O Filho

Estavam ambos deitados sobre a cama, esgotados. Luz acesa. Ele, sereno. Ela, pensativa.

- Por que será que com você sinto uma vontade louca de me deixar engravidar? – Ela disse isso com um ar de malícia, de doce menina. Ele, cigarro ainda apagado na boca, sorriu impassivelmente.

- Acho que você gosta mais de mim.

- Não sei. Você gosta de mim? – Ela acariciava os cabelos enquanto falava com uma voz meiga e uma entonação de pedinte.

- Claro.

- Mas não quer ter um filho comigo.

- Quer mesmo ter um filho? Faço-o agora... – pegou-a pelo braço e a trouxe para mais perto de si. Beijou-a com desejo sincero. – Mas olhe – segurou a sua cabeça puxando-a pelo queixo e a fez olhá-lo nos olhos. – Não assumirei esse filho. Será dele. Dele e seu.

- Não me importa. Saberei que é seu. Que é nosso.

Agarraram-se e ela a ele se entregou com desejo. Ele a segurava com força e virava o seu corpo para vê-la melhor. Passava as mãos por seus seios e por sua bunda. Naquele instante ele a amava porque ela era imoralmente sua.

Novamente esgotados, entreolhavam-se, suados. Noite alta, ele a observava enquanto ela achava que podia estar deveras grávida.

- Vamos ter um filho. Um filhinho, nosso!

- Já disse que será seu e de seu marido. Quero assim.

- Também quero assim.

Estiveram em silêncio por alguns momentos. Ambos jovens, ela mais ainda. Não era casada. Aquele a quem ele se referiu como marido era na verdade um namorado. Ele também tinha uma namorada, Laura, e a amava ternamente, com paixão e tremor.

- Se eu estiver grávida de verdade, vai contar a ela?

- Não sei.

Eram amigas as duas. Colegas da faculdade de Dança. Saíam sempre juntos: ele, Laura e a menina, a doce menina. No começo, quando se conheceram, divertiam-se tanto! Confiavam uns nos outros e todas as noites se encontravam e bebiam muito vinho. Laura foi morar com ela, com a menina, que morava só. Dormiam lá os três sempre juntos, alimentando desejos mútuos que imperavam nas noitadas regadas a vinho e insônia. Faziam sexo os três. Três bocas se encontravam no beijo. Três corpos se tocavam nus, e ele enlouquecia. Laura gostava de vê-lo penetrar a menina com um desejo irracional e deixava tudo acontecer. Mas um dia, talvez por ciúme, interrompeu os festins e não quis mais vê-los juntos na cama. A menina arranjou um namorado. E todos continuaram muito amigos.

Ele pensava em tudo isso agora. Amava Laura, mas desejava tanto essa menina! e enquanto pensava a olhava, e o desejo o invadia de novo e ele a tomava e montava nela com força.

- Quero estar grávida! Por que quero tanto estar grávida? Não entendo. Só sinto isso com você. Só quero um filho se for seu.

- Talvez você apenas goste de fazer amor comigo – ele disse com alguma indiferença.

- Você ainda a ama? – Perguntou passando os dedos nos lábios dele, suavemente.

- Mais do que tudo na vida.

- Mais do que o filho que teremos?

- Mais do que tudo. – Ele acendeu um cigarro e sentou-se na beira da cama.

- E por que quis fazer-me um filho? Por que você não o fez nela?

Ele levantou e saiu rumo ao banheiro. De lá disse com uma voz firme e alta:

- Já disse que não quero saber de filho.

- Mas...

- Esse filho, se é que está mesmo grávida, será seu e de seu... marido, sei lá. Não gosto dele, de seu marido, namorado, sei lá. Quero que tenha o filho e o faça pensar que é dele. Pouco importa.

- Mas então você também quer um filho, só não quer assumi-lo.

- Sim...

- Por quê?

Ele voltava do banheiro e aproximando-se dela começou a fitar o teto, deixando-se cair de costas sobre a cama.

- Não sei. Tenho já vinte e sete anos e... quero um filho. Só que não quero ligar-me a ninguém, nem quero ninguém ligado a mim. Não suportaria um vínculo de tal natureza, de tal magnitude. Além do mais, eu não saberia educá-lo. Acho que eu enlouqueceria e seria nocivo para ele...

- Entendo que não queira ter um vínculo assim, mas isso não explica porque você quer ter um filho comigo, mesmo que...

- É algo irracional. Instintivo. Não sei bem ao certo. Amo a Laura e não terei um filho com ela. Não quero ter. Mas, de alguma forma, eu amo você também. Ficaria feliz, muito feliz, de ver você e seu marido formando uma família, pais de uma criança que só eu e você saberemos que é nossa. A Laura não quer que nos vejamos mais. Olha Paula, olha pra mim. Nós não nos veremos mais, a não ser como amigos.

- É o que você quer? – ela chorava.

- De alguma forma, sim.

- Vamos acabar nos afastando, nos perderemos um do outro.

- Se você estiver grávida teremos sempre um vínculo.

- Já me sinto grávida. Amarei essa criança como a algo sagrado.

- Estou com sono agora.

- Durma. – Paula acariciava a barriga, contemplativamente.

Antes de dormir, ele imaginou um futuro qualquer, no qual teria um filho em algum lugar, sob os cuidados de Paula. Laura estaria ainda ao seu lado, segurando a sua mão enquanto caminhavam, vento na cara, por alguma praia. A imagem desse futuro o deixou feliz.

Paula, pensativa, acariciando a barriga com pequenas mãos trêmulas, viu que ele dormia, de bruços, com o rosto voltado para o outro lado.

- Terei um filho seu, meu amor. Olharei para ele e verei você. – Ela disse quase sussurrando.

Ele chorava baixinho, escondido, fingindo que já dormia.

Fabricio Ramos
Enviado por Fabricio Ramos em 19/07/2006
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