O acordo

Andries van der Bijl fez um desenho na areia da praia, cheio de riscos e traços, com um graveto. Meia dúzia de índios o observavam, divertidos.

- Isto aqui, - explicou ele - é a colônia de Nova Amsterdã. Onde os brancos vivem...

- Eu disse que era um mapa - comentou Toosh-ki-pa-kwis-i, do clã da Tartaruga, em idioma lenape. Dos seis presentes, apenas ele falava holandês fluentemente. Seus companheiros assentiram, gravemente.

- Nós, colonos, gostaríamos de assegurar o direito de explorar as terras onde a colônia foi estabelecida... nesta ilha de Manhattan.

- Você quer dizer... o direito de residir e comerciar peles com as tribos lenape? - Indagou Toosh-ki-pa-kwis-i.

Van der Bijl tentou explicar o conceito exótico de "venda" para o nativo.

- Nós lhe pagamos um certo valor em bens... e você, em nome da sua tribo, nos concede o direito de uso deste pedaço do território.

- O que esse branco quer, afinal? - Perguntou Le-le-wa'-you, um guerreiro de expressão fechada do clã do Peru.

- É difícil de entender, mesmo para mim, que já convivo com eles há vários invernos - disse Toosh-ki-pa-kwis-i. - Eu acho que ele quer nos dar alguma coisa em troca dos direitos de exploração da terra onde está a colônia dos brancos. Direitos de caça, de plantação...

- Isso não é difícil de entender - atalhou Le-le-wa'-you.

- Isso se eu estou conseguindo realmente traduzir o que ele deseja - admitiu Toosh-ki-pa-kwis-i.

- Mas o que ele nos daria em troca dos tais direitos de uso? - Inquiriu Pä-sakun'a'-mon, do clã do Lobo.

Toosh-ki-pa-kwis-i repetiu a pergunta em holandês para o branco. O rosto dele se iluminou:

- Só coisa boa! O equivalente a 60 guinéus em suprimentos... dez caixas de roupas... dez rolos de tecidos... 30 onças de pólvora... dez mosquetes... balas... cinquenta machados... vinte facas...

Toosh-ki-pa-kwis-i foi traduzindo item por item para seus companheiros, e eles pareciam ficar progressivamente mais animados.

- O que acham? - Inquiriu Toosh-ki-pa-kwis-i.

Os demais índios confabularam rapidamente. Finalmente, Le-le-wa'-you definiu a situação:

- Temos um acordo.

* * *

Da praia, os seis índios acompanharam com olhar atento o bote de Andries van der Bijl, que o levava de volta ao veleiro ancorado na foz do rio.

- Tem certeza de que ele não vai dar pra trás? - Perguntou Le-le-wa'-you.

- Esses brancos de Manhattan costumam cumprir com a palavra dada... não tive aborrecimentos com eles até hoje - ponderou Toosh-ki-pa-kwis-i. - O combinado é que nos entregue a lista de materiais aqui, amanhã de manhã, certo?

- Bem... sim, o risco que corremos é bem pequeno - admitiu Le-le-wa'-you. - Afinal, nós só estamos aqui de passagem. No fim da temporada de caça, voltamos para nossas aldeias no continente...

Toosh-ki-pa-kwis-i deu de ombros.

- Não temos culpa se os outros lenapes, que vivem em Manhattan, não quiseram participar do acordo.

E apagando o mapa desenhado na areia com o pé:

- Parece que agora, terão que se acostumar a conviver definitivamente com os brancos...

- [12-09-2017]