Os potros

A água rápida dos recantos toca os cascos. Os raios brilham, as nuvens secas ganham a cor da noite. O olhar perde-se no clarão. O horizonte é uma cruz distante. No fim do dia o começo. As peles e os pelos confundem-se na umidade dos cheiros, na aspereza das mãos, no corte trançado das rédeas. Dentro do dentro uma outra noite. A memória é tênue e confusa. O destino é um velho signo cujo código perdeu-se no laço da própria sorte. Antes, muito antes, quando a tarde ainda era um pedaço, os velhos queimaram o fumo em festa. Depois, pouco depois, quando a luz cinza listrou os campos, sujaram as unhas de terra, entranharam-se pelos atalhos. A planície sem fim assombrava suas histórias. Os potros, vultos velozes, chegavam ao verde, sentindo a dor da lida e o sangue dos atiradores. Retornaram vivos, a doma é passado. A marca dos estilhaços é o que resta na memória. Saíram de dentro da ausência, correram para a margem. Ao chegarem nas entranhas das lembranças, livraram-se de todos os arreios. A liberdade era mais que uma poça d´água onde os cascos escondiam as feridas de suas andanças pelas planícies de um tempo que hoje é um apenas um braço de terra seca.

fernandorozano
Enviado por fernandorozano em 17/06/2006
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