Ich gebe auf

Eu estava no lugar mais alto que um soldado podia estar. Estava a receber naquele grande salão uma honraria por ter capturado um pelotão de alemães , durante aquele tempo horrível que foi a guerra.

Luzes em todas as direções, a banda de Paul Whiteman tocando os mais belos sons que a alta sociedade podia estar costumada a escutar. As luzes cobriam cada movimento em que eu estivesse presente. Preocupado, eu arrumava meu cabelo e minha gravata a todo instante, perante às mais importantes figuras ; presidente, chefe de estado, ministros e alguns outros que eu não soubera a função, mas soubera que eram importantes, e vestiam-se com roupas chiques.

Andei a passos largos até um sala reservada só pra mim. Tinha champanhe, alguns camarões em uma casquinha muito gostosa e umas frutas com nomes estranhos, mas pela beleza, eu tinha certeza que eram caras. Um espelho bem ao meio da sala e um sofá vermelho muito confortável, diferente daquele lá de casa, mal acabado e marrom, cor de poeira.

Estava perceptível que a cada passada de mãos no meu cabelo, a dama da mesa onde estavam rosas brancas , me olhava com timidez mas com completo interesse. Perguntei ao George o nome dela, e ele me disse que aquela senhora era uma importante colunista do jornal diário da capital, Chloe.

George era um engravatado também, mas que de alguma maneira, assim que acabou a guerra, fora em minha residência me pedir que comparecesse à capital para conversar com algumas pessoas sobre o que tivera acontecido à algum tempo atrás.

Aquilo foi um transtorno!

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Estava frio e não dormíamos há mais de 36 horas. Estávamos perto da Áustria, em algumas trincheiras que restaram do 23º pelotão, que foi morto por avançar a fronteira.

Éramos 9 soldados advindos de casas tranquilas no Texas, Arizona e Tenesse. Mas como começara a guerra, tivemos de interromper os estudos e lutar pelo nosso país.

Bom, era já o 43 º dia de tiros trocados e estávamos exaustos. Eu não aguentava mais segurar o meu rifle, pois aquela arma pesa quase 7 quilos.

Sentado à noite dentro da trincheira, eu e mais 8 homens custávamos a abrir os olhos de cansaço. Não dormíamos Há muito tempo e a comida já era desejo de cortejo. Muitas árvores nos cercavam, e a lua estava bem brilhante, iluminando os campos que estavam à nossa frente.

Em meio à 5 minutos de silêncio, Hebert , que estava a estudar letras, comentou conosco que conhecia um pouco da língua germânica e russa.

Acendi um cigarro , -faltavam só três pra acabar a última caixa- , e ao horrivel som de sua voz, ele começou a cantar em alemão. Foram risos soltos de todos os exaustos soldados que estavam conosco. Eu nunca tinha gostado de álcool, mas como estava muito frio e eram os últimos cigarros, resolvi pegar a garrafinha de água do Smith e beber todo o Whisky. Lembro-me de Hebert dizendo que se alguma hora fôssemos surpreendidos pelos alemães, teríamos que gritar : - Ich gebe auf !!! Ich gebe auf !!! Ich gebe auf !!! Que significava Eu me rendo , em alemão.

É claro que uma trincheira com 9 soldados seria surpreendida pela frota alemã uma hora ou outra..

De repente, escutam-se tiros e eu já havia desmaiado de sono com a horrível voz de Hebert , cantando em alemão.

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Ah, aquela dama me deixara maluco! Sabe aquelas mulheres que não demonstram interesse, mas ficam te procurando com os olhos? Ela estava na mesa com mais duas damas e dois cavalheiros, que não sabia quem eram.

E então, uma moça chega até mim junto ao George, com uns papéis na mão, ajeitando meu uniforme e me entregando minha boina. Na verdade não era a minha, pois eu havia a perdido no meio da confusão na Áustria, então me arrumaram outra. Estava fazendo um pouco de calor na capital, pois eu era acostumado com o frio do campo. Então, tirei meu paletó, e com um aviso em forma de grito George diz : - Não tire seu paletó, campeão, entraremos em breve.

Entraremos onde? Ah, pronto. Virei atração de circo? Ou será que é só por causa de eu ter rendido um pelotão inteiro de alemães sem disparar uma bala? Acho que é melhor a segunda opção. Ou não.

Aqueles instantes antes de George voltar, foram cruciais. Levantei-me do sofá, e abri um pouco a cortina de seda e vi Chloe sentada à mesa, com aquele charme todo. Aquele momento foi intenso pois ela conseguiu me enxergar na fresta da cortina.

Como pode?

Ela estava olhando já?

Será que ela sorriu pra mim por que vou ser honrado pelo presidente ou por que acredita que sou um repleto babaca?

Entrei, várias luzes em minha direção, apertos de mãos, uma medalha no peito, palmas, sorrisos, retratos. Ficava sem graça , mas agradecia.

Após tudo isso, a sra.Chloe veio até mim, cumprimentou-me e pediu-me uma entrevista exclusiva. Logo aceitei, sem pensar 2 vezes.

Após a entrevista ser extremamente profissional, George me buscou no hotel em fizemos a entrevista e me levou pra casa. Apenas isso. O meu encontro com ela foi somente profissional. Fiquei muito triste , mas era melhor assim, pois se ela soubesse a verdade, a admiração que tinha por mim, acabaria, me levando à ser chacota nacional.

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Após os barulhos ensurdecedores de tiros, acordei assustado e vi os soldados atirando contra o Norte. Lembrei que estava sem munição e quando abri os olhos completamente, percebi que vinham tiros do Norte também contra nós. Segui a ordem do Sargento Doll, de se render e gritar : Ich gebe auf , bem alto, para que os soldados que vinham do Norte pudessem escutar e cessar fogo. Pelo menos não morreríamos, mas seríamos prisioneiros de guerra. Minha visão estava meio turva, mas ainda sim consegui juntar forças do pulmão e ...

- Ich gebe auf !!! Ich gebe auf !!!! Ich gebe auf !!!!!

Gritei bem alto e todos me olharam assustados, levantando as mãos e jogando seus rifles no chão, gritando também.

Alguma coisa estava diferente.

Ou estava muito escuro, ou eu não consegui reconhecer ninguém que estava perto de mim.

E parece que o número de soldados aumentou!!!

Triplicou!

Meu deus.

O que está acontecendo???

De repente, vi Hebert e mais 7 homens vindo do Norte, com os fuzis apontados pra nós, e uma cara de espanto ao ver tantas armas ao chão.

27 soldados alemães, rendidos por mim?

Eu havia dormido tanto, que quando os Alemães chegaram perto da trincheira, os meus aliados correram para o Norte, se esconder no matagal. Mas eu estava tão cansado que se quer escutava minha respiração. Então os alemães entraram na trincheira para atacar o meu pelotão que estava revidando e gastando suas últimas munições.

Foi aí então que lembrei das palavras do Sargento e gritei bem alto : - Eu me rendo - em alemão. Todos os soldados escutaram e perceberam meu desespero, achando que eu era um deles, e fizeram o mesmo.

Herói ou Sortudo do milênio?

Caio Vieira
Enviado por Caio Vieira em 03/08/2018
Reeditado em 03/08/2018
Código do texto: T6408554
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