O Vôo

E enquanto ela estava ali, sozinha, a escrever uns pequenos versos, observou que ao longe um pequeno inseto cambaleava tentando alçar um vôo que, só Deus sabe, era uma dificuldade tamanha. É que uns três segundos antes dela observar, o inseto pousara ali em cima dos papéis e da tinta, e perdeu uma asa, fina e delicada, a pequena mancha de tinta absorveu uma metade de suas forças, mas mesmo assim o bichinho ainda relutava contra o pequeno tinto, empurrando com suas pequenas patas a superfície da folha e manchando-se ainda mais de preto. E ela, que gostava de observar as tragédias da vida, parou no meio do soneto e pôs os olhos no inseto, parecia calcular cada minutinho de agonia do bicho, e antes dele acabar morrendo ela provavelmente o esmagaria, era que dava nojo em tudo ver umas patinhas da espessura de um fio de cabelo, e umas asinhas tão nojentinhas agoniadas em cima da sua folha de jornal. Podia ficar ali o dia todo olhando o bicho, se não fosse por sua dor, era mais inquietude, ela não conseguia ficar parada, precisava de movimentos e de sons, principalmente de vozes, mas quando se concentrava queria silêncio absoluto. Dezesseis minutos contadinhos, aí o bicho desprende a asa, faz três pousos sobre o jornal, e voa...

Aline S Silva
Enviado por Aline S Silva em 24/06/2006
Reeditado em 24/06/2006
Código do texto: T181686
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