A pescaria

Final de tarde de sábado. Lá na ponte do Rio da Mortes, por volta das quatro horas da tarde, encontrava-se um grupo de amigos. Eram umas oito pessoas. Todos trabalhadores, que durante a semana tinham os afazeres. Um, era médico, outro, fazendeiro, outro, funcionário público, outro, dentista, outro, contador, outro, aposentado, outro, vereador e o último, um experiente pescador profissional, mas já havia aposentado há quatro meses.

A merenda ficou por conta do dentista, que foi até a padaria e comprou rosca, pão de queijo, coca – cola, pão com salame e presunto, água mineral, enfim, uma caixa de matula que serviria para o dia todo. As iscas ficaram por conta da experiência do pescador, que foi ao açougue do Tião e comprou tripas, massinhas e outras disponíveis para o bom e belo momento do grupo. As varetas e os anzóis ficaram por conta do funcionário público.

No dia anterior, combinaram o horário de chegada.

O dia estava um pouco quente. O sol brilhava e se escondia entre nuvens a todo instante. Uma fina camada de névoa ainda era vista pela manhã e era consequência do fenômeno climático, pois era outono e o prenúncio da estação inverno. Lá se via e ouvia o cântico dos pássaros voando pelas árvores. Ouvia-se o barulho das águas escorrendo sobre algumas pedras e sentia-se ondas, dentro da água, de alguns peixes que se aventuravam a saltar sobre o rio. Não se sabe se saltavam para ver se tinham alguns pescadores ou se eram momentos íntimos deles.

Na hora marcada, iam chegando os componentes do grupo. Um a um, os veículos iam estacionando beira rio. Primeiro foi o médico, que saiu às pressas do plantão e mal teve tempo de ir para casa. Foi logo saindo e, perto da ponte, trocou de roupa e colocou a bermuda, a bota, a camisa e o chapéu mexicano. Foi motivo de risos entre os colegas.

O funcionário público chegou e logo foi armando o material. Tinha pressa e disse que o Arnaldo pegou um grande peixe chamado dourado. Pesou entre quatorze e quinze quilos. O contador chegou cansado e disse que no dia anterior fez muitas declarações de imposto de renda. Estava exausto e disse para não contar muito com ele. A cabeça doía, os braços estavam dormentes e o corpo era todo câimbra. Então, o pescador aposentado, com toda a experiência, clamou:

- Vamos, vamos minha turma.

- Hoje o rio está para muito peixe. Posso sentir que o calor está meio forte. A temperatura da água está propícia para muito peixe. Quem sabe vamos pegar um grande dourado. Caso isto aconteça, vamos assá-lo e devorá-lo regado de muito cerveja, pinga e muita música caipira tocada de viola e sanfona.

- É isto aí.

- Vamos começar.

Ao som dos anzóis caindo sobra as águas, ouvia-se o barulho e os risos e gritos da moçada. Uns cantavam, outros, riam e a manhã estava iniciando e era somente alegria entre o grupo.

Uma velha e linda canção era ouvida através do pescador aposentado. Uma música que se iniciava mais ou menos assim: “ Tirei um dia de soro, cabana meditada...”

- Canta outra, amigo, dizia um.

- Que nada, a “ Fio de cabelo” é mais bonita e sente um amor profundo. Lembra de quando eu conheci a Tereza.

- Você é muito romântico. Eu gosto é da velha brilhantina.

- Tem coroa aqui que não acaba mais.

- Sou mais flexível e gosto de tango, música clássica e até balé.

- Cuidado com este tipo de dança, vamos pensar outra coisa de você.

Ao som de carros que trafegavam sobre a ponte e das conversas entre eles, a manhã ia passando. Já se passavam das onze horas e nenhum peixe aventurou em ir ao encontro dos anzóis. O sol esquentava ainda mais e o jeito era comer as matulas. De vez em quando o sol se escondia entre as nuvens. Um pássaro voava por sobre eles e cantava ao longe. Deveria estar rindo e caçoando deles. Era normal. Muitos risos e piadas eram contadas. O médico contou que teve que fazer um parto às pressas e que a criança nasceu dando chutes para todos os lados. O dentista falou que ia viajar na semana seguinte. Seria padrinho de casamento do próprio irmão. Assim, a manhã seguia.

- Venham até aqui, disse alguém.

- Olhe lá no fundo. Vejam as ondas se formando. No barranco, quatro capivaras estão nadando. É uma família. O macho, a fêmea e dois filhotes. Já deram cinco mergulhos. É muito bonito. A natureza revela o mais extraordinário possível e a riqueza de sua flora e fauna.

Eles apreciaram tudo ali, silenciosos e esqueceram um pouco do que estavam vendo e fazendo. O silêncio deles foi quebrado com a chegada do prefeito. Disse, em voz de brincadeira:

- Está dando peixe aí?

Uma voz, bem delicada e ao tom de zombar, disse, meio mole?

- Não, nem um simples lambari. Já vimos pássaros, capivara, peixe pulando sobre as águas, mas nenhum peixe quis morder a isca.

Riram muito e os cumprimentos foram dados. Porém, o prefeito se retirou. Ele ia a um compromisso na zona rural do município.

O tempo ia passando e nada de pegar peixe. De vez em quando, algum comia a isca e eram postas novas iscas.

Já cansados e nada, alguns já queriam ir embora, mas o pescador insistia para ficarem. Na parte da tarde era o melhor horário para o peixe chegar. De repente, uma vara começa a balançar. Outra também começa e assim, todas as que estavam em espera se movimentam. Foi uma correria. Cada um pegando a sua vara e dando os procedimentos de fisgada. É um dourado bem grande. Ele está pulando sobre a água. Vamos...

Meia hora, eles estavam lutando com o peixe. Um pequeno inconveniente: o peixe foi fisgado na vara de um, mas foi bastante inteligente e foi passando por outras varas, fazendo com que os anzóis se misturassem entre si e dando a impressão que todos puxassem ao mesmo tempo.

No final das contas, quando tiram os anzóis, estes estavam todos enrolados uns aos outros e o peixe escapou. Era de mais ou menos uns dezoito quilos. Foi embora e restou água na boca dos pescadores.

Desolados e tristes, tiveram que cortar os anzóis e prometeram que na semana seguinte pegariam o peixe fujão.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 05/05/2019
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