O peso de uma lágrima

Cunhantã crescia. Seus cabelos negros e longos deslizavam pelas costas de pele morena. De rosto arredondado e iluminado por olhos escuros, ela gostava de brincar, na beira do rio, bem pertinho da aldeia.

Seus seios, despidos, podiam ser sempre vistos, num desafio constante à lei da gravidade. O corpo jovem era adornado apenas por um punhado de sementes, chocalhando, num tornozelo. Ela gostava de viver em contato com a natureza da qual fazia parte.

Cunhantã nasceu ali. Tinha prazer em se isolar para admirar o belo, o que a fazia sentir-se diferente das outras indiazinhas. Da mesma forma, era feliz e acreditava que seu mundo jamais desabaria. Queria permanecer na maloca, pois a concretização dos seus sonhos dependia do prazer de correr na praia e jogar pedras no rio.

Chegou o dia no qual a jovem índia se surpreendeu ao ver ao longe a silhueta de um cavaleiro. Ele se aproximava cada vez mais, e mais. Por fim, chegou. Desceu do cavalo e se achegou causando pânico na adolescente que jamais tinha visto um homem de pele tão clara e cabelos parecendo raios de sol.

Aos poucos, o estranho conseguiu ficar a menos de um passo de distância e, frente a frente, deixou a indiazinha estagnada. Ela não teve forças para correr. Mesmo assim tentou. Sua tentativa foi interrompida pelos pulos fortes que a jogaram de costas na areia quente que até então lhe dera muito prazer.

Outra vez, ela tentou. Não conseguiu sequer soltar o grito preso na garganta. Caída, apoiando-se nos cotovelos, elevou o tórax. Para contar com as forças dos pés precisou dobrar os joelhos. Queria se arrastar e se desvencilhar do forasteiro. Naquela agonia, ela não percebia, porém acabara de abrir as pernas colocando em evidência a púbis virginal. Sem êxito, pensou ser muito estranha sua tentativa de fuga enquanto seu algoz – boquiaberto – admirava todo erotismo inocente exibido por ela.

Assim, aos poucos, num tempo que não passava logo – e ela calcularia - semelhante a três ou quatro passagens de lua, reinou o suspense. Um grito sufocado agitava o coração da cunhantã. O invasor - já despido – chegou tão perto que podia sentir o cheiro natural exalando daquele corpo feminino acostumado com as águas do rio e o frescor da mata. Foi então que ela pôde ver como os olhos dele eram de um azul tão claro quanto o céu que agarrava o sol. De súbito, ele se jogou - ou caiu ? , pensaria ela- entre as coxas mornas da cunhantã que não sabia se “aquilo” era um homem, um animal, ou simples objeto de sua imaginação. Soube que era real quando sentiu suas entranhas penetradas com força descomunal, e o sangue jorrando sobre a areia coberta pela frescura da brisa.

O homem branco se movimentava com volúpia - fúria, talvez. Demonstrava gana em devorar os seios da menina que, sem entender o fato, calou sua dor e, mesmo contra sua vontade, não tinha opção. Perdeu as forças. Entregou-se.

Depois, num impulso, ele levantou. Sorriu de forma cínica e cuspiu aos pés daquela que acabara de tornar mulher. O estranho caminhou em direção ao rio e um pouco mais à frente, de soslaio, percebeu que sua presa mal tinha conseguido virar o rosto para poder vê-lo mergulhar várias vezes. Em êxtase, ele brincava no rio. Nesse ínterim, ela – sem forças – não podia sequer passar a mão no rosto para secar tão pesada lágrima.

Roraima
Enviado por Roraima em 16/06/2006
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