O Princípio

Hephzibah Neiper foi chamada por sua mãe, Keziah, à sala, onde a aguardavam o pai, Elias, e o presidente da congregação local, Ephraim Manifold. A jovem cumprimentou o visitante, um homem de cerca de 50 anos de idade, cabelos e barba grisalhos, porte imponente, e o pai disse-lhe que tomasse assento junto à mesa.

- Precisamos falar sobre o seu futuro, filha - declarou Elias Neiper. - O presidente Manifold está aqui para lhe propor casamento.

Hephzibah arregalou os olhos. O presidente era pelo menos 30 anos mais velho do que ela, e além disso...

- Mas papai... o presidente Manifold não é casado?

Manifold abriu um sorriso de dentes amarelados de nicotina.

- Sim, eu já tenho uma esposa, e você a conhece... Candace. Mas, como deve saber, o casamento plural é reconhecido por nossa igreja. Na verdade, o próprio Jesus Cristo teve várias esposas, portanto, nada há de errado nisso.

- Sendo a segunda esposa do presidente Manifold, você será uma pessoa de importância dentro da nossa comunidade - incentivou-a o pai. - Muito melhor casar-se com um homem influente e experiente, do que com um jovem imaturo e sem posses.

Hephzibah olhou para a mãe, em busca de socorro, mas recebeu de volta apenas um olhar vazio. Aparentemente, seu destino já estava sacramentado. Sentindo a resistência, Manifold voltou à carga.

- Você deve compreender, Hephzibah, que o que me move não é a concupiscência, mas a necessidade de deixar herdeiros. Candace, infelizmente, revelou-se estéril... e embora eu a ame muito, não pretendo abrir mão de gerar minha descendência e cumprir o preceito bíblico.

- Eu entendo, presidente Manifold... mas será que não haveria outra jovem mais bem aquinhoada de dotes espirituais do que eu, para cumprir esta... missão? - Objetou Hephzibah.

- Do que eu preciso é de uma mulher jovem e saudável, e você me parece cumprir com ambos os requisitos.

- Minha filha é forte como um cavalo - assegurou Keziah Neiper.

- Um cavalo não seria tão gracioso - riu Manifold. - Para quando podemos marcar este casamento?

- É só o tempo de preparar o vestido - assegurou a mãe.

- O mais rápido possível, então - determinou Manifold, erguendo-se.

E, inclinando-se sobre a futura esposa, beijou-a no rosto.

- Tem o perfume de uma maçã fresca - sussurrou.

Hephzibah olhou novamente para a mãe, apavorada. Em vão.

[Continua em "A Colheita"]