POR FAVOR, UMA MOTO!

Quando pisou na loja aquela manhã, Cris suspirou fundo e uma tristeza nostálgica se apossou dela. Enfrentaria mais um dia de trabalho, com certeza seria bem sucedida, mas não havia garantias para o coração. Vender motos era sua especialidade. Conhecia todas as marcas e modelos. Fazia isso há cinco anos e quando o cliente fazia qualquer pergunta, já tinha a resposta na ponta da língua. A loja, especializada, que ficava na auto-estrada, na entrada da cidade, recebia compradores potenciais a todo o momento. Ela vendia três máquinas por dia e, quando a maré estava boa, chegava a até cinco. No final do mês o sorriso era escancarado com o acréscimo salarial das polpudas comissões. Mas o coração de Cris estava abalado. Tinha um potencial enorme de amor, mas não tinha certeza de ser amada. Sentia-se comprometida, mas não se sentia protegida. Morava com alguém, mas seu coração tinha asas que os céus de sua cidade interiorana não poderiam conter. E sempre que via uma moto sair da loja, pilotada pelo mais novo felizardo da região – quase sempre um homem lindo aos seus olhos – imaginava-se na garupa, indo embora para o mundo, ganhando as estradas do Brasil, na busca do seu sonho profundo. E Cris, naquele dia batera seu próprio recorde. Vendera sete máquinas: quatro Hondas e três Yamahas. As vendas alegravam seu dia, mas, a cada ronco do motor partindo, e ela ali, atrás da mesa, contabilizando esperanças, sentia esvair-se. Tomava-se de devaneios, derramava suspiros de amor, na expectativa de ser amada como merecia. Ela era uma bela mulher. Musa de poetas. E quando a conheci, e conheci os recantos do seu coração, comecei a juntar dinheiro. Dinheiro em dobro, para comprar uma máquina possante, Honda de muitas cilindradas, tomado monasticamente de um firme propósito. A loja, aos sábados, fechava ao meio-dia. Naquele sábado alvissareiro, faltavam apenas cinco minutos para ela fechar, quando cheguei apressado, portando uma pasta com rios de dinheiro. Comprei uma máquina à vista e disse para Cris: - Estou te esperando! Ela olhou-me surpresa, avaliou-me de alto a baixo, esboçou um sorriso irônico, como se a lembrar de emoções do passado, e pôs-se a cumprir a rotina de fechamento da loja. Naquele início de tarde ela subiu na garupa da moto Nova, deu um telefonema para casa e ganhou comigo as estradas do Sul do país. Quando apareceu na segunda-feira de manhã para o expediente normal, Cris era uma nova mulher. Profissional competente. Mulher feliz!

ALEX GUIMA
Enviado por ALEX GUIMA em 08/03/2006
Reeditado em 13/01/2024
Código do texto: T120628
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2006. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.