EM NOME DO SENHOR

Passei os melhores anos da minha vida acreditando em você, judeu. Seus sectários encheram-me a cabeça de pecados, e me diziam que eu só seria salvo se me entregasse a você. Agora, olha o que sobrou de mim. Cá estou, apodrecendo nessa prisão, pois acreditei que fazendo o que me pedia, eu teria paz.

Não tive.

Lembra quando um de seus prosélitos invadiu minha cama, naquele colégio de seminaristas, quando eu tinha 12 pra 13 anos? Aquele bosta me violentou, se apoderou de meu corpo frágil, partiu em cacos minha inocência. Por que o matei? Você mesmo disse que quem fizesse algum mal a uma dessas criancinhas, era melhor amarrar no pescoço a mó de um moinho e lançá-lo ao mar. Demorou dez anos para cumprir seu desejo, Mestre, mas cumpri. Eu não tinha uma pedra para amarrar no pescoço daquela infeliz criatura, mas não foi difícil conseguir uma faca de bom fio. Ah, como foi divertido passar-lhe a faca na jugular, e ver o chafariz de sangue espargir pra todos os lados, inclusive sobre minha cara; de felicidade, diga-se de passagem.

Foi tão doce matar minha primeira vítima, algo como um orgasmo depois de ter segurado o tezão até não aguentar mais. Os outros foram mais fáceis, e não tive nenhuma crise de consciência nos segundos precedentes ao ato. Não me olhe com essa cara, você não é o mesmo deus do Velho Testamento? Fiz o que me pedia. Deixa ver, Levítico capítulo 20, 13, “Se um homem dormir com outro homem, como se fosse mulher, ambos serão mortos”. Não importava se um deles era meu irmão e o outro meu melhor amigo de infância, perfurei os dois sodomitas à bala, cortei-os em pedaços e...o resto você sabe. Engraçado que não tive nenhum mal estar, nenhuma congestão.

Agora, o que me deu mais prazer, foi liquidar meu pai, aquele ateu filho da puta. Ele resistiu, não queria ir à igreja comigo, mas eu falei que se ele fosse e acreditasse em você, eu desistiria do sacerdócio. Aceitou. Foi tão bonito e incrivelmente emocionante vê-lo se ajoelhar ao meu lado! Mas infelizmente, ele disse que não ia se converter; foi seu grande erro. Antes que eu o atingisse com a pedra que eu trouxera na mochila, li em voz alta Lucas 19,26 pra ver se ele compreendia. “Aqueles que não me aceitarem como rei, trazei-os aqui e matai-os na minha presença”. Ele não esboçou nenhuma reação, quando me viu levantar a pedra com ambas as mãos; penso que seus olhos não acreditaram que eu pudesse fazer aquilo. Acertei-lhe o crânio com um golpe certeiro. O corpo ficou se debatendo como um epilético sobre o banco de madeira, e, para não ter dúvidas, dei-lhe mais umas dez golpeadas na cara. O sangue melou o banco e o piso da Matriz; seu rosto ficou uma massa pastosa de carne, sangue e ossos quebrados. Eu ainda olhava para meu pai agonizando, quando os policiais apareceram.

Agora, estou aqui, Senhor, nesse cubículo fétido, infestado de pulgas e baratas. Se você é Deus, sai dessa cruz, e repara todos os males que causou em mim.