Falta de inclusão

Faziam doze dias que Baltasar estava doente, sua mãe trazia um desespero grande em seu coração quando imaginava perdê-lo. Encontrava-se deitado em sua cama. O quarto bem antigo. A cama deixava a desejar com o conforto, afinal moravam de favor e não tinham dinheiro para investir em remédios, quanto mais em móveis. Seu rosto pálido e enrugado causava tristeza em qualquer um que ousasse visitá-lo.

A doença ninguém sabia qual era, nem mesmo o doutor da cidade vizinha. Poderia levá-lo em um hospital fora do país, mas sua renda não lhe assegurava. Não era exatamente no exterior e, sim, em outra cidade, porém tornava-se algo longe demais, comparado a ir aos Estados Unidos.

Tadinho. A falta de cálcio nos ossos lhe levava ao choro, tentou várias vezes levantar-se de sua cama e não conseguia. As cinco línguas que sabia falar não o servia para nada no momento, estudara tanto e onde foi parar, ou melhor, nunca saíra dali. Seu coração não se abalava, só que se fechava naquele momento para o mundo que o rejeitara.

– Coitado, doutor. Nem pode terminar a faculdade por conta da fraqueza. – disse Rosa, sua mãe, enxugando uma lágrima no canto do rosto que insistia em cair.

Não era tão fácil para o médico também. Ele estava lá para trabalhar para o povo, mas a falta de material dificultava até um diagnóstico mais preciso. Poderiam ser mil dores e duas mil doenças, mas seu doutorado de nada lhe valera, pois naquele prédio do hospital aonde só ele ia por compaixão das pessoas daquela região, não tinha um bisturi.

– É difícil, senhora. O que poderia fazer, eu já fiz. Leve-o para casa e dê-lhe soro. Servirá para fortalecê-lo.

A mulher voltava para casa com dificuldade. Carregava um rapaz de dezessete anos no braço, o que prejudicava sua coluna. Sentia uma certa culpa por ter votado para prefeito em um sujeito que, simplesmente depois de eleito, sumiu. Mesmo que seu voto não foi o único a colocá-lo no poder, mas ele contribuiu para o caos.

Na cama, Baltasar chorava. Sentia na pele o desespero da mãe. As ajudas que recebera da vizinhança o serviram muito, só que a vontade de voltar a andar era bem maior.

Algo o impedia de respirar, a febre já estava quase quarenta graus. Rosa percorria as casas atrás de um chá, pois seu filho poderia ´´bater as botas`` ali mesmo, sem antes se despedir.

Há dois dias, dois meninos da comunidade vinham sentindo os mesmos sintomas. Seria um surto de doença? Que doença? Só Deus sabe! Morando ali, estavam privados de todos os tipos de conhecimento. Eram as mesmas dores; na cabeça, nas articulações, febre… e se aquilo matasse, eles morreriam.

Naquele fim de mundo respirar era algo tão precioso, assim como a água que o prefeito liberava uma vez na semana. Um dos problemas, pois o menino precisava de soro e o que recebera no posto era em pó, e de onde tiraria água para fazê-lo? A água do rio estava imprópria para o consumo, pois todos lavavam roupa lá.

Rosa viu que seu filho não aguentaria mais e voltou ao posto em prantos:

– Doutor, meu filho está morrendo. Me ajude, pelo amor de Deus. – lamentou ela, passando as mãos no rosto, esticando-o.

Sem saber o que fazer, ele se pôs a chorar junto com a mãe. Era mesmo o fim, o menino estava perdendo seus sinais vitais e o que podia se fazer era calar-se, esperar a morte e enterrá-lo.

Baltasar sofreu como podemos dizer ´´comeu o pão que o diabo amassou``. Sem poder aliviar a dor daquela pobre sofredora que sentia por sua morte, também chorou. Fechou os olhos e se foi. Partiu sem deixar explicações, sem um porquê aparente. – miseravelmente.

Rosa ainda vive de luto pelo seu filho que morrera há três anos. E se ele ficasse doente hoje, conversando com amigas e um pouco mais de conhecimento, ela diria:

– Tadinho, morreu de dengue.

Breno Nottingham
Enviado por Breno Nottingham em 04/02/2020
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