Rogéria e Leandro, entraram na sala, eram os técnicos que voltavam do almoço, para alivio dos presentes mais ajuda com a massagem cardíaca.

- 2 minutos.

- Gente, não é possível! – Continuava fibrilando! – Veronika estava impressionada.

Mais um choque.

- Volta a massagem!

- Adrenalina!

- 2 minutos.

- Voltou!

Pulso forte. Ritmo regular.

- Parece que tá suprado! Com certeza infartou! – Veronika falou. – Vamos deixar amiodarona em bomba! Puxa a PA! Já prepara a nora!

Veronika examinou as pupilas do paciente, normais e reativas. Sorriu. Ele mexeu os braços.

- Ótimo! Ele tá se mexendo!

- Tô montando a amiodarona. – Fernanda avisou.

- Vamos pedir os exames. – Veronika olhava atentamente para o monitor. Seu coração fez uma pausa. Uma extra sístole ventricular. Não era nada. Duas extras sístoles ventriculares. – Não! Ele vai fazer TV! – Ainda tem pulso! - E o traçado ficou acelerado, e largo. – Droga! Fez TV! Vamos chocar!

Veronika se certificou da posição, confirmou que as pás estavam certas, quantidade certa de gel, o sincronizador não estava ligado, se posicionou de forma certa, checou a carga, tudo estava certo. Apertou os botões, o choque atravessou o corpo. Que contraiu e pulou na maca! Ela olhava ansiosa esperando o traçado mudar. Fibrilando! Checou o pulso. Nada.

- Não é possível! – Se certificou mais uma vez. – Sem pulso! Fibrilando! Volta a massagem!

Leandro assumiu a massagem. E Cátia continuava no ambu.

Dois minutos depois.

- Continua fibrilando!

Novo choque.

- Adrenalina.

- Volta a massagem!

- Dois minutos!

Sem pulso.

- Não tô acreditando no que eu tô vendo! Continua fibrilando!

Mais choque.

- Dois minutos!

- Checa!

- Fibrilando!

- Choca!

- Adrenalina!

- Volta a massagem!

- Dois minutos!

- Meu Deus!! Esses dois minutos são os mais longos da minha vida! – Rogéria falou cansada. Sentindo tontura pelo esforço.

- Vamos chocar! Volta a massagem!

A enfermeira da triagem voltou:

- Ainda tá parado?

- O que aconteceu? – Veronika perguntou.

- Ele chegou com dor no peito. É hipertenso. Só tem 42 anos, a gente triou, mas não tinha médico. Quase falei pra ele que não ia ter atendimento, mas a gente preferiu fazer um eletro.

- E ele parou no eletro?

- Foi. Ele ficou esquisito. Parecia que tinha convulsionado.

- 42 anos? – Veronika já imaginou a pior cena. Avisar aquela família que trouxe um pai, um irmão, um marido de apenas 42 anos andando e falando, que ele tinha morrido. De supetão. Odiava aquela parte.

- Dois minutos!

- Adrenalina!

- Volta a massagem!

- Dois minutos!

- Continua fibrilando!

- Vamos chocar!

Veronika repassou tudo mais uma vez! Algo não batia. Percebeu que ele mexia as mãos.

- Vamos checar o pulso! – Nada. Não tinha pulso! Não tinha. E o traçado desorganizado convulsionava enlouquecido, irônico. Checou os eletrodos, estava tudo posicionado e certo. – Continuem com a massagem! Vou falar com a família!

Olhou para o relógio, já tinha se passado meia hora. As chances dele sobreviver eram mínimas, e dele sobreviver sem sequelas eram menores ainda.

Foi de encontra a família angustiada. Mas era melhor prepara-los:

- Oi. Eu sou a doutora Veronika. – Disse para uma mulher jovem, que estava desesperada.

- Não, não, não! – Ela gritava em resposta a expressão séria de Veronika.

- Senhora, preciso que fique calma. Preciso de informações. O que a senhora é...

- Sou a esposa!

- Certo. O que aconteceu?

- Ele tava com dor no peito. Desde ontem! O que aconteceu com ele? Ele teve um AVC?

- Não. Ele teve uma parada cardíaca. Acredito que ele tenha tido um infarto.

- Ele convulsionou! Ele é muito novo pra enfartar. O pai dele morreu de AVC!

- Olha, ele tem algum problema de saúde?

- Tem pressão alta.

- Fuma?

- Não! Ele é saudável! O que acontecendo com ele? Como ele tá? Posso ver ele?

- Como eu disse, ele teve uma parada cardíaca. Nós estamos tentando reanima-lo, mas o coração dele não está se sustentando sozinho. Já faz mais de 30 minutos que ele está parado. Vocês precisam se preparar pra tudo agora.

- Não! Não!!

Não havia tempo.

Veronika se afastou dela e voltou para a sala, estava ainda mais convicta que deveria ter sido um infarto. Ao entrar na sala viu Cátia com as pás do desfibrilador preparada para chocar.

- Vamos lá! Pode chocar! – Gostava de ver como aos poucos as residentes iam criando autonomia.

Choque entregue.

- Volta a massagem! Por causa do tempo avançado de parada vamos fazer 50ml de bicarbonato.

- Adrenalina? – Jenny perguntou.

- Pode fazer.

“Porque fibrila tanto? Será que é alguma arritmia que eu estou perdendo?” Veronika olhou mais uma vez para o ECG. Não parecia que tinha o QT longo, mas também não estava com cabeça para fazer contas com raiz quadrada. O laudo era: “ECG com alterações mínimas da normalidade”. Olhou para o monitor.

- Pode ser torsades des points! Vamos fazer sulfato de magnésio!

- Quanto?

- 4 ml!

- Dois minutos!

Veronika se aproximou e sentiu o pulso forte mais uma vez.

- Voltou!

- Ainda tô preparando o magnésio.

- Ok. Deixa preparado.

O traçado estava lá, organizado. Pupilas fechadas. Reativas.

- PA?

- Peraí. – Fernando apertou o botão. – 80 por 50.

- Vamos começar a nora! A amiodarona tá correndo?

- Tá!

- Ok. Hora perfeita para outro eletro!

- Vou pegar o aparelho! – Cátia foi empolgada puxar o aparelho que estava no outro canto da sala.

- Agora vai! – Veronika analisava os segundos. Um minuto após, e o pulso continuava firme. E ele levantou a mão em direção ao tubo. Ele tem consciência!

Cátia estava encaixando os eletrodos periféricos para iniciar o traçado.

- Espera! Ele tá em TV de novo! – Veronika estava inconformada. - Choque!

- Sem pulso!

- Volta a massagem cardíaca!

- Doutora? Tem mais de 30 minutos já. – Fernanda falou se preparando para ambuzar o paciente, o desconectando do respirador.

Veronika percebeu que todos estavam cansados e descrentes. “Ele só ficou um minuto no respirador. Será que é o tubo?” Checou mais uma vez a entubação. Cuff. Posicionamento. Saturação. Tudo batia. Ele estava entubado corretamente.

- Dois minutos.

- Tá fibrilando! Faz o sulfato de magnésio agora.

- Quanto mesmo?

- 4 ml! E vamos chocar!

Estava lutando contra o improvável mais uma vez, e o melhor era se preparar para o mais provável. Sabia que naquela altura, depois de todo aquele tempo, depois de toda aquela medicação, o mais provável seria enfrentar os olhares esperançosos daquela família, para lhes informar que seu ente querido havia morrido aos 42 anos apenas. O coração estava apertado.

O braço dele mexia.

Não tinha como parar!

- Dois minutos!

- Tem pulso!

- Continua em TV! Que caralho! – Veronika sentia a adrenalina a mil fervendo seu sangue. - Vamos chocar!

- Pode fazer a adrenalina?

Veronika verificou o pulso. Estava lá!

- Não! Vamos chocar! Faz mais 4 ml de magnésio.

Mais um choque. Aquilo era inacreditável. “Será que a carga elétrica do aparelho não está funcionando?” Mas era visível, o choque estava sendo conduzido.

- Sem pulso! Volta a massagem!

- Nossa, muito tempo já. – Rogéria comentou.

“Não dá pra parar. Ele está se mexendo. O que eu não estou tratando?” – Veronika refazia todos os seus passos, todas as medicações, todas as possibilidades.

- Dois minutos!

Sem pulso. Fibrilando. Novo choque. Retorno da massagem cardíaca.

“Ele infartou. Claro que infartou.” Não conseguiu conversar melhor com a familiar por causa do estresse. “Mas hipertenso, dor no peito há um dia, parou em FV, mas primeiro eletro normal! Que droga! Nem pra ter um supra! Mas quando volta no monitor, parece suprado. Mas e se eu estiver errada?” Pensava e repensava.

- Dois minutos!

- Sem pulso! Volta massagem. E faz adrenalina.

Veronika ligou para Julia. Precisava de um suporte. Precisava argumentar seu raciocínio.

- Julia, me ajuda! Tô com um paciente aqui, 42 anos, previamente hipertenso, sem outras comorbidades, com dor no peito há um dia. Na hora que tava fazendo o eletro ele parou. Já tem 45 minutos! Não para de fibrilar! Já fiz tudo. Já fiz. Já fiz! Claro que fiz! Não. Ele voltou umas três vezes, mas não sustenta. Já fiz o magnésio. Fiz bicarbonato também. Eu sei. É o que tô pensando. Cara, eu queria levar para hemodinâmica, mas você conhece o nível. Pois é. Tá bom. Vou trombolizar. Eu sei. Hunhun. Obrigada.

- Dois minutos! Gente, é muito academia que me falta. – Maria do carmo concluiu cansada.

- Sem pulso. Continua fibrilando! – Veronika olhava incrédula para o monitor. - Vamos chocar! E vamos trombolizar!

- Trombolizar? – Maria do Carmo estranhou. Estavam habituados a sempre confiarem nas condutas de Veronika, ela era uma dos poucos médicos que conseguia manter a ordem durante aqueles momentos, raciocinava com aparente tranquilidade e nunca esquecia medicações, além de sempre seguir os protocolos mais atualizados. E principalmente, ela não bancava a heroína desesperada, sempre sabia o momento certo de parar. Será que ela tinha perdido o tato?

- Depois de todo esse tempo? – Cátia perguntou sem querer.

- Adrenalina? – Jenny perguntou, bem atenta ao tempo.

- Pode fazer. – Veronika tinha um pressentimento.

Cátia chocou mais uma vez, agora já se sentia segura, fazendo da forma correta.

- Bom, gente, tem muito tempo já. – Veronika tinha um pressentimento bom e queria dividir com a equipe. – Mas ele continua fibrilando. A pupila tá fechada. Eu acho que ele infartou. Não conseguimos fazer outro eletro. Mas se não abrir a artéria, não vai segurar. Tem que trombolizar. Eu não posso parar agora. E se eu NÃO fizer, ele VAI morrer, porque não tá sustentando. Mas se fizer, pode ser que ele tenha uma chance.

- Não dá pra ir pra angio né? Com ele parado. – Cátia comentou baixinho com medo de parecer ignorante.

- Sim! – Veronika se impressionou. – Seria muito bom se levássemos assim mesmo, massageando para a sala. Mas, eu conheço o meu povo. A Julia está tentando. Mas vão colocar tanto problema, que vou arriscar, para ganharmos tempo. – E Veronika concluiu sua decisão pensando que uma coisa ela já tinha certa, a família sabia que ele estava praticamente morto. Ia arriscar. – Traz o tenecteplase!

- Dois minutos!

Sem pulso. Continuava fibrilando. Adrenalina sendo feita. Tudo sendo feito. Revisou mais uma vez sua decisão. Chocou o paciente.

Era sua última chance.

- Tá aqui o trombolizador. – Brincou Jenny.

- Pode preparar. Vamos ver mais esse ciclo.

E Veronika observava o bombeiro, que finalmente percebeu que destoava da equipe. Estava acabando o ciclo. Todos cansados e descrentes. Mas ela tinha esperança, que não conseguia explicar direito.

- Dois minutos!

Parecia um traçado normal, ele queria viver! Um pulso. E só. Voltou a fibrilar.

- Faz o tenectplase! Vamos chocar! Volta a massagem!

Mais um choque. Feito a medicação, um remédio potente que servia para “dissolver” o trombo (um coágulo de sangue) que deveria estar entupindo a artéria do coração. E que poderia ter efeitos colaterais gravíssimos, como hemorragia cerebral.

- Dois minutos!

- Sem pulso. – Veronika não desanimava. Checava pupilas, fechadas, e ele mexia os braços. Ele queria viver. – Mais um ciclo!

- Doutora, já tem uma hora! – Maria do Carmo comentou.

- Eu sei. É a última coisa. Tem que dar certo!

Veronika observava atenta. Reconhecia o cansaço de todos. Abigail, magra, com muito esforço, fazia a massagem cardíaca de qualidade. E começando a se cansar sentiu algo diferente:

- Acho que eu senti o coração dele pular! – Gritou.

- Continua o ciclo! – Veronika sorriu.

- Dois minutos.

- Tem pulso! – Veronika sabia que ia manter, enquanto os outros cansados de ouvir aquilo, duvidavam. - Vai manter! Você tem que manter seu João! Viva! – Dizia para o corpo desacordado do paciente. E continuou baixinho. – Não posso fazer mais nada se o senhor não me ajudar agora.

Jenny e Maria se entreolharam, tinham certeza que ele não aguentar e sentiram pena de Veronika.

Dois minutos depois, e ainda mantinha:

- Vamos lá, PA de novo. Exames. E vamos rodar o novo eletro.

Cinco minutos depois, e ainda mantinha. Veronika checou pela quinta vez o reflexo pupilar. Estava normal, reativo. E sentia o pulso forte. FORTE! Pensou, maravilhada por aquele sentido de vida.

- Tá bom. Pode desconectar o monitor e ligar os cabos do eletro. – Disse para Cátia.

- Com certeza está suprado. – Veronika comentou.

- Doutora?

- Oi. – Veronika respondeu ansiosa.

- Ele tá mexendo o braço. Muito! – Cátia disse ansiosa.

Veronika se maravilhava, ele não ia ter sequela, pensou.

- E agora? Temos que sedar. Minha vontade era acordar ele, de vez. Mas ele ainda tem que angioplastar. Tem etomidato? Pra fazer um bolus.

- Vou buscar.

- Ok. E pode montar midazolan e fentanil para a manutenção. Quanto tá a PA?

- 70 por 45.

- Põe a nora a 20! Tem que subir essa PA antes de entrar a sedação.

- Tá aqui o etomidato.

- Faz 3 ml. Não! Faz 2 ml. – Veronika se aproximou dele, enquanto Cátia segurava sua mão pra ele não arrancar o tubo. – Seu João. O senhor vai dormir por um tempo, mas não se preocupe, estamos cuidando do senhor. O senhor é um guerreiro.

Veronika checou o pulso. Estava lá, forte.

Dois minutos depois o eletro era feito.

- Nossa. Parece bloqueio de ramo direito novo, ou corrente de lesão extensa. Preciso de um cardiologista. Volta a monitorização.

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TRECHO DA SÉRIE: VERONIKA MARAN, BORN TO BE WILD

VOL 1 APRESENTANDO DRA MARAN, PARTE II

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