O QUE ROLA NOS TRILHOS DA CENRAL

O trem da Central, rola nos trilhos, tal comprida serpente, onde

tudo de imaginável se passa no seu interior: Pingentes pendura-

dos escorregam para a morte, tragados pelos postes, no veloz

trajeto aglomerado, sem deixar escolha. – No último vagão, co-

mo consequência de nada ter nos bolsos,uma vítima descansa ( varada por uma bala no coração,sem vela acesa, nem lençol cobrindo o rosto), aos olhos dos presentes, com o sangue escorrendo pelas bre-

chas da porta corrediça. – A dois carros acima, completamente

alheias ao que se passa no último, senhoras vestidas de branco,

desenvolvem rituais para retirar o espírito mau de uma passa-

geira. O culto só é interrompido pelos gritos dos vendilhões de

de balas, amendoins, giletes jornais e uma variedade de obje-

tos de uso doméstico. – Muitas fisionomias depauperadas pela

luta cotidiana, ressonam nos bancos de madeira,atirando lon-

gos suspiros e tirando dos outros o direito de não se fazerem

travesseiros seus.- Em outra composição, uma mocinha u-

niformizada - louca fugitiva do hospício constantemente ameaçando atirar-se pela janela.. Pessoas, já as cinco da ma-

nhã- embriagadas, gesticulando, incomodando, contando his-

tórias fantásticas de mulheres, assaltos, policiais, especulado-

res e outros assuntos que despertariam a atenção de policiais

que ali viajassem conjuntamente. Logo à minha frente, uma se-

nhora deu uma bolacha na cara de um aproveitador que se em-

balava no seu traseiro; enquanto que, a que me caiu como

companheira de aperto, fazia questão de se comprimir con-

tra o meu corpo, necessitada dos embalos rejeitados pela sua

colega. – No final do itinerário fui jogado para fora do trem,

sem querer. –“ Quando se viaja no trem da Central, não se

pode impor desejos ou alternativas: Entra-se ali, para o que

der e vier.”

Zecar
Enviado por Zecar em 13/05/2005
Reeditado em 01/07/2016
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