Felizes dezesseis

Com sua afabilidade habitual, o rabino Efrat Lieberman procurou a diretora da Escola Judaica para Meninas, em Alexandria, Egito, e lhe perguntou se poderia ajudá-lo a resolver um problema.

- Naturalmente. Se estiver ao meu alcance, rabino - respondeu Madame Gadi, cautelosamente.

- Alguns líderes da comunidade judaica, - principiou a explanar o rabino - são de opinião de que a nossa crença, embora tradicional, possui um importante papel a desempenhar no mundo moderno. E, dentro deste contexto, seria importante destacar o papel das meninas dentro da comunidade. Estou falando, especificamente, de uma cerimônia de apresentação pública...

Os olhos de Yonat Gadi brilharam.

- Pretende fazer um bat-mitzvá, rabino?

Efrat Lieberman balançou afirmativamente a cabeça.

- É disso que se trata. Quando me falou que em Paris já faziam esta cerimônia...

- Desde o fim do século passado, pelo menos - interrompeu-o empolgada Madame Gadi.

- Bem... sabe a minha opinião sobre esses modismos europeus... - ponderou o rabino - somos judeus ortodoxos e súditos do Império Otomano. Mas entendo a preocupação dos líderes da comunidade em trazer as mulheres de volta às sinagogas. E que melhor forma de preparar esse caminho do que através do bat-mitzvá?

- Então...posso começar a organizar a cerimônia, da mesma forma que fazia em Paris? - A diretora teve que se conter para não dar um grito de alegria.

- Talvez com menos glamur do que lá... é uma cerimônia religiosa, afinal de contas - considerou o rabino. - Mas prepare um programa e me apresente para aprovação.

- Esteja certo de que o farei, rabino - prometeu Madame Gadi com fervor.

- Ah, mas uma coisa... - Efrat Lieberman pareceu ter se lembrado de algo importante. Na verdade, era o principal motivo pelo qual fora procurar a diretora. - Como sabe, minhas filhas Sigal e Yana são suas alunas...

- Naturalmente - acedeu a diretora, tentando antecipar as palavras do interlocutor. - E Yana está perto de completar 12 anos, e portanto pode participar do primeiro bat-mitzvá. É isso o que queria dizer, rabino?

- Sim... e não - admitiu Efrat Lieberman. - Na verdade, minha preocupação é com a mais velha, Sigal. Ela não teve um bat-mitzvá, e está acima da idade para participar de um.

- Sigal vai fazer 16... - lembrou Madame Gadi.

O rabino remexeu os pés, aparentemente desconfortável.

- Eu não quero começar uma discussão em casa por conta da exclusão de Sigal da cerimônia. Na França havia algum tipo de comemoração para apresentação das moças goyim à sociedade?

A diretora encarou-o, desconcertada.

- Sim... bailes de debutantes.

E, levando a mão ao queixo:

- Talvez possamos organizar uma festa que reúna as moças de 16 anos da comunidade... sem qualquer conotação religiosa, naturalmente.

- E sem usar esse nome goy de "debutante" - alertou o rabino.

Madame Gadi pensou um pouco antes de sugerir:

- Que tal "feliz dezesseis", rabino?

- Aprovado - foi a pronta resposta.

- [16-06-2018]