O Sonho de Gafanhota

Quinta-feira, 28 de Julho de 2016

Dear Diário,

Passei praticamente o dia inteiro pensando no sonho que tive da última vez que dormi. Para ser sincera, acho que nunca desejei tanto que um sonho fosse verdade como esse. Eu nem sei se deveria escrever sobre isso, mas a emoção é tanta que não consigo ficar com o assunto só para mim. Não desejo me aprofundar muito, apenas tenho a intenção de desabafar e fazer com que você concorde comigo em relação ao quão lindo foi o meu sonho.

A maioria das pessoas fala que dormir é uma das melhores coisas da vida, acho que devido ao relaxamento simultâneo corpo-mente. Mas, a partir de agora, eu acrescento uma espécie de ingrediente a mais quanto a isso: a sensação de ter pelo menos uma vez na vida daquilo que você gostaria, mesmo sabendo que na vida real é pouco provável de acontecer. Isso aconteceu comigo nesta última noite de sono. Ou melhor, senti isso nesta última noite de sono. Devo estar até exagerando e acho que você também está pensando nisso, mas, exagerado ou não, pode ter certeza, meu amigo, que o meu sonho foi muito especial.

Eu tinha ganhado uma competição cujo organizador era o cara que eu gostava. Não me lembro no que se baseava tal coisa –até porque aconteciam muitas coisas loucas–, mas o que importava era que eu havia ganhado e queria a devida recompensa. Já que eu tinha o Whatsapp dele, decidi chamá-lo para cobrar o que ele havia prometido ao vencedor, que no caso era eu. O problema foi que eu estava com uma foto incrivelmente horrorosa no meu perfil, e se eu não me engano nem sequer era minha. Nem tinha me dado conta disso, até que ele começou a escrever mensagens de aversão e estranhamento e, então, logo deduzi que ele iria me bloquear. Com isso, desesperadamente mudei para uma foto minha normal e rapidamente expliquei-lhe a situação. Ele achou engraçado, me reconheceu e disse que eu fosse até a uma certa casa para encontrá-lo.

Foi o que fiz. Cheguei na casa e encontrei várias pessoas, algumas conhecidas e outras desconhecidas. Perguntei a uma delas –provavelmente a alguém conhecido– aonde estaria a pessoa pela qual eu estava procurando, e fui informada que estaria em um outro cômodo da casa para o qual apontou. Uma vez lá, não encontrei ninguém. Permaneci parada no meio da sala olhando as coisas e, a uma certa altura, olhei para o lado e vi aquele rapaz pelo qual eu tanto esperava. O cara estava me olhando e, então, decidi ir até mais perto dele. Dei uma "barruadazinha" de propósito no ombro dele, sorrimos e logo tirei sarro da cara dele pelo que tinha acontecido no Whatsapp momentos antes. Foi aí que a história de competição e recompensa acabou por não existir mais. Após as gargalhadas do início, decidi me apresentar oficialmente, já que nos conhecíamos apenas de vista até então. Estendi a minha mão para apertar a dele, e ele retribuiu. Em seguida, me deu um abraço. Foi um gesto bem rápido, mas me surpreendeu bastante e teve total significância para mim.

Depois desse momento cordial, de repente decidi que queria ir embora. Dentro de mim havia vários motivos para fazê-lo, mas achava que o principal deles era o constrangimento. Quando falei que iria embora, ele segurou minha mão, me deu uma espécie de abraço por trás e pediu que eu não fosse. Ao sentir mais uma vez o corpo dele perto do meu, uma felicidade tomou conta do meu ser e, para disfarçar os meus reais motivos para deixar o local, perguntei-lhe:

– Mas, você não tem que ir embora?

Não me lembro ao certo quais foram as palavras exatas dele para essa pergunta.Só sei que ele balançou a cabeça negativamente, disse a palavra "não" e sorriu. Como uma forma de garantir para mim que ele não precisaria ir –e nem eu–, enlaçou o braço na minha cintura e me guiou até o chão para que eu me deitasse ao lado dele.

Nós ficamos deitados no chão lado a lado, e ele sempre estava com o braço envolvendo os meus ombros e, de vez em quando, me dava um beijo na testa. Mas, antes de nos deitarmos, ele pegou uma espécie de cobertor e colocou-o sobre nós. Quando já nos sentíamos aconchegados, começamos a conversar do jeito que, francamente, sempre pensei que seria assim que conversássemos pela primeira vez. Falamos sobre a primeira impressão que tivemos um do outro no tempo da escola, da repercussão que a diretora fez nas salas quando ele passou no vestibular –isso quem contou fui eu– e outros assuntos dos quais não me recordo. Permanecemos assim: conversando, gargalhando e abraçados, tudo isso em meio ao chão de uma sala e enrolados com um cobertor que, se eu não me engano, era azul. O momento foi mágico, uma vez que tudo acontecia como se já nos conhecêssemos há muito tempo. Ou, pelo menos, como se já deveríamos ter feito aquilo há muito tempo.

Talvez o sonho não seja grande coisa para você, meu Diário. Sabe, talvez até nem seja mesmo, e eu estou bancando a retardada aqui à medida que escrevo o fato como se fosse o "sonho do ano". Porém, deixe-me explicar uma coisinha: só quem pode afirmar isso, com efeito, é aquela pessoa que sonhou. Parece até meio óbvio, mas é verdade. Sou eu quem guardo no meu coração um sentimento cuja origem é inexplicável. Sou eu quem sinto a essência do meu sonho envolver o meu dia, embora desconheça a razão pela qual ele persiste em fazer parte da minha história. E, finalmente, sou eu quem ainda alimenta esperanças de algum dia o meu sonho se tornar realidade, por mais improvável que isso possa parecer. Mas, enquanto isso, a única coisa que faço é escrever no meu Diário a respeito do que estou sentindo porque, definitivamente, essa é a única coisa que posso fazer agora.

Sinceramente,

Gafanhota Decantus Cabrito,

Sua Gaff.

Após fechar o Diário, eis que um longo suspiro ecoou pelos quatro cantos do quartinho cor de rosa. Um pequeno ponto de localização e de emoção se fazia presente em meio a imensa cidade de Ponto da Pedra.

Gafanhota Decantus Cabrito
Enviado por Gafanhota Decantus Cabrito em 20/08/2017
Código do texto: T6090052
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