O arqueiro que desafiou o tempo para desposar a Transcendência

Dizem, aqui e ali, que um arqueiro robusto anda vagando pelos quatro cantos do mundo, procurando não se sabe o quê. Dizem também, que o arqueiro vencera o grande Mestre Tempo por ocasião de um embate com este arrogante opositor com quem disputava o amor de uma bela mulher ao cair da tarde.

A história é mais ou menos assim...

Em um mundo onde o Tempo era o senhor absoluto de todas as criaturas vivas do planeta, um arqueiro ousou se apaixonar pela esposa do Mestre, a Transcendência. O Tempo ao perceber o feito, ordenou um embate com o arqueiro na boca da noite. Sentia-se traído. Afinal, o arqueiro devia sua vida a ele, pois que viver era o espaço concedido pelo Tempo entre o nascer e o morrer, era a própria possibilidade de existência. Deveras chateado, sabia que o arqueiro merecia uma lição por sua audaciosa coragem. Estava decidido a puni-lo veementemente para que servisse de exemplo para os demais mortais. Isto era um castigo supremo. Ser escorraçado pelo Tempo, mestre e senhor, se constituía em temerosa punição. Naquela época, os homens acreditavam que o Tempo era seu maior aliado.

Não obstante, é importante que se diga que o reinado do Tempo fora um período bastante perverso e extremamente opressor na história da humanidade. Aos homens, não lhes era dado o direito de navegar a mar aberto, conhecer o fabuloso mistério da liberdade, transcender. O Tempo possuía uma legião de soldados chamados de “guardiões da rotina” cuja principal incumbência era distrair os mortais para que não conhecessem a verdade sobre a existência humana.

Todavia, este impetuoso arqueiro desafiou o Mestre e a batalha foi travada. Se o arqueiro vencesse o Tempo no ardiloso embate poderia viver lado a lado com a Transcendência.

A batalha se inicia. O arqueiro lança sua flecha em direção ao Tempo, que se esquiva rapidamente. O tempo tenta sugar a alma do arqueiro, mas menino maroto, se esconde atrás da Angústia, companheira fiel que assiste a tudo atentamente. E assim, prossegue a luta...De repente, o arqueiro percebe que chegou ao fim do mundo, havia saído da sombra maldita da rotina, havia ferido o Tempo. Encontra-se frente a frente com o Momento que nada mais é que o coração pulsante do Tempo. Que espetáculo maravilhoso! O jovem diante do coração do Mestre. Consegue, pela primeira vez, ver a si-mesmo. Sente medo, muito medo. O mundo exterior perde sua importância, torna-se um “isso” desnudado sobre o pano de fundo do nada. E então, após esta experiência face a face com o nada ele emerge forte e criativo e enceta o Momento, matando assim, o Tempo e desposando a Transcendência.

Foi assim que o arqueiro, homem mortal, tornou-se o guardião do nada.

Marta Klumb Rabelo
Enviado por Marta Klumb Rabelo em 20/07/2005
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