Silêncio

Em silêncio; eis minha busca.

Enquanto meu olhar se deita sobre cores sem fim, vou me percebendo como não poderia caso não estivesse como estou. Contemplando. Ao redor. A que serve isso a que nos habituamos a chamar vida, e que a tendo nos é impossível tê-la por inteiro?

O que há além do que posso ver?

As ondas e o som de suas vozes. O mar em seu eterno balanço, ele que viu tudo... Ele que sabe mas permanece silencioso. Silêncio... Essa é a resposta do sábio. Só as ondas falam. Mar calmo...

Mas meus ouvidos não podem deixar de ouvir o mar e sua súplica. Ele quer que eu entenda, apenas sei, sei porque enquanto escuto sua voz meus olhos também o ouvem, meus ouvidos o veem. Ele pra sempre aqui estará. Porque sempre esteve. Nós também? Partes de um todo despedaçado, reconstituído.

A manhã está quente. São muitos os tons de azul. Meus pés se revolvem em milhares de grãos, a areia da praia é fina e sem números. O sol realçando a vida e nutrindo-a com o mistério do seu calor para que entendamos o frio. Ele também sempre aqui esteve. O sol é cúmplice do mar. Os dois sabem, e não nos contam. Porque o silêncio é a resposta dos sábios. Ou talvez esse pensamento apenas tenha desejado confundir para que após a confusão, o tal confuso fosse ajustado ao que entendemos sobre o silêncio. Nós, que somos uma voz incansável.

E as ondas quebram... som eterno...

Crianças correm na areia e invejo com brancura a liberdade que as move. Elas cavam buracos, se admiram e gargalham com a água que os tampam, e cavam outra vez, e outra, e outra. Até que começam outra coisa e esquecem a anterior, e assim vivem. Os adultos, distantes, são preocupações e planos, lembranças e desejos. De vez em quando alegrias. O mar não os admira. Eu os observo. Observando-os sei que também me observo. Eu, que sou a medida do meu mundo. Eu, medida de todas as minhas coisas. Olho da janela e posso me ver. Eu, que nada tenho.

Desperto pra o que há ao redor porque já estava adormecido pelo eu que há em mim, esqueci o som do mar e sequer havia reparado nas nuvens. Sempre quis saber de onde elas vinham, e ainda quero, nunca acreditei nas versões oficiais. Na verdade, não acredito mais em nada do que me disseram até aqui, apenas as palavras ainda me são necessárias, elas são como pedras que duramente enfileiro para atravessar o córrego da incerteza. Não quero molhar os pés no córrego que carrega todo o tipo de coisas que não sei apenas porque me disseram que deveria ser dessa maneira. Porém, eu sempre me molho.

Mas acredito nas crianças. Vejo nelas o que inevitavelmente se perderá e as admiro com certa tristeza por não conseguir lembrar de como era... de como era não saber tanto, não tanto porque se sabe muito, mas sim um tanto que sempre faz. Tanto faz. É o que saber faz.

E de onde observo o quadro incessante, o movimento do agora acontecendo no presente de todas as coisas, embora saiba que já sou passado antes mesmo de lembrar que fui o futuro de uma criança um dia, vejo e revejo a imagem que expressa essa parte que também é fase do que sou sem saber que sou; Eu; Me vejo como em um espelho, mas em um que não mostre o meu contrário, meu oposto. Só que nesse também ouso olhar pra dentro, eu me arrisco. O que verei? Mas pra tudo há um preço. Quebro a magia do eterno em meu silêncio e escuto os vidros se partindo. Cacos do espelho estão em minha frente embora a areia branca continue imaculada do que sou. Antes de poder catá-los e me vangloriar do meu feito, um outro espelho, intacto, está a me observar, mas já não é a mesma imagem que vejo. Agora existem cicatrizes... talvez ela tenha se machucado ao quebrar o espelho com as mãos. É preciso quebra-lo com o que se é, as mãos são apenas instrumentos... A resposta do sábio talvez faça sentido... agora entendo. Sempre há uma rachadura no espelho...

Estou em silêncio... consigo ouvir a resposta...

O eterno mar sussurra preces sem fim... E eu aqui exigindo uma resposta...

Sinto os grãos. Areia fina. Crianças felizes. Adultos tristes. Tristes sei que são felizes, porque a alegria depois é ver crianças sorrindo. Escondemos delas a Verdade... guardamos em silêncio... ouvindo o mar... fingimos... há o Tempo... pra tudo... tudo em seu tempo...

Ah! Mas estou perdendo o mar... ah mar! Amar...

Serei silêncio?

Ouço a resposta...

Edgar Lins
Enviado por Edgar Lins em 27/01/2018
Código do texto: T6237885
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