O Nariz                                                         

 
Nasceu bem dotado. De inteligência, graça, pobreza e tudo mais, além de um famigerado nariz. De pequenino seu apelido, de Narizinho, ganhou a rua a escola o bairro e as tias queridas que ao cumprimenta-lo apertavam-lhe o bendito apêndice. Ele sorria agradecido e arrependido dos pensamentos desajuizados.

Já rapaz, sem que alguém gravasse ou fizesse questão de gravar seu nome, a alcunha de Narizinho não mais condizia com seu tamanho. Logo chamou atenção da mulherada e até da rapaziada aquela protuberância que, quanto mais alto crescia em estatura, caçoada e censura, mais se destacava, sendo promovido a Nariz. Sempre associado à masculinidade aquele baita nariz, Nariz namorou, namorou, noivou, ninguém lhe desmentiu a fama, casou-se e era agora Seu Nariz.

Com o passar dos anos Seu Nariz se expandiu, ganhou dimensão robusta e avermelhada. De barba crescida candidatou-se a Papai Noel, pois com barba natural ganhava trezentos dinheiros a mais que os outros com barba falsa. As crianças, perversas crianças, adoravam puxar-lhe a barba e dar-lhe pancadinhas de um lado e de outro no seu nariz como se fazia com o brinquedo “João-Bobo”. Seu Nariz se submetia, pois precisava sustentar os Narizinhos de casa. Porém, quando chegava, depois do expediente, moído pela balbúrdia que reina nessas datas e atordoado pelas musiquinhas repetitivas de fazer gastar, explicava aos seus filhos que o bom Papai Noel não era uma figura mítica coisa nenhuma, mas sim o seu papai e o papai de muitas outras crianças que “ralavam” o ano todo, inclusive em época de festa.

Seu Nariz envelheceu poroso, com bexigas e sinais trazidos pelo sol, mas sempre prosa, mirava o chão, apostava com as bochechas e as orelhas para ver quem ganharia da força de gravidade. Só foi saber que tinha alergia ao pólen naquela cerimônia, com terno bem cortado, cheirando a novo, o espírito em cócegas para espirrar diante das flores. Na carne pálida caiam lágrimas daquela que sempre o amou e lhe chamava por Nazareno, qualquer que fosse o tamanho ou o gracejo com o seu nariz.

meriam lazaro
Enviado por meriam lazaro em 19/12/2010
Reeditado em 04/08/2012
Código do texto: T2680751
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